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卷宗編號: 220/2024
日期: 2024年05月30日
關鍵詞: 賠償責任、衡平原則、賠償金額

摘要:
- 澳門特別行政區僅和土地承批人/被告建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人/被告而作出。即使假設該等行為損害了土地承批人/被告的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向預約買受人作出賠償,也只能是土地承批人/被告在履行其賠償義務後再向澳門特別行政區追討賠償,而非預約買受人可直接向澳門特別行政區追討因土地承批人/被告違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
- 只有在澳門特別行政區濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任。
- 《民法典》第436條第5款明確容許經適當配合後適用第801條之規定,即容許法院當認為賠償金額過高時按衡平原則減少違約賠償金額。
- 申言之,只有在賠償金額過高時才可適用衡平原則減少違約賠償金額。
裁判書製作人

何偉寧






民事及勞動上訴裁判書

卷宗編號: 220/2024
日期: 2024年05月30日
上訴人: (A)公司(第一被告)
被上訴人: (B)及(C)(原告們)
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一. 概述
第一被告(A)公司,詳細身份資料載於卷宗內,不服初級法院民事法庭於2023年10月31日作出的判決,向本院提出中間上訴,有關結論內容如下:
1. Constitui objecto do presente Recurso a, aliás, douta sentença do Tribunal Judicial de Base, que julgou parcialmente procedente a presente acção e condenou a Recorrente no pagamento de uma indemnização à Recorrida, no montante global de HKD$2.292.000,00, acrescida de juros de mora à taxa legal de 9,75% ao ano, a contar desde a data da citação da Recorrente e até integral pagamento.
2. Ressalvado diverso entendimento, contrariamente à douta decisão quanto à matéria de facto, a matéria constante dos quesitos 40º, 41º, 2ª parte, 42º, 2ª parte e 43º deve ser dada por Provada.
3. Com efeito, conjugando-se a prova documental com a prova testemunhal (transcrita na parte das alegações da presente peça e que aqui se dá por integralmente reproduzida) e através de uma apreciação lógica e racional da prova no seu cômputo global a matéria supra referida deveria ter sido dada por provada.
4. Não se logrou provar em julgamento que a vontade real das partes contratantes foi a da antecipação do cumprimento da obrigação a carga do comprador, o que obviou à ilisão tout-court da presunção legal de que beneficia o “promitente-comprador”, derivada do artigo 435º do Código. Civil (CC), mas, salva melhor opinião, se a ilisão não ocorreu par esta via, ocorre pela via da operação jurídica de qualificação do contrato.
5. A qualificação do contrato passa pela interpretação das suas cláusulas, tendo em conta as regras contidas nos artigos 228º (sentida normal da declaração), 229º (casos duvidosos) e 230º (negócios formais) do CC.
6. A respeita da letra dos contratos, refira-se que as partes podem usar terminologia jurídica e fazer qualificações, mas esse aspecto não é vinculativa para a intérprete-aplicador.
7. In casu, embora as partes intitulem o contrato como “contrato-promessa”, trata-se de uma tradução imprecisa de “Mai Lou Fa” (買樓花), em língua chinesa, cujo significado seria mais correctamente traduzido para “contrato de compra e venda em projecto”.
8. Expressões como “o preço” ou a “venda” abundam na letra do contrata (vg. Cláusulas 2, 3, 4, 6, 8, 9, 10 e 26), apontando para uma compra e venda imediata de um bem futuro, carente apenas da sua redução a escritura pública.
9. A expressão e conceito de “sinal” não aparece uma única vez no clausulado.
10. Oralmente, em cantonense, “sinal” e “depósito” pronunciam-se ambos “Teng Kam”, todavia, tratando-se de diferentes conceitos, a escrita é naturalmente diferente: “sinal” escreve-se com os caracteres “定金” e “depósito” escreve-se com os caracteres “訂金”.
11. Na versão original, em chinês, da cláusula 5ª de ambos os contratos, os caracteres são “訂金”, significando “depósito”.
12. As partes, ao optarem e acordarem numa redacção que excluiu propositadamente a utilização da expressão “訂” referente ao conceito de “sinal” (com o sentido de penalização), em prol da expressão “訂金”, correspondente ao conceito de “depósito” (que não tem sentido penalizador), estão a manifestar a sua vontade em afastar a qualificação de sinal aos pagamentos efectuados por conta do contrato em causa.
13. Como refere Menezes Cordeiro no Parecer Jurídico ora junto, essas prestações devem ser qualificadas como “reserva” e não como “sinal” (vd. págs. 67 e 68 do Parecer).
14. Por seu turno, a cláusula 22ª do mesmo contrato afasta, tacitamente, a possibilidade de a Recorrente poder fazer obras nas próprias fracções.
15. O que, salvo melhor opinião, significa que os poderes da Recorrente se circunscrevem à estrutura e à concepção estética do edifício e que, quanto às fracções autónomas transaccionadas, os adquirentes são livres de as decorar e apetrechar conforme lhes aprouver, desde que não interfiram com a estrutura e estética do edifício.
16. A cláusula 22ª não indicia que as partes celebraram uma promessa de compra e venda em vez de uma compra e venda de um bem futuro.
17. A previsão da cláusula 9ª dos contratos em apreço, tem por fim, por um lado, possibilitar à Recorrente conhecer o novo titular da obrigação de pagamento das prestações acordadas com o cedente até à entrega e ocupação da fracção transmitida e, por outro lado, fiscalizar a legalidade da transmissão, nomeadamente, evitando a transferência da mesma fracção a diferentes terceiros.
18. Do mesmo modo, qualquer cessão, para produzir efeitos, implica a autorização do Cedido, nos termos do artigo 418º do CC, derivando desta obrigatoriedade a circunstância de a mesma estar prevista na cláusula 9ª.
19. In casu, futuramente, com a entrega da fracção após construída, a Recorrente fica totalmente desligada das razões que estavam na base de tal cláusula, pelo que desaparece a sua aplicabilidade.
20. A necessidade de se celebrar no futuro uma escritura pública de compra e venda é, nos termos do artigo 866º do CC, uma formalidade absolutamente essencial.
21. Assim, sendo ou não contratos-promessa, os contratos em causa teriam sempre que ser formalizados através da celebração de um segundo contrato, nomeadamente da referida escritura.
22. Pelo que, ressalvado diverso entendimento, também não é por via da cláusula 9ª dos contratos em apreço que se pode qualificá-los como contratos-promessa.
23. Já as suas cláusulas 10ª a 12ª são previsões que raramente ou nunca são reguladas no contrato-promessa, mas sim no contrato de compra e venda.
24. as obrigações da Recorrente previstas nos contratos em causa incluem a obrigação de construir e de entregar a fracção autónoma objecto desse contrato, sendo que a obrigação de entregar a coisa é um efeito essencial da compra e venda e não do contrato-promessa (al. b) do artigo 869º do CC).
25. Os textos preliminares e circundantes conectados com os contratos em questão, designadamente, os documentos de fls. 68 e 71 e os recibos de pagamento, onde se escreveu sempre a palavra “preço” (價金), também apontam, no caso vertente, para uma perspectivação dos contraentes outra que não a do contrato-promessa.
26. Relativamente ao elemento histórico subjacente aos contratos em causa, há a destacar que o contrato foi celebrado antes da publicação da Lei nº 7/2013, que foi elaborada em resposta a um vazio legal que disciplinasse estes casos, o que permite vincar a sua especificidade em relação às figuras existentes a esse tempo na ordem jurídica de Macau, incluindo a figura do contrato-promessa tipificada no Código civil.
27. Como afirma João Vicente Monteiro na sua mais recente obra, Código do Registo Predial de Macau Anotado, pág. 299, “Estes 'contratos-promessa' têm sido tradicionalmente utilizados para formalizar verdadeiros contratos de compra e venda sobre as fracções autónomas em construção”.
28. Daí que os dois contratos ora em discussão possuem em anexo a planta de cada fracção respectivamente adquirida, escolhidas, em projecto, pelos Recorridos.
29. O que se revela mais plausível e consentâneo com a aplicação das regras plasmadas entre os artigos 228º e 230º do CC é que se trata de um contrato de reserva ou de um contrato de compra e venda de um bem futuro.
30. Subsidiariamente, mesmo que se entenda que os contratos em discussão nos presentes autos se tratam de contratos-promessa típicos, a verdade é que, por todo o exposto em sede de alegação do presente Recurso quanto à interpretação das declarações negociais, as quantias que a Recorrente recebeu configuram um cumprimento antecipado tendo em vista a satisfação de obrigação futura.
31. Ocorreu uma impossibilidade jurídica superveniente e definitiva do cumprimento do contrato em discussão nos presentes autos mas tal impossibilidade não é imputável à Recorrente.
32. Com efeito pode-se afirmar com acentuada segurança que ficou provado que o projecto de arquitectura foi submetido em 22 de Outubro de 2009 mas que a sua aprovação só ocorreu em finais de Dezembro de 2010 e só foi comunicada pela Administração à Recorrente em 7 de Janeiro de 2011.
33. E que a razão para tal demora foram exigências da DSSOPT que não haviam sido contratadas nem estavam previstas na lei, nomeadamente a exigência da observância de uma distância mínima entre as torres equivalente a 1/6 da altura da torre mais alta do empreendimento.
