上訴案第480/2022號 – 無效爭辯
異議人:A
澳門特別行政區中級法院合議庭判決書
本合議庭於2023年1月19日對本案的上訴作出了裁判,裁定上訴人A的上訴理由不能成立。
嫌犯A對上述裁判提出了無效的爭辯,其異議的葡文版本的理由載於卷宗第803-807頁。1
檢察院對上訴人的異議提出答覆,認為應裁定爭辯人(上訴人)A所提出的無效理據並不成立,並宣告維持中級法院合議庭所作出的裁判。
本院接受了異議人的請求之後,合議庭助審法官重新作出卷宗的審閱,然後召開了評議會,並作出了評議及表決。
在無效的爭執請求書中,爭辯人(上訴人A)認為中級法院合議庭裁判沒有就YY控股同意的重要性發表意見,而即使中級法院認為YY控股的負責人(證人G)作出的明示或推定同意並不排除上訴人A行為的不法性,亦應認為上述同意使上訴人A產生了《刑法典》第15條規定之對事實情節之錯誤,從而指責中級法院合議庭裁判在審理第7點及第8點事實時存在審查事實證據方面的明顯錯誤,違反了《刑事訴訟法典》第4條準用之《民事訴訟法典》第633條及第571條第1款d項之規定,屬無效判決。
理由不能成立。
正如我們一直認為的,上訴法庭除了須依職權審理的事項外,只須解決上訴人在上訴狀總結部份所具體提出和框架問題,無須一一分析上訴人在提出這些問題時所主張的每一項理由2。
事實上,就爭辯人所質疑的問題,尤其是對上訴人所提出的不存在故意的問題以及是否適用《刑法典》第15條的問題,合議庭已無可指責地作出了審查和理由說明(參見判詞第17-19頁),繼而認定其行為已經完全存在《刑法典》第347條結合第336條第1款a項所規定及處罰之「濫用職權罪」的主客觀構成要件。
顯然地,爭辯人只是純粹地不同意合議庭對事實認定的決定而已,中級法院合議庭並沒有遺漏審查,尤其沒有遺漏審理爭辯人(上訴人)A所提出的審查事實證據方面的明顯錯誤。
因此,中級法院合議庭裁判並無違反《刑事訴訟法典》第4條準用之《民事訴訟法典》第633條及第571條第1款d項之規定,爭辯人以上述理由來指責中級法院合議庭裁判因遺漏審判而無效是毫無道理的。
綜上所述,中級法院合議庭裁定爭辯人(上訴人A)所提出的無效理據均不成立,維持被爭執的裁判。
本異議程序的訴訟費用由爭執人支付,並支付4個計算單位的司法費。
澳門特別行政區,2023年4月20日
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蔡武彬 (裁判書製作人)
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陳廣勝 (第一助審法官)
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譚曉華 (第二助審法官)
1 其葡文內容如下:
Ressalvado o devido respeito pela posição expressa pelo Tribunal no Acórdão sub judice, entende o Recorrente que, no mesmo, não foi tratada em toda a sua extensão a questão suscitada na motivação do recurso na parte relativa ao erro notório na apreciação da prova dos factos 7.° e 8.° da sentença (cont.) por existência de erro enquanto elemento que exclui a culpa, em termos que, no entender do Recorrente, serão susceptíveis de ferir o Acórdão com o vício de nulidade por omissão de pronúncia.
Com efeito, resulta provado dos autos que, no período de 3 de Dezembro de 2019 a 2 de Julho de 2020, o arguido se socorreu dos serviços do motorista (a testemunha B) destacado pela Companhia de Gestão de Serviço de Serviço XX, Limitada que, por sua vez, utilizava carros da sociedade YY Gestão de Participações Sociais, motorista e veículos (privados), “ao serviço do pessoal da concessionária, bem como pessoal da entidade consultora e fiscalizadora”.
Ou seja, o motorista contactado pelo arguido - a testemunha B - não foi nomeado pelo Governo da RAEM - e o mesmo se diga dos carros utilizados pelo referido motorista -, pertencendo ou sendo contratados e geridos antes por empresas privadas - a sociedade YY GESTÃO DE PARTICIPAÇOES SOCIAIS, LDA e a sociedade XX SEGURANÇA E GESTAO, LDA.
Ora, aquando da arguição de erro notório na apreciação da prova dos factos 7.° e 8.° da sentença por existência de erro enquanto elemento que exclui a culpa, o ora Recorrente alegou o seguinte:
(…)
“Designadamente, resulta da prova produzida nos autos que o arguido nunca pensou que a sua conduta pudesse ser considerada ilícita, que criou uma relação de confiança com o motorista, que assumiu que existia aprovação da sua conduta por parte da YY, que nunca recebeu qualquer advertência quanto à possível ilegalidade da sua conduta, sendo que a maior parte dos pedidos de ajuda que estão em causa nos autos ocorreram em pleno período de pandemia, com vista a tentar proteger o filho do arguido, à data, com 4 anos de idade, com sérios problemas ao nível da linguagem e do desenvolvimento cognitivo.