34. E ficou provado ainda que a DSSOPT, no fim, com a aprovação do projecto de arquitectura, desistiu, afinal, de tal exigência.
35. Assim, foram desnecessariamente perdidos 15 meses do período de aproveitamento do terreno concessionado à Recorrente.
36. Ficou provado que, apesar deste tempo perdido, em condições normais, a Recorrente tinha capacidade para concluir o empreendimento dentro do prazo contratado, mas que, com a aprovação do projecto de arquitectura, a DSSOPT condicionou a emissão de qualquer licença à apresentação e aprovação de um estudo de impacto ambiental, algo que nunca havia sido anteriormente referido em nenhum momento pela Administração e que seria inédito, naquela altura, em Macau.
37. Ficou provado que o relatório ambiental constava de 4 pontos simples, aos quais a Recorrente deu satisfação quando apresentou o solicitado relatório ambiental em 11 de Maio de 2011.
38. O contrato de compra e venda de fracção a construir junto aos presentes autos havia sido celebrado entre a Recorrente e a 2ª Ré cerca de um mês antes desta apresentação, pelo que, como ficou provado, a Recorrente ainda dispunha de tempo mais do que suficiente para concluir o empreendimento “(X)”.
39. E quando foi celebrado este contrato, já o projecto de arquitectura havia sido aprovado há cerca de 4 meses (Resposta ao Q27), o que permitia a sua celebração, sendo essa a prática sem excepção em Macau.
40. Após tal aprovação, qualquer promotor imobiliário em Macau colocaria as fracções autónomas em projecto (aprovado), a construír, no mercado - como aliás sucede na realidade quotidiana de Macau com todos os promotores imobiliários.
41. Isto porque, naturalmente, se não for emitida em simultâneo a licença para se dar início à construção, é de prever que seja a mesma emitida quase em seguida, caso contrário, não se teria aprovado o projecto de arquitectura.
42. Daí que quando, em simultâneo com a aprovação do projecto de arquitectura, a DSSOPT fez depender a emissão de qualquer licença, da apresentação de um relatório ambiental, a Recorrente previu, tal como qualquer bom pai de família no seu lugar o faria, que tal exigência seria rapidamente ultrapassada.
43. Resultou, claramente, da prova testemunhal, ilustrativamente transcrita na parte das alegações da presente peça, que apesar de no momento em que foram celebrados os contratos aqui em discussão já haver sido comunicado à recorrente, pela DSSOPT, ser necessária a apresentação e aprovação de um relatório ambiental, tal comunicação identificou 4 pontos muito simples e rápidos de satisfazer, sendo possível cumprir esse requisito em 3 a 4 meses.
44. E que, no entanto, os Serviços da Administração foram apresentando sucessivas e novas condições ao longo de quase 3 anos, à medida que as anteriores iam sendo cumpridas pela Recorrente, o que era manifestamente imprevisível, mesmo para um bom pai de família.
45. O historial destas sistemáticas e novas exigências ambientais por parte da Administração resultaram provadas através dos factos acima reproduzidos no Capítulo II, sob os números 34 a 43, 56, 66 e 68 a 82.
46. Pelo que, sem qualquer dúvida, para qualquer promotor imobiliário médio em Macau, tal conduta era absolutamente imprevisível.
47. Quanto ao facto de que os Recorridos transaccionaram com a 2ª Ré, cerca de um ano mais tarde, a fracção autónoma em discussão, tendo a Recorrente autorizado tal transacção, a verdade é que resulta dos factos provados a Recorrente não teve qualquer intervenção nessa transacção senão para a autorizar por a lei assim o exigir, sendo alheia aos concretos moldes desse contrato, suas motivações e sua distribuição de risco.
48. Não houve, pois, qualquer violação do dever objectivo de cuidado por parte da Recorrente.
49. Ainda no âmbito das condutas da Administração que deram origem a uma resposta afirmativa ao quesito 49, refira-se que, mesmo após todas as aprovações, incluindo a do relatório ambiental, teve a Recorrente que esperar até Agosto de 2014 para poder dar início ao aproveitamento do tereno, nomeadamente, À construção das fundações para todo o empreendimento.
50. Na verdade, após comunicação da DSSOPT em 15/10/2014 informando-a de que podia requerer a licença, a Recorrente, em 24/10/2013, assim. o fez (Alínea KK dos Factos Assentes).
51. Por força do artigo 42º/3 do RGCU, a DSSOPT deveria emiti-la obrigatoriamente no prazo de 15 dias. No entanto, só em 02/01/2014 é que emitiu tal licença e com validade apenas até 28/2/2014, i. é, inferior a dois meses (Alínea LL dos Fatos Assentes).
52. Incrivelmente, continuou a Recorrente impossibilitada de iniciar as obras de construção do empreendimento, porque o prazo de aproveitamento tinha terminado naquela data, 28/02/2028, e apesar de a Recorrente ter apresentado logo, em 15/01/2014, pedido de prorrogação do prazo de aproveitamento, só cerca de seis meses e meio depois foi o mesmo autorizado, em 29/7/2014, através do ofício nº 572/954.06/DSODEP/2014.
53. Do mesmo modo, da factualidade dada por provada, resulta, outrossim, uma imputabilidade de violação de deveres acessórios contratuais à RAEM, assim, também por esta via, resultando a inimputabilidade da impossibilidade de cumprimento à Recorrente.
54. Os deveres acessórios, são os deveres laterais de conduta em que o credor fica constituído e que, por conseguinte, o responsabilizam perante o devedor - em particular quando a realização da prestação a cargo do devedor também seja do interesse deste, como é, manifestamente, o caso do tipo de contrato que temos aqui em presença, celebrado entre a RAEM e a ora Contestante.
55. Os factos praticados pela RAEM devem ser ponderados à luz da boa fé e especialmente do seu subprincípio da tutela da confiança legítima.
56. Esses factos, sintetizando, podem ser agrupados, como vimos, da seguinte forma:
a. diversas demoras injustificáveis na apreciação de requerimentos;
b. idem, na notificação de decisões;
c. introdução unilateral de novas exigências não previstas na lei e não comunicadas ab initio;
d. concessão de prazos e de autorizações manifestamente inexequíveis, sem uma prorrogação do prazo geral da concessão.
57. Uma ponderação, mesmo ligeira, de tais factos praticados pela RAEM, mostra que esta violou seriamente os deveres acessórios a que estava adstrita enquanto co-contratante da ora Ré.
58. Assim dando origem a que não tenha sido possível à Recorrente efectuar a sua prestação para com os Autores.
59. Já quanto à indemnização a arbitrar a cargo da Recorrente e a favor dos Recorridos deve, existindo, ser calculada, crêmos nós, com base nas regras do instituto do enriquecimento sem causa.
60. Com efeito, nos termos do artigo 784º/1 do Código Civil (CC), não sendo a impossibilidade imputável ao devedor, o credor fica desobrigado da contraprestação e pode exigir a restituição do valor que entregou em singelo, nos termos prescritos para o enriquecimento sem causa.
61. Mesmo a haver contrato-promessa, o regime aplicável seria o do contrato-definitivo, nos termos do artigo 404º/1, 1ª parte, do CC, pelo que teria plena aplicação o artigo 870º/1 do mesmo Código (venda de bens futuros), seguindo-se as regras da impossibilidade superveniente não-imputável ao vendedor e, como tal, liberatória.
62. Assim, teríamos que recorrer ao artigo 436º/2 e a Recorrente não teria que restituir o valor recebido em dobro.
63. Aplicando-se ao caso subjudice as regras do enriquecimento sem causa, o valor total da indemnização cifra-se em HKD$1.146.000,00, acrescido dos respectivos juros de mora.
64. Se por hipótese se considerar que os contratos em apreço se tratam de típicos contratos-promessa, seria manifestamente excessiva a condenação da Recorrente no pagamento do dobro das quantias que recebeu, devendo antes arbitrar-se uma compensação com base em critérios de Equidade, nos termos dos artigos 436º/5 e 801º do CC.
65. A douta sentença recorrida não tomou em consideração todas as circunstâncias susceptíveis de influir em tal decisão, nomeadamente, os benefícios que os Recorridos obtiveram tendo por fonte o incumprimento contratual gerador da indemnização a cargo da Recorrente.
66. Com efeito, tendo sido dado por provado que os Recorridos vão receber uma fracção autónoma de tipologia, área e preço equivalentes ao da fracção que constitue o objecto do contrato aqui em causa, cujo valor de mercado será bastante superior ao valor inicialmente pago por eles e que existe um nexo de causalidade entre esta situação e o dano efectivo que os Recorridos terão sofrido em função do incumprimento contratual imputado à Recorrente, não pode deixar de se tomar em conta este factor no juízo a proferir quanto ao deferimento ou não do pedido subsidiário formulado pela Recorrente.
67. A possibilidade de os Recorridos usufruirem tal, benefício foi concedida pela RAEM por via legislativa, com a publicação de legislação específica visando este segundo remédio para o incumprimento contratual imputado à Recorrente, nomeadamente, através da Lei nº 8/2019 conjugada com o Despacho do Chefe do Executivo nº 89/2019.
68. E, ainda, o mesmo terceiro, a RAEM, procedeu por via legislativa à devolução da totalidade do imposto de selo anteriormente pago pelos Recorridos por conta dos dois contratos em discussão.
69. Pelo que, em consequência, é facto incontornável que o dano efectivo dos Recorridos já foi por esta via significativamente mitigado.
70. Tal como não tomou em conta que ficou provado que a conduta da Administração esteve directamente na origem da impossibilidade do aproveitamento do terreno dentro dos prazos contratados.
71. Acresce ser facto notório que a Recorrente celebrou milhares de contratos idênticos aos dos presentes autos, os quais não foi possível cumprir pelas mesmas razões e circunstâncias, pelo que existe uma impossibilidade de cumprimento global que deve seguramente receber, por questões de equidade, tratamento diferenciado.
72. Ponderando-se em todos estes factos, na óptica da Recorrente a douta sentença deveria, com todo o respeito, pelo menos arbitrar uma indemnização com base em juízos de equidade ao abrigo do artigo 801º do CC, aplicável ex vi do artigo 436º/5 do mesmo Código.
73. Uma decisão prudente e equilibrada seria, na óptica da Recorrente, uma que fixasse o quantum indemnizatório num montante intermédio entre o valor que a Recorrente recebeu (HKD$1.146.000,00) e o valor correspondente ao dobro desse montante (HKD$2.292.000,00), isto é, em HKD$1.719.000,00, equivalentes a MOP$1.770.570,00 (Um milhão, setecentos e setenta mil, quinhentas e setenta patacas) .
74. Ressalvado diverso entendimento, a douta decisão recorrida incorre na violação do artigo 556 º do Código de Processo Civil e dos artigos 228º, 229º, 230º, 435º, 436º, 467º, 473º/1, 784º/1 e 801º do Código Civil.
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原告們(B)及(C)就上述上訴作出答覆,有關內容載於卷宗第1829頁至1842頁,在此視為完全轉錄。
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二. 事實
原審法院認定的事實如下:
1. A Ré é uma sociedade limitada, registada em Macau, cujo objecto é a exploração do comércio de importação e exportação, da actividade de agente comercial e de transportes, da indústria de vestuário, fiação, tecelagem e malhas, tinturaria e impressão, do fabrico de bordados e, ainda, da actividade de fomento predial e construção e reparação de edifícios. (vide fls. 41 a 45 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido integralmente).
2. Por Despacho n.º 160/SATOP/90, publicado no 2º Suplemento ao Boletim Oficial n.º 52, de 26 de Dezembro de 1990, rectificado pelo Despacho n.º 107/SATOP/91, publicado no Boletim Oficial n.º 26, de 01 de Julho de 1991, foi concedido à 1ª ré um terreno, resgatado ao mar, com a área de 60.782m2, referido na fls. 7 do Processo n.º 7/2018, constituído pelos Lote “O” para fins habitacionais, Lote “S” para fins habitacionais e Lote “Pa” para fins industriais.
3. Em conformidade com o estipulado no n.º 1 da 2.ª cláusula do aludido contrato de concessão, o prazo de concessão foi fixado em 25 anos, contados a partir da data da outorga da escritura pública do contrato.
4. Nos termos da cláusula 5ª, nº 7 do contrato de concessão inicial, titulado pelo despacho nº 160/SATOP/90, estipula-se que para efeitos da contagem do prazo referido no número um desta cláusula, entender-se-á que, para a apreciação de cada um dos projectos referidos no número dois, os serviços competentes observarão um prazo de sessenta dias. (C1)
5. Por Despacho n.º 123/SATOP/93, publicado na II Série do Boletim Oficial n.º 35, de 01 de Setembro de 1993, e nos termos que já tinham sido previstos no Despacho nº 160/SATOP/90, foi à 1.ª ré concedida uma parcela de terreno, designada por “Pb”, destinada a ser anexada à parcela “Pa”, constituindo um lote único, com a área global de 67.536 m2 e tinha em vista viabilizar o projecto de instalação de um “complexo industrial”. (D)
6. Através dessa rectificação, o prazo de aproveitamento do citado terreno foi prorrogado até 26 de Dezembro de 2000. (E)
7. Depois, procedeu-se à anexação das parcelas “Pa” e “Pb”, sendo o respectivo terreno registado sob a descrição n.º 2****, no livro n.º B68M, com a denominação de Lote “P”. (F)
8. Refere o Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, publicado na II Série do «Boletim Oficial da RAEM» n.º 9, de 01 de Março de 2006: “É parcialmente revista, nos termos e condições do contrato em anexo, a concessão, por arrendamento, do terreno com a área global de 91.273 m2, constituído por três lotes designados por «O», «P» e «S», situado nos Novos Aterros da Areia Preta (NATAP), na península de Macau.” (G)
9. Por Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, publicado na II Série do «Boletim Oficial da RAEM» n.º 9, de 01 de Março de 2006, foram acordados a alteração de finalidade e o reaproveitamento do Lote “P”, do qual passou a constar a construção de um edifício, em regime de propriedade horizontal, constituído por um pódio com cinco pisos, sobre o qual assentavam dezoito torres com quarenta e sete pisos cada uma. (H)
10. O prazo de aproveitamento do terreno foi de 96 meses, contados a partir da data da publicação no «Boletim Oficial da RAEM» do despacho que titulasse a respectiva revisão. (I)
11. Em 29 de Abril de 2008, a 1.ª ré apresentou à Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, um plano de consulta sobre a alteração da arquitectura do Lote “P”, situado nos Novos Aterros da Areia Preta. (J)
12. Em 15 e 30 de Janeiro de 2014, a 1.ª ré submeteu pedidos de prorrogação do prazo de aproveitamento, nos quais apresentou como fundamento: motivos não imputáveis a si causaram a impossibilidade do aproveitamento até à presente data. (K)
13. Em 04 de Junho de 2014, a 1.ª ré voltou a requerer, junto da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes, a prorrogação do prazo de aproveitamento. (L)
14. Em 29 de Julho de 2014, a Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes enviou à 1.ª ré um ofício, assinado pelo seu director, substituto, do seguinte teor: (M)
“1. Nos termos da cláusula 2.ª do contrato de concessão de terreno revisto pelo Despacho do Secretário para os Transportes e Obras Públicas n.º 19/2006, o prazo de aproveitamento do terreno já ficou caduco aos 28 de Fevereiro de 2014; no entanto, nos termos do artigo 2º do Despacho nº 160/SATOP/90, o prazo de arrendamento do terreno vai acabar aos 25 de Dezembro de 2015.
2. Como o atraso do aproveitamento do terreno é imputável à vossa empresa, e tendo em conta que esta não é a primeira vez que a vossa empresa requer prorrogar o aproveitamento de terreno, e visto que já concordou aceitar a forma de punição para o atraso prevista no contrato; para o efeito, nos termos do Despacho proferido pelo Chefe do Executivo aos 15 de Julho de 2014, autoriza-se prorrogar o prazo de aproveitamento do terreno até 25 de Dezembro de 2015, e aplica-se a multa no valor de MOP$180.000,00 (cento e oitenta mil patacas). Mas para garantir os interesses públicos, a empresa concessionária obriga-se previamente a prometer por escrito aceitar as seguintes condições:
2.1 Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5.º da Lei nº 7/2013 - «Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção» - a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no lote “P” ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
2.2 Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.
3. Nestes termos, avisa-se a vossa empresa para entregar a promessa escrita acima mencionada, para ser transferida à Comissão de Terras para acompanhar, a fim de emitir a guia do pagamento da multa.”
15. A 1.ª ré efectuou o pagamento da multa de 180.000,00. (N)
16. Em 04 de Agosto de 2014, a 1.ª ré comunicou ao Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes o seguinte: (O)
“…declara aceitar a multa no valor de MOP$180.000,00, condenada segundo o despacho proferido aos 15 de Julho de 2014, e também as seguintes condições:
1. Antes de o prazo de concessão por arrendamento do terreno caducar, se o aproveitamento do terreno ainda não for concluído, mesmo se está de acordo com os requisitos dispostos no artigo 5º da Lei nº 7/2013 - «Regime jurídico da promessa de transmissão de edifícios em construção» - a concessionária não vai pedir autorização prévia para efectuar os actos jurídicos da promessa de transmissão do edifício em construção no Lote “P" ou da promessa de oneração, nem vai praticar esses actos jurídicos, excepto se o terreno for concedido de novo nos termos legais;
2. Se no futuro o terreno não for concedido nos termos legais, a empresa concessionária não pode reclamar qualquer indemnização ou compensação à RAEM.”
17. No dia 27 de Novembro de 2015, a 1.ª ré apresentou ao Chefe do Executivo um pedido de prorrogação dos prazos de aproveitamento e de concessão por um período não inferior a 60 meses, contados a partir de 26 de Dezembro de 2015. (P)
18. No dia 30 de Novembro de 2015, o Chefe do Executivo concordou com o parecer que lhe foi submetido, o qual considerava não dever ser deferido o aludido pedido de prorrogação. (Q)
19. Em 26 de Janeiro de 2016, o Chefe do Executivo proferiu o seguinte despacho: (R)
“Concordo, pelo que declaro a caducidade da concessão, por arrendamento e com dispensa de hasta pública, a que se refere o Processo nº 2/2016 da Comissão de Terras, nos termos e com os fundamentos do Parecer do Secretário para os Transportes e Obras Públicas, de 22 de Janeiro de 2016, os quais fazem parte integrante do presente despacho.”