Retira-se da fundamentação da sentença recorrida, nomeadamente do resumo do depoimento prestado para memória futura da testemunha B que existiu uma situação de anuência/concordância/consentimento por parte da YY quanto aos pedidos efectuados pelo arguido para utilização do motorista para outros fins.”
Ora, o Tribunal de Segunda Instância, ao proferir o Acórdão sub judice, não se pronunciou sobre a relevância do consentimento da YY, o que, no modesto entender do arguido e Recorrente, terá manifesta importância na análise do elemento subjetivo ora em análise.
Com efeito, da prova produzida nos autos, resulta que existiu pelo menos um consentimento tácito por parte das pessoas da YY no que diz respeito aos pedidos do arguido para utilizar os serviços de motorista e respectivo(s) carro(s) utilizados pelo mesmo.
Isso mesmo se retira das declarações para memória futura prestadas nos autos, bem da prova produzida em julgamento.
Das declarações para memória futura prestadas pelo próprio motorista B prestadas nos autos (cfr. fls. 483 e seguintes), lidas em sede de audiência de julgamento, resulta, nomeadamente, que:
A referida testemunha confirmou o depoimento prestado perante o CCAC nas fls. 192 a 194 (numeração nova: 437 a 439:
“向證人宣讀載於卷宗第192頁至第194頁證人於廉政公署所作的詢問筆錄,證人確認內容全部屬實,現本法庭視為內容全部轉錄在此,(…), tendo expressamente consignado que mencionou a situação a G e que o mesmo não se opôs:
“證人稱曾向G提及,而G亦沒有反對。”
Com efeito, ainda que o Tribunal a quo tivesse considerado que o consentimento expresso ou presumido da YY, na pessoa do seu responsável (a testemunha G) não exclua a ilicitude da conduta do arguido, deveria ter valorado que o consentimento da YY o fez incorrer em erro, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 15º (Erro sobre as circunstâncias do facto) do Código Penal.
Preceitua o referido normativo legal o seguinte:
“1. O erro sobre elementos de facto ou de direito de um tipo de crime, ou sobre proibições cujo conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente possa tomar i consciência da ilicitude do facto, exclui o dolo.
2. O disposto no número anterior abrange o erro sobre um estado de coisas que, a existir, excluiria a ilicitude do facto ou a culpa do agente.
3. Fica ressalvada a punibilidade da negligência, nos termos gerais.”
Citando o Comentário Coninbricence (professor Figueiredo Dias), página 780, em que sobre a questão em análise se pode ler o seguinte:
“[…]
O dolo supõe a consciência e vontade por parte do agente de exercer uma função pública abusando dos poderes, ou violando os deveres a ela inerentes, bem como o conhecimento do caracter ilegítimo da vantagem ou do prejuízo pretendidos.
Se o funcionário tem conhecimento das circunstâncias em que actua, mas pensa erradamente que não existe qualquer instrumentalização dos poderes da sua parte, temos um erro sobre elementos de direito do tipo legal, determinantes da (...) exclusão do dolo.”
(…)
Se o agente pensa que a vantagem que pretende obter ou o dano que visa causar são legítimos temos um erro de conhecimento. erro intelectual. que em princípio exclui o dolo”
Pelo que, no caso, verificam-se os pressupostos para exclusão do dolo, com fundamento em erro, nos termos previstos pelo artigo 15.0 do Código Penal.
No caso o erro traduz-se na (ainda que errada) convicção formada pelo arguido no sentido de que os pedidos de ajuda que solicitou ao motorista privado - à vista de todos e com a com a concordância da YY - pessoa com quem, ao longo dos anos, o arguido estabeleceu, pelo menos, uma relação de empatia e confiança, em relação à qual não tinha qualquer relação ou vínculo de superioridade ou hierarquia, pudessem alguma vez ser vistos ou encarados como benefícios ilegítimos e, muito menos, que termos que pudessem consubstanciar a prática de um crime.
Entendendo assim o Recorrente que, no caso em apreço, ao não se pronunciar sobre a relevância do consentimento da YY sob o ponto de vista da convicção (ainda que errada) do arguido e ora Recorrente no sentido de que não estava a fazer nada de errado, o Acórdão proferido se encontra ferido de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos previstos pelas disposições conjugadas dos arts. 633.° e 571.°, nº 1, al. d) e n.º 3 do Código de Processo Civil, aplicáveis por força do art. 4.° do Código de Processo Penal.
Pelas razões expostas, requer-se a V. Ex.ªs que seja declarada a nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia - em particular, sobre a repercussão do consentimento da YY sob o ponto de vista subjectivo/psicológico do arguido/Recorrente - e, em consequência, que seja declarado que, no caso, se verificam os pressupostos para exclusão do dolo, com fundamento em erro, nos termos previstos pelo artigo 15.º do Código Penal.
2 參見中級法院於2014年6月19日在第191/2014號上訴案件的裁判。
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TSI-480/2022 P.1