20. Depois, contra o despacho do Chefe do Executivo, de 26 de Janeiro de 2016, a 1.ª ré interpôs recurso contencioso, requerendo a sua anulação. (S)
21. Em 19 de Outubro de 2017, o Tribunal de Segunda Instância proferiu o acórdão que julgou improcedente o recurso contencioso, interposto pela 1.ª ré, mantendo-se o acto administrativo recorrido. Não conformada, a 1.ª ré apresentou recurso jurisdicional junto do Tribunal de Última Instância contra o respectivo acórdão. (T)
22. Em 23 de Maio de 2018, o Tribunal de Última Instância proferiu o acórdão que negou provimento ao recurso, mantendo-se o acto administrativo recorrido. (U)
23. Em 11 de Abril de 2011, foi celebrado entre a 1.ª ré e o 2.º ré o contrato-promessa de compra e venda do imóvel, sobre a fracção habitacional H, do 9.º andar, do bloco 6, do prédio situado em Macau, na Areia Presta, s/n. «Lote P», ou seja, lote em desenvolvimento da construção, descrito na Conservatória de Registo Predial de Macau sob o n.º 2****. (vide fls. 46 a 50, cujo conteúdos aqui se dá por integralmente reproduzidos) (U-1)
24. Foi combinado entre a 1.ª ré e a 2.ª que o preço de compra e venda da fracção em causa era de três milhões, oitocentos e vinte mil dólares de Hong Kong (HKD$3.820.000), equivalente a três milhões, novecentas e trinta e quatro mil e seiscentas patacas (MOP$3.934.600). (U-2)
25. Aquando da outorga do dito contrato-promessa de compra e venda do imóvel, a 2.ª ré pagou à 1.ª ré a quantia de um milhão, cento e quarenta e seis mil dólares de Hong Kong (HKD$1.146.000), a título de custo Para a aquisição da dita fracção e o remanescente seria pago à 1.ª ré nos termos da cláusula 3.ª, n.º 3b), do contrato em causa. (U-3)
26. Segundo o referido contrato-promessa, a 1.ª ré prometeu entregar a fracção, no prazo de 1.200 dias úteis de sol (ou seja, excluídos domingos, feriados e dias de chuva), contados a partir da conclusão do primeiro piso para habitação das obras de superestrutura; no caso de entrega fora do prazo, a 1.ª ré compensaria a 2.ª ré com juros de mora, calculados à taxa de juro de depósito bancário sobre o preço do imóvel já recebido. (U-4)
27. Em 26 de Abril de 2012, as duas rés celebraram com a 1ª autora a Declaração de Alienação do Direito de Propriedade sobre a Fracção do Edifício “(X)”, a 2.º ré cedeu à 1.ª autora a posição contratual de promitente-comprador. (vide fls. 57 a 58, cujo conteúdos aqui se dão por reproduzido integralmente) (U-5)
28. Conforme consta da dita Declaração de Alienação do Direito de Propriedade sobre a Fracção do Edifício “(X)”, a 2.ª ré cedeu voluntariamente à 1.ª autora a sua posição contratual de promitente-comprador no contrato-promessa de compra e venda da fracção habitacional H, do xº andar, do bloco x, do edifício “(X)” situado em Macau, na Areia Preta, xx, Lote “x” em desenvolvimento da construção, celebrado com a 1.ª ré. Declarou já ter efectuado o pagamento parcial da quantia à 1ª ré e cuja sua entrega ficou concluída no mesmo dia, sendo a 1ª ré promitente-vendedora, também concordou com a transferência da posição contratual em causa, e o remanescente de dois milhões, seiscentos e setenta e quatro mil dólares de Hong Kong (HK2.674.000,00) seria integralmente pago pela 1.ª autora ou através de empréstimo bancário garantido por hipoteca a favor da 1ª ré, no prazo de sete dias após a emissão da licença de utilização (licença de habitação) pela DSSOPT de Macau. (U-6)
29. Em 10/09/2004, a Ré apresentou um Estudo Prévio junto da DSSOPT (T-4803), seguido de um estudo prévio complementar. (V)
30. Tal Estudo Prévio foi aprovado pela DSSOPT em 21/1/2005, por Ofício com o nº 747/DURDEP/2005. (W)
31. A DSSOPT emitiu três Plantas de Alinhamento Oficiais (PAO’s): uma em 23/12/2004, outra em 23/2/2005 (cfr. Doc. n.º 5 junto com a contestação) e a terceira em 11/5/2007. (X)
32. Em 23/02/2010, a DSSOPT emitiu nova PAO (Doc. n.º 13 junto com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais). (Y)
33. A PAO referida em Y) foi notificada à Ré, em 09/04/2010, através do Ofício nº 4427/DURDEP/2010. (Doc. n.º 14 junto com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais) (Z)
34. Em 11/05/2011, a Ré apresentou o relatório de impacto ambiental (1.º relatório) (T-5205/2011). (AA)
35. A Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA), levou 1 mês para emitir o parecer, de 21/06/2011. (BB)
36. Depois, tal parecer foi notificado à R. em 04/10/2011 (ofício com referência n.º 11599/DURDEP/2011). (CC)
37. Não obstante isso, em tal parecer a RAEM introduziu várias novas exigências, designadamente no que respeita a: (DD)
- Ruídos;
- Qualidade de água;
- Paisagem;
- Vista;
- Voo de pássaros;
- Estacionamento automóvel nas redondezas da ETAR;
- Outros.
38. O 2.º Relatório foi apresentado pela R. em 19/04/2012 (6 meses de preparação) (T-4242/2012). (EE)
39. Em 31/08/2012, a R. apresentou o 3.º Relatório de Avaliação do Impacto Ambiental (tendo levado um mês para a sua preparação). (FF)
40. A DSPA entregou à DSSOPT, em 16/10/2012, o seu Parecer sobre o 3.º Relatório. (GG)
41. Em 15/03/2013, a R. apresentou o 4.º Relatório de Avaliação do Impacto Ambiental (T-3953/2013). (HH)
42. Em 03/05/2013, a DSPA emitiu o seu 4.º Parecer para a DSSOPT, sobre o 4.º Relatório apresentado pela R. (tendo levado para o efeito 2 meses). (II)
43. Tal Parecer apenas foi notificado à R. em 28/12/2012. (JJ)
44. Aprovado o projecto de obra em 15/10/2013, a Ré, em 24/10/2013, requereu a licença para as obras de fundações (T-11874/2013). (KK)
45. A DSSOPT, em 02/01/2014, emitiu tal licença e com validade até 28/02/2014, i. é, inferior a dois meses. (LL)
46. A 2ª ré e a 1ª autora negociaram sobre a cedência da posição contratual de promitente-compradora no contrato-promessa de compra e venda do imóvel mencionado na alínea U-1. (Q 5.º)
47. No próprio dia de 02 de Março de 2012, a 1ª autora pagou, à agência imobiliária do 2.º réu, a quantia de novecentos mil dólares de Hong Kong (HKD$900.000,00), a título de adiantamento da parte do preço pela transmissão da posição contratual. (Q 6.º)
48. Em 06 de Março de 2012, a 1ª autora, o 2º réu e o agente imobiliário da Agência XX assinaram o “contrato de compromisso de compra e venda de imóvel”, ao mesmo tempo, o 2º réu também confirmou o facto acima referido. (vide fls. 52 a 55 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido integralmente) (Q 7.º)
49. Em 23 de Abril de 2012, a 1ª autora pagou ao 2º réu o valor de alienação de um milhão, quatrocentos e cinquenta e seis mil dólares de Hong Kong (HKD$1.456.000,00), nos termos da alínea C da cláusula 2ª do referido “Contrato de compromisso de compra e venda de imóvel”. (Q 8.º)
50. A 1ª autora e o 2º autor casaram-se em Macau, em 07 de Outubro de 1985. (Q 11.º)
51. Já em 2011, a 1ª ré iniciara a venda de “fracções a construir” do Edifício “(X)”, a construir nesse terreno, e a celebrar, com terceiros, contratos-promessa de compra e venda do imóvel e consentimentos de transmissão da posição contratual de promitente-comprador. (Q 12.º)
52. A ré tinha capacidade de construir o referido edifício dentro de quatro anos. (Q 13.º)
53. A 1ª ré tinha perfeito conhecimento de que o prazo de aproveitamento era de 25 anos. (Q 14.º)
54. O Governo da RAEM anunciou a decisão sobre a recuperação do Lote “x”, situado em Macau, no Bairro da Areia Preta, x, para desenvolvimento urbanístico, com a construção de fracções habitacionais do plano de renovação urbana. Sendo que parte dessas fracções seriam destinadas à venda aos proprietários do Edifício “(X)” para lhes ajudar a resolver a questão de habitação ou melhorar o ambiente habitacional. (Q 15.º)
55. Em nenhum dos documentos referidos em X) se previa quer a necessidade de um afastamento mínimo de 1/6 da altura do prédio mais alto entre as diversas torres a construir no terreno, quer a de um limite máximo de 50 metros para a extensão das fachadas das torres. (Q 16.º)
56. Também em lado nenhum se previa a apresentação e aprovação de Relatórios de Avaliação do Impacto Ambiental e de Circulação do Ar. (Q 17.º)
57. Em 29/04/2008, a Ré apresentou o Plano de Consulta “Master Layout Plan”, relativo à proposta de localização das torres (T-3040) (Doc. n.º 10 junto com a contestação). (Q 18.º)
58. Em 06/05/2008, a Ré apresentou o projecto inicial de arquitectura (T-3163) (Doc. n.º 11 junto com a contestação), mas decorridos 60 dias, a DSSOPT nada decidiu. (Q 19.º)
59. Este projecto, aliás, nunca chegou a ser analisado pela DSSOPT, porquanto o mesmo foi absorvido pelo projecto que contemplava todo o empreendimento, incluindo áreas comerciais, apresentado para aprovação em 22/10/2009. (Q 20.º)
60. A Ré havia solicitado, em 14/08/2009, a emissão de uma nova PAO e que as PAO de 2004 e 2007 eram iguais no respeitante às condicionantes urbanísticas. (Q 21.º)
61. Uma vez que a DSSOPT, ultrapassado o prazo contratual de 60 dias, não emitira a Planta solicitada, preocupada com o escoar do prazo de 96 meses de aproveitamento, a Ré não aguardou pela nova Planta e submeteu o projecto global de arquitectura, para efeitos de aprovação, em 22/10/2009 (T-7191/2009) (Doc. n.º 12 junto com a contestação). (Q 22.º)
62. O projecto apresentado em 22/10/2009 mantinha as mesmas soluções já previstas nos Estudos Prévios apresentados em 2004 e referidos em V. e W. dos factos assentes, as quais estavam em conformidade com o contrato de concessão revisto, com excepção do número de pisos das torres que no contrato era de 47 e no projecto era de 52. (Q 23.º)
63. A nova PAO e o referido ofício vieram formular exigências não previstas anteriormente e, através dos pontos 5 e 6 do referido Ofício sugeriram que a extensão máxima contínua das fachadas das torres fosse de 50 metros e que o afastamento mínimo entre as torres não fosse inferior a 1/6 da altura da torre mais alta. (Q 24.º)
64. O cumprimento desta exigência e desta sugestão alteraria de modo significativo, o citado modelo construtivo, o que constituiria uma inutilização do tempo já despendido para a sua concepção e elaboração. (Q 25.º)
65. O cumprimento da referida exigência e da referida sugestão implicava a necessidade de mais tempo para a redefinição do empreendimento, uma vez que haveria relocalização das torres. (Q 26.º)
66. Em 07/01/2011, a DSSOPT aprovou o projecto de arquitectura que tinha sido apresentado pela Ré, em 22/10/2009 (Ofício nº 318/DURDEP/2011) - Doc. n.º 16 junto com a contestação. (Q 27.º)
67. O projecto aprovado não contemplava a sugestão mencionada no n.o 6 do Ofício nº 4427/DURDEP/2010, de 09/04/2010. (Q 28.º)
68. Apesar da decisão de aprovação do projecto de arquitectura, a DSSOPT condicionou a emissão da licença de obra à condição de (a) a Ré apresentar um relatório de avaliação de impacto ambiental que poderia ser causado pela nova construção a implementar no Lote “x” e (b) de tal relatório vir ser aprovado pelo serviço administrativo competente da Região – a Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (“DSPA”) - cfr. Doc. n.º 16 junto com a contestação. (Q 29.º)
69. Aquando da celebração do contrato de revisão da concessão do lote de terreno em causa, e nas respectivas negociações, a Administração nunca afirmou ser necessário a apresentação e a aprovação de qualquer relatório de avaliação de impacto ambiental do empreendimento referido objecto do contrato, sem o que a obra de construção não se iniciaria. (Q 31.º)
70. Na apreciação do 2.º Relatório, a DSPA voltou a apresentar novas exigências, cujo teor foi objecto de discussão entre a XXX, a DSSOPT e a DSPA, em 25/07/2012 (Doc. n.º 20 junto com a contestação). (Q 32.º)
71. A R. precisou de preparar novo estudo para dar resposta às solicitações adicionais e supervenientes que foram feitas, sob pena de a licença de obra não ser emitida. (Q 33.º)
72. No parecer sobre o 3º Relatório, a DSPA voltou a formular novas exigências. (Q 34.º)
73. Desta feita, a R. precisou de fornecer: (Q 35.º)
1. Um estudo pormenorizado sobre o “Layout” das torres, com “simulação informática”; e
2. Uma avaliação sobre as partículas em suspensão.
74. A DSPA exigiu ainda da R. uma nova avaliação ou, em alternativa, a alteração do “Layout”, em virtude da questão da ETAR. (Q 36.º)
75. Para a elaboração do 4º relatório, a XXX precisou de recorrer a serviços especializados da Austrália, para a realização da “simulação informática”. (Q 37.º)
76. No parecer sobre o 4º relatório, a DSPA voltou a apresentar novas exigências, desta feita em relação à avaliação do impacto ambiental sobre os novos aterros, a ilha artificial, o fedor, etc.. (Q 38.º)
77. Tendo em vista evitar maiores demoras, a R. pediu uma reunião conjuntamente com a DSSOPT e a DSPA. (Q 41.º)
78. Essa reunião teve lugar em 26/07/2013. (Q 42.º)
79. Em 07/08/2013 (isto é, 12 dias depois da reunião), a XXX apresentou o 6.º Relatório de Avaliação do Impacto Ambiental (Doc. n.º 27 junto com a contestação). (Q 44.º)
80. Em 15/10/2013 ocorreu a aprovação final do Estudo de Avaliação do Impacto Ambiental e de Circulação do Ar, atento o parecer da DSPA de 29/08/2013, sujeita apenas a condições de pormenor, designadamente resultantes dos pareceres da CEM (17/06/2011), IACM (17/06/2011), Corpo de Bombeiros (01/06/2011) e DSAT (13/07/2011) (Doc. n.º 28 junto com a contestação). (Q 45.º)
81. O projecto da R. (apresentado em 22/10/2009 e parcialmente alterado em 03/06/2010 para atender a certos requisitos impostos pela DSSOPT), com a aprovação da DSSOPT de 07/01/2011, não sofreu quaisquer alterações de relevo. (Q 46.º)
82. O projecto submetido pela R. 4 anos antes (em 22/10/2009) já então satisfazia as exigências sobre a ventilação e respectiva avaliação do impacto ambiental. (Q 47.º)
83. A Ré deu de imediato início aos respectivos trabalhos logo a seguir à emissão da licença para as obras de fundações. (Q 48.º)
84. Se não fosse a impossibilidade temporária do aproveitamento do terreno em virtude da conduta da Administração, a Ré tinha concluído o empreendimento “(X)” dentro dos prazos de aproveitamento e de concessão. (Q 49.º)
85. A RAEM bem sabia, que o prazo que a Ré teve para o aproveitamento do projecto, após a emissão das licenças e suas prorrogações, era manifestamente insuficiente. (Q 50.º)
86. Os autores candidataram-se à aquisição de uma fracção autónoma ao abrigo da Lei n.º 8/2019 de 12 de Abril, por via do Despacho do Chefe do Executivo 89/2019, de 30 de Maio. (Q 56.º)
87. Em caso afirmativo, tal requerimento foi deferido. (Q 57.º)
88. Tal fracção é de tipologia, área e preço equivalentes à fracção que constitui o objecto do contrato em causa nos presentes autos e irá ser construída no terreno concessionado à ré que vem mencionado na alínea B) dos factos assentes. (Q 58.º)
89. Os autores apenas poderão receber do Governo tal fracção nas condições descritas porque são compradores de uma fracção autónoma à ré, a construir no mesmo terreno. (Q 59.º)
90. O valor de mercado dessa fracção é bastante superior ao valor inicialmente pago pelos autores. (Q 60.º)
*
三. 理由陳述
1. 就事實裁判提出之爭執方面:
第一被告針對待調查事實基礎內容第40、41第2部分、42第2部分及第43條的事實裁判提出爭執,有關內容如下:
40.º
  Em 28/06/2013, a R. apresentou o 5.º Relatório de Avaliação do Impacto Ambiental (Doc. n.º 25 junto com a contestação)?
41.º
  Tendo em vista evitar maiores demoras, a R. pediu uma reunião conjuntamente com a DSSOPT e a DSPA, para, em contacto directo, tentar imprimir maior celeridade ao procedimento de apreciação deste 5.º Relatório?
42.º
  Essa reunião teve lugar em 26/07/2013 (isto é, 1 mês depois de o 5.º Relatório ter sido apresentado?
43.º
  Dessa reunião, resultou novas exigências, que obrigaram a XXX a elaborar um novo relatório com conteúdo adicional?
原審法院就上述事實的裁判結果為:
- 待調查事實基礎內容第40及43條:“Não Provado”.
- 待調查事實基礎內容第41條:“Provado que tendo em vista evitar maiores demoras, a R. pediu uma reunião conjuntamente com a DSSOPT e a DSPA” .
- 待調查事實基礎內容第42條:“Provado que essa reunião teve lugar em 26/07/2013”.
原告則認為根據證人證言及卷宗的文件證據,待調查事實基礎內容第40至43條的事實應證實如下:
- 待調查事實基礎內容第40條:“Em 28/06/2013, a R. apresentou o 5.º Relatório de Avaliação do Impacto Ambiental”.
- 待調查事實基礎內容第41條:“A reunião conjunto com a DSSOPT e a DSPA pedida pela R. tentou imprimir mais celeridade ao procedimento de apreciação deste 5.º Relatório”.
- 待調查事實基礎內容第42條:“Essa reunião ocorreu um mês após a apresentação do 5.º relatório ambiental”.
- 待調查事實基礎內容第43條:“Dessa reunião resultaram novas exigências que obrigaram a XXX a elaborar um novo relatório com conteúdo adicional”.
現就有關問題作出審理。
在尊重不同見解下,我們認為該等事實即使獲得證實,也不會對本案的法律適用有任何改變,故第一被告對有關事實裁判提出之爭執是毫無意義的。
事實上,即使證實第一被告於2013年06月28日提交了第5次環評報告及已與相關部門(土地工務局及環境保護局)於2013年07月26日開會,並在會上對第一被告作出了新的要求,對本案的審判結果而言,不產生任何影響。
基於此,不需對這部分的上訴作出審理。
2. 就合同和涉及支付款項的性質方面:
第一被告認為原審法院錯誤界定案中的合同為預約買賣合同(contrato-promessa de compra e venda)及當中所涉及支付的款項為定金(sinal)。
其認為合同的正確法律定性是“樓花買賣合同”(contrato de compra e venda em projecto),而當中涉及支付的款項應為“訂金”(depósito)。
原審法院就有關問題作出了以下裁判:
“…
  Da qualificação do contrato.
  Como antes se referiu, os autores entendem que o contrato em discussão nos presentes autos deve ser qualificado como contrato-promessa, ao passo que a 1ª ré entende que deve ser qualificado como contrato atípico.
  A qualificação jurídica que as partes fazem dos factos a que cabe aplicar o Direito não vincula o tribunal (art. 567º do CPC).
  A qualificação dos contratos pertence à lei e não às partes. É uma operação muito relevante, pois vai determinar o regime jurídico aplicável à relação contratual. No caso dos autos está em causa a aplicabilidade ou a inaplicabilidade da presunção legal de que é sinal toda a quantia entregue pelo promitente comprador ao promitente vendedor em cumprimento do contrato-promessa de compra e venda (art. 435º do CC).
  Pois bem, a qualificação do contrato tem essencialmente por base a vontade negocial das partes plasmada no clausulado concretamente acordado relativamente às prestações a que se pretenderam vincular. É feita por comparação ou subsunção, tendo em conta os elementos do concreto contrato a qualificar e os elementos dos diversos tipos contratuais, podendo concluir-se que o contrato concreto se reconduz a um tipo, a nenhum ou a mais que um, sendo neste caso um contrato misto ou uma união de contratos.
  A nosso ver, deve atender-se de forma mais relevante às prestações características acordadas pelos contraentes, quer para qualificar o contrato, quer para se lhe determinar o regime quando se conclua que o contrato celebrado se trata de um contrato misto por agregar elementos de mais do que um tipo contratual.
  Faltando no contrato celebrado um elemento essencial de um contrato tipificado na lei, o acordo das parte não pode qualificar-se segundo tal tipo contratual.
  Pois bem, então afinal a operação de qualificação do contrato redunda em duas operações: saber que prestação característica quiseram as partes e, depois, subsumi-la à prestação característica de um tipo contratual, de mais que um ou de nenhum.
  Vejamos então nos factos provados se, nas prestações concretamente acordadas pelas partes que ali constam, o seu acordo pode ou não ser qualificado como contrato-promessa.
  A prestação característica do contrato-promessa é a celebração de outro contrato, o contrato prometido. As partes comprometem-se a celebrar outro contrato (art. 404º do CC).
  Nos factos provados faz-se referência conclusiva à expressão “promessa de venda” (nºs 23., 25., 26., 46. ...). No entanto esta referência não é decisiva, pois que a qualificação do contrato é questão de direito e não de facto. Porém, o referido nº 23. dos factos provados remete, para o texto do acordo em análise. Desse texto constam expressões cujo significado aponta quer no sentido de as partes acordarem celebrar no futuro novo contrato (de compra e venda), quer no sentido de acordarem apenas formalizar no futuro um acordo já concluído. Com efeito, ora denominam o contrato de “contrato-promessa de compra e venda” e falam em prometer vender, “prometer comprar e “prometida venda” e denominam-se “promitente-vendedor” e “promitente-comprador”; ora falam em recuperação e revenda da fracção pela ré e alienação da fração pelo promitente-comprador antes da celebração da escritura pública de compra e venda (cláusulas 5ª e 9º).
  Pois bem, nesta situação em que se desconhece a vontade real das partes e estas a exteriorizaram por escrito em termos moldáveis, como referido, a declaração das vontades negociais vale com o sentido que lhe atribuiria o normal declaratário colocado na posição do real declaratário (art. 228º do CC).
  Ora, parece-nos decisivo o teor das cláusulas 9º a 22ª para saber o sentido que o normal declaratário atribuiria ao teor da declaração que as partes plasmaram no documento a que se reporta a alínea c) dos factos provados: - se lhe atribuiria o sentido de estar já concluído o acordo definitivo ou se lhe atribuiria o sentido de ainda haver algo para acordar no futuro.
  Na referida cláusula 22ª refere-se que a 1ª ré pode fazer alterações de construção sem que a outra parte contratual possa recusar a “transacção”, o que aponta no sentido de haver ainda acordo a fazer no futuro que as partes denominaram “transacção” e que não podia ser recusado com determinado fundamento.
  A cláusula 9ª aponta também para que as partes quisessem ainda novo contrato. Com efeito, estabeleceram condições onerosas para a cessão da posição contratual. Ora, se as partes já considerassem a propriedade da fracção na esfera jurídica do “comprador”, porque considerariam que este não era dono integral e não podia transferir para terceiro sem o consentimento da ré e sem a remunerar?
  Este “mecanismo” de cessão da posição contratual aponta no sentido de que, no entendimento das partes contratantes, a 1ª ré não se desligou da prestação característica do contrato-promessa que é celebrar outro contrato e que, por isso, receberá comissão para celebrar esse novo e futuro contrato com terceiro, não se tratando apenas de uma modificação subjectiva do mesmo contrato. Se na vontade real dos contraentes a ré já nada tivesse a ver com a fracção autónoma em causa nem com a prestação característica do contrato promessa, a comissão que tem direito a receber por consentir na cessão da posição contratual seria incompreensível na economia do contrato. De facto, as partes não estabeleceram a necessidade de consentimento e de pagamento de comissão para as vendas posteriores à celebração da escritura pública de compra e venda, o que aponta para que, no espírito dos contraentes, a situação negocial é diferente antes e depois da escritura, porque a fracção está em esferas jurídicas diferentes nesses dois momentos.
  Se as partes considerassem que celebraram um contrato de compra e venda de bem futuro não era necessário regular a cessão da posição contratual que regularam. O comprador de bem futuro pode vender a coisa como pode o comprador de bem já existente. O proprietário que adquiriu por contrato não transmite a sua posição contratual quando vende. Não transmite um crédito, mas transmite um direito real, ainda que futuro, ainda que suspenso. Se as partes sentissem que a fracção autónoma já pertencia ao autor em termos de direito real futuro, não colocariam qualquer entrave a que o autor vendesse, também como bem futuro. A justificação que a ré dá (conhecer a quem deveria entregar a fracção e evitar actividades fraudulentas em relação a terceiros) não basta na perspectiva do normal declaratário para o pesado e caro/lucrativo mecanismo contratual estabelecido no caso de a 2ª ré já se sentir proprietária, apesar de ter suspensa a aquisição do direito de propriedade. Até porque a 1ª ré estava totalmente garantida face à falta de pagamento, pois faria suas as quantias que já lhe haviam sido pagas (cláusula 5ª do contrato em análise).
  Se a 1ª ré vendeu bem futuro, como defende, a 2ª ré e a 1ª autora também poderiam fazer o mesmo e vender o seu bem futuro sem necessidade de “autorização” da 1ª ré. A 1ª ré também não pediu autorização a ninguém para vender um bem futuro de que seria proprietária quando o construísse. Porque necessitavam a 1ª ré e os autores de “autorização” se eram tão proprietários futuros como a ré? É esta falta de explicação para a desconsideração da qualidade jurídica real da 2ª ré e da 1ª autora face a bens futuros que tem de levar o declaratário normal a concluir que, afinal, as rés consideraram que a 1ª ré apenas tinha direito de crédito e poderia ceder a posição contratual do contrato gerador desse direito de crédito, mas não podia vender bens futuros porque estes bens eram alheios, porque eram da 1ª ré. Ao regularem a cessão da posição contratual, as rés deixam entender que consideraram que a posição da 2ª ré que podia ser cedida era uma posição creditícia e não uma posição real, ainda que correspondente ao que pode designar-se na linguagem comum por “pequeno proprietário”. Isto é, as rés deixaram entender que a 2ª ré tinha um direito de crédito, um direito ao cumprimento de uma promessa de contratar, e não um direito real, ainda que futuro e em suspensão. Ao regularem a cessão de um crédito (posição contratual) as partes deixam entender ao declaratário normal que consideravam que a 2ª ré não tinha ainda um direito real sobre coisa futura. Deixam entender que a 2ª ré não pode transmitir a coisa futura (o seu direito real sobre ela), mas apenas pode transmitir a promessa da 1ª ré (um direito sobre a ré e não um direito sobre a coisa futura).
  É esta engrenagem negocial aliada à denominação que as partes deram ao contrato que celebraram que deve levar o “normal declaratário” a considerar que a prestação característica que a 1ª ré assumiu foi celebrar um contrato no futuro com o promitente originário ou com aquele a quem fosse cedida a posição contratual de promitrente-comprador.
  Em conclusão, dir-se-á que o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial quanto às prestações acordadas só é reconduzível ao tipo contratual de contrato-promessa.
  Da convenção de sinal.
  O sinal é um elemento eventual do conteúdo do negócio jurídico. Numa certa perspectiva, é, em essência, uma estipulação contratual, uma cláusula negocial.
  Seja qual for a qualificação que lhe seja dada, o sinal é sempre também uma convenção das pastes contratantes. Depende, pois, da existência de vontades negociais concordantes.
  Para se concluir se foi ou não estipulado sinal é necessário interpretar as declarações negociais das partes contratantes.
  Se os autores pretendem ser indemnizados segundo o regime do sinal, cabe-lhes, nos termos do art. 335º, nº 1 do CC, alegar e provar, entre o mais, os factos demonstrativos de ter sido estipulada a existência de sinal.
  Porém, no caso do contrato-promessa de compra e venda, como ocorre na situação sub judice, a parte que se quiser prevalecer da existência de sinal beneficia da presunção legal inserta no art. 441º do CC que diz que se presume “que tem carácter de sinal toda a quantia entregue pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor, ainda que a título de antecipação ou princípio de pagamento do preço”.
  Ora, quem tem a seu favor uma presunção legal, está dispensado de provar o facto a que ela conduz, sendo a parte contrária que tem de provar o facto contrário ao facto presumido (art. 343º, nºs 1 e 2 do CC). No caso dos autos, provou-se que a 2ª ré entregou à 1ª ré, promitente-vendedora, determinada quantia em dinheiro no âmbito do contrato promessa que ambas celebraram. Provou-se o facto base da presunção, pelo que está presumido que as partes quiseram atribuir carácter de sinal. Cabe, pois à ré, interessada em ilidir a presunção, a alegação e a prova do facto contrário ao facto presumido, isto é, cabe-lhe provar que as partes acordaram que a quantia entregue não tinha carácter de sinal. A 1ª ré não conseguiu fazer a prova dessa vontade negocial contrária à presunção legal (resposta negativa dada ao quesito 54º da base instrutória). Tem a 1ª ré de ver esta questão decidida em sentido contrário à sua pretensão. Com efeito, a 1ª ré logrou apenas provar que o contrato que celebrou refere a palavra preço, não constituindo tal facto “prova do contrário” do facto presumido. Isto é, não é prova de que as partes não quiseram atribuir carácter de sinal.
  Mas dir-se-á ainda que do contrato-promessa sub judice resulta que as partes quiseram que as quantias pagas pelo promitente-comprador ao promitente-vendedor sejam consideradas sinal. Com efeito, na cláusula 5ª do contrato referido em c) dos factos provados diz-se que a falta de pagamento das prestações do preço acordado implica a perda da quantia já paga. Trata-se do regime supletivo do sinal, pelo que parece clara a vontade das partes no sentido de terem pretendido constituir sinal.
  Mas, em caso de dúvida sobre o sentido que atribuiria o “declaratário normal”, deve, para se apurar o sentido com que a vontade declarada das partes deve valer, ponderar-se a medida em que o princípio do equilíbrio das prestações intervém na fixação do valor da vontade negocial declarada quando se desconhece a vontade real.
  Se é certo que não é determinante para qualificar o acordo das partes o facto de as partes terem denominado como contrato-promessa aquele acordo que celebraram, é igualmente certo que não é determinante para fixar o sentido com que deve valer a declaração negocial o facto de terem denominado de depósito a quantia monetária entregue pelo autor à ré em cumprimento do acordo que celebraram.
  Se a vontade real dos contraentes é conhecida pelo declaratário, é ela que deve vincular os declarantes (nº 2 do art. 228º do CC). Se essa vontade real não é conhecida, é a vontade declarada que vai determinar quais os vínculos contratuais que as partes devem cumprir. Para saber em que sentido a vontade declarada vincula é necessário interpretá-la, ou seja, avaliá-la intelectivamente para lhe apreender o sentido vinculador.
  Há, pois, que atender ao princípio do equilíbrio das prestações, o qual diz que, em caso de dúvida, o sentido da declaração é o mais equilibrado nos negócios onerosos, como é o dos autos.
  Ora, se em caso de incumprimento da 2ª ré a 1ª ré é indemnizada em “1.146.000”, qual será a vontade negocial que deve valer em caso de incumprimento da 1ª ré? Deve pagar apenas se se enriqueceu e só na medida do seu enriquecimento? Ou deve também ter uma pena e pagar o mesmo que a 2ª ré ou outra quantia, mas uma pena? Parece que o princípio do equilíbrio das prestações impõe que, em caso de dúvida, se conclua que as partes estabeleceram penas para ambas e que quiseram que a quantia entregue pelo autor fosse a medida da pena de ambas em caso de incumprimento definitivo.
  As partes não estipularam que em caso de incumprimento da 2ª ré a 1ª ré podia recorrer à acção de execução específica, nem à acção de condenação, nem à resolução do contrato com restituição do que foi prestado e indemnização dos danos efectivos. Estipularam o regime do sinal segundo o qual, em caso de incumprimento daquele que o prestou, aquele que o recebeu fica com ele para si sem direito a outra indemnização excepto se sofrer danos manifestamente superiores.
  Na dúvida, o princípio do equilíbrio das prestações “manda” que se atribua valor à declaração negocial das partes no sentido de ter sido estipulado sinal.
  Assim, mesmo que não se qualifique o contrato como contrato-promessa, há-de a quantia entregue ser qualificada de sinal de acordo com o sentido com que deve valer juridicamente a declaração negocial das partes.
  Portanto, mesmo sem a presunção legal referida, sempre a vontade das partes deve ser interpretada no sentido de terem convencionado sinal.
  Conclui-se, pois, que foi acordado sinal no caso em apreço.
…”。
我們認同有關決定,故根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用上述決定及其依據,裁定這部分的上訴理由不成立。
就同一司法見解,可參閱本院於2024年05月09日在卷宗編號22/2024內作出的裁判。
事實上,卷宗第47至49頁及58頁之文件不論在合同名稱內容上均毫無疑問地表明相關的合同是一預約買賣合同。
就所支付的款項性質方面,根據《民法典》第435條之規定,“在買賣之預約合同中,預約買受人向預約出賣人交付之全部金額,即使以提前履行或首期價金之名義交付者,亦推定具有定金性質”。
本案中沒有任何實質證據可推翻上述法律推定。第一被告的立場僅是其一面之詞。
3. 就合同的不履行是因第三人的過錯方面:
第一被告認為有關合同是因澳門特別行政區的過錯而不能履行,故其應負上責任。
原審判決就有關問題作出以下見解:
“…
2.1.2. – Da imputação da causa da impossibilidade da prestação.
  Vimos já que a prestação da 1ª ré se tornou impossível depois de estabelecida por via contratual.
  As partes divergem agora sobre a imputabilidade da causa da impossibilidade da prestação da 1ª ré.
  O art. 790º do CC, sob a epígrafe “imputabilidade culposa” dispõe que “tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação”.
  Em rigor, esta situação de impossibilidade imputável da prestação não é conceitualmente incumprimento, mas é considerada como incumprimento definitivo.
  Tendo em conta a forma como a nossa lei sistematiza o regime jurídico da impossibilidade da prestação (por causa imputável ao devedor e por causa que não lhe é imputável, mas com presunção de imputabilidade), o que releva em primeiro lugar é saber se a causa da impossibilidade é ou não é imputável ao devedor. Só depois de concluir que não é imputável ao devedor é que poderá relevar saber se é imputável a outrem, designadamente ao credor, a terceiro ou a ninguém (caso fortuito ou de força maior).
  2.1.2.1. A causa da impossibilidade.
  Já vimos que a prestação da 1ª ré é impossível, seja esta prestação a celebração de um contrato definitivo de compra e venda de um imóvel, seja essa prestação a construção do referido imóvel e a sua entrega aos autores.
  Já vimos que a causa imediata da impossibilidade da prestação não é uma impossibilidade física de construir e entregar, mas jurídica, pois que a ré, tendo condições materiais para construir e entregar, não tem possibilidade jurídica por não ter direito sobre o terreno onde iria construir que lhe permita edificar o empreendimento que pretendia e que lhe permitiria cumprir a sua obrigação para com os autores.
  Porém, a 1ª ré já teve em tempos o direito que lhe permitia construir, o direito do concessionário por arrendamento, direito que caducou. Assim, a causa intermédia da impossibilidade da prestação é a caducidade da concessão que causou a impossibilidade jurídica.
  Ocorre que a concessão caducou porque a ré não concluiu a construção do seu empreendimento imobiliário em determinado prazo, o prazo de aproveitamento do terreno concessionado. Assim, a causa remota da impossibilidade jurídica da prestação é o atraso na execução das obras que levou à caducidade da concessão.
  A causa da impossibilidade jurídica da prestação da 1ª ré é, pois, o facto de as obras de aproveitamento do terreno concessionado não terem sido concluídas no prazo de aproveitamento.
  Interessa, pois, saber a quem é imputável esse atraso que causou a impossibilidade jurídica da prestação ao causar a caducidade da concessão que permitiria cumprir. A 1ª ré entende que o atraso não lhe é imputável porquanto fez todos os esforços para conseguir construir em prazo e evitar a caducidade da concessão. E entende que o referido atraso é imputável à RAEM que “não a deixou” construir dentro do prazo de aproveitamento da concessão.
2.1.2.2. A imputação da causa da impossibilidade.
  A imputação é uma operação jurídica destinada a atribuir a uma esfera jurídica os efeitos jurídicos de um facto. Normalmente, os efeitos negativos de um facto, a criação de um dever jurídico ou de uma obrigação ou a extinção de um direito ou de uma faculdade jurídica.
  Os factos jurídicos têm efeitos jurídicos, ou seja, produzem alteração no mundo dos direitos e deveres jurídicos. É necessário saber em que esfera jurídica se vão produzir esses efeitos. Este é, em modo simplista, o problema da imputação.
  No caso em apreço, reconhecida a ilegitimidade processual do 2º autor, está em causa a atribuição à esfera jurídica da 1ª ré da obrigação de indemnizar a 1ª autora enquanto efeito de um facto que tornou impossível uma prestação contratual de que a 1ª autora era credora. O facto é, como se disse, a não construção da fracção contratualmente destinada à 1ª autora no prazo também contratualmente estabelecido para aproveitamento do terreno onde aquela fracção estava projectada. Um facto negativo: não construção em prazo de caducidade do direito de construir. O efeito daquele facto que cabe atribuir a uma esfera jurídica é, o nascimento nessa esfera jurídica da obrigação de indemnizar.
  A imputação é um juízo jurídico, um juízo normativo ou um juízo feito por referência a um critério normativo de imputação, um juízo feito por referência a uma razão normativa para justificar a atribuição a alguém dos efeitos jurídicos de um facto.
  Segundo o nosso Direito é a culpa do titular de uma esfera jurídica devedora o critério normativo de imputação a essa esfera jurídica dos efeitos que tem um facto causador da impossibilidade da prestação, designadamente os efeitos geradores do dever de indemnizar. Com efeito, a epígrafe do referido art. 790º é “impossibilidade culposa” e o seu primeiro número determina que aquele a quem for imputada a causa da impossibilidade da prestação seja tratado (imputado) como se faltasse culposamente ao cumprimento da sua obrigação.
  Se a imputação é um juízo formado por referência à culpa, a culpa é também ela própria um juízo. É um juízo de censura dirigido a uma pessoa por ter praticado (por acção ou omissão) um acto ilícito em vez de ter praticado um acto lícito alternativo. Em matéria de responsabilidade civil, como é a que está aqui em ponderação, tal juízo de censura, dirigido a um agente por ter praticado o acto ilícito em vez do acto lícito devido e possível, pressupõe que o agente tenha capacidade de culpa, isto é, tenha capacidade de entender e querer no momento em que actuou (que não seja inimputável – art. 481º do CPC). Mas pressupõe também que o agente não inimputável não respeite um dever objectivo de diligência que sobre ele impende quando actua em sociedade com possibilidade de causar danos a outrém. Esse dever de cuidado corresponde exactamente à diligência que um bom pai de família teria nas circunstâncias que o agente actuou (Art. 480º, nº 2 do CC). O agente, na tentativa de evitar o acto ilícito, não pode intencionlmente ou de forma imprudente deixar de observar o referido dever de cuidado medido pelo padrão de diligência de um bom pai de família e não pelo padrão de diligência habitual do próprio agente. Se observar o cuidado devido e, mesmo assim, o acto ilícito ocorrer, este ilícito não lhe é imputável a título de culpa.
  O acto ilícito em causa no caso sub judice é um ilícito contratual equiparado ao incumprimento contratual. É a impossibilidade da prestação. É a não construção em prazo. Nenhuma dúvida se colocando quanto à capacidade de culpa da 1ª ré (capacidade de entender e querer), há, pois, que averiguar se a prestação se tornou impossível porque a 1ª ré não actuou com o grau de diligência devido.
O momento a que se reporta o juízo de culpa é aquele em que o agente praticou o acto ilícito. Cabendo aferir se no momento em que o agente actuou de modo ilícito poderia ter querido e podia ter actuado de modo lícito se, estando capaz de entender e querer, actuasse como actuaria um bom pai de família.
  No caso dos autos a actuação da 1ª ré a submeter ao crivo da actuação do bom pai de família é duradoura e não de execução imediata. Com efeito, a prestação contratual devida pela 1ª ré requeria entre três a quatro anos para que pudesse ser executada/prestada. Esse período de actuação da 1ª ré a considerar em termos de juízo de culpa começa com a celebração do contrato com a 2ª ré (11/04/2011) e acaba no termo efectivo do prazo de aproveitamento determinante da caducidade da concessão (25 de Dezembro de 2015, depois de prorrogado de 28/02/2014). Com efeito, a impossibilidade da prestação ocorreu porque a 1ª ré não construiu após ter contraído perante a 2ª ré o dever de prestar (construir e entregar) e até ao momento em que deixou definitivamente de poder construir e de poder cumprir a sua prestação por ter terminado a concessão do terreno da construção.
  Cabe, pois, aferir se no referido período temporal a 1ª ré actuou com a diligência com que actuaria um bom pai de família, uma vez que não está questionada a capacidade da ré para formar uma vontade livre e esclarecida.
A culpa da ré determinada pelo grau de diligência de um bom pai de família perspectivada nos termos de “actio libera in causa” negligente.
  Dispõe o art. 481º, nº 1 do CC que “não responde pelas consequências do facto danoso quem, no momento em que o facto ocorreu, estava, por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer, salvo se o agente se colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório”.
  Esta disposição legal revela que o juízo de culpa em matérias de responsabilidade civil pode ser fundado em comportamento do agente praticado em momento anterior à prática do acto ilícito causador dos danos a indemnizar, desde que o agente não seja suscetível de censura no momento da prática desse acto mas seja susceptível dessa mesma censura no momento anterior em que foi originada a causa que impede o juízo de censura no momento da prática do acto danoso. Ou seja, pelo critério do “bonus pater famílias” o agente não está “livre” e censurável no momento da prática do acto ilícito, mas colocou-se nessa situação intencionalmente ou por imprudência, estando “livre” e censurável no momento em que ocorre a “causa” da circunstância que lhe exclui a culpa.
  O caso que deu origem a este avanço da ciência do Direito provém do Direito criminal e terá sido o caso de um funcionário dos caminhos de ferro que se embriagou e estava inconsciente no momento em que tinha de “mudar as linhas” para que dois comboios seguissem orientações diferentes e, nada tendo feito, ocorreu uma colisão entre dois comboios num momento em que o funcionário estava incapaz de culpa por estar incapaz de entender e querer o comportamento lícito alternativo ao comportamento ilícito que praticara em estado de inconsciência.
  A acção de não mudar as linhas dos comboios não era censurável ao funcionário por não ser em si própria uma acção livre por falta de capacidade para entender e qurer no estado de embriaguez completa. Porém a sua causa foi livre, pois que o funcionário se embriagou de forma intencional para não ser censurado ou de forma apenas imprudente ou negligente. A acção não livre era, afinal, livre na sua causa e, por isso, ainda susceptível de ser dirigido ao seu autor um juízo de censura em termos de culpa por não ter optado pela acção lícita alternativa. O funcionário não era “livre” no momento da colisão dos comboios, mas era “livre” de não se embebedar quando, com possibilidade de prever que a colisão iria ocorrer, se embebedou - a “actio libera in causa”.
  O funcionário devia ser censurado “in causa” ou na origem da causa da desculpação da sua acção de não “mudar as linhas” como era seu dever.
Vejamos em que medida a “ideia” da actio libera in causa pode auxiliar na decisão do presente caso, ou seja, na decisão de dirigir ou não dirigir à ré um juízo de censura em termos de culpa por a sua prestação se ter tornado impossível em vez de ter sido prestada antes de, por esgotamento do prazo de aproveitamento da concessão, ocorrer a impossibilidade de construir.
  Trata-se da culpa pela causa da impossibilidade, presumindo-se em relação ao devedor e cabendo a este provar que a impossibilidade sobreveio apesar de ter feito o esforço exigível para que não sobreviesse, um esforço cuja medida de exigibilidade é determinada pelo esforço que faria um bom pai de família colocado na situação do devedor no momento da causa da acção livre (actio libera in causa), o momento da celebração do contrato com o credor, e não no momento em que a prestação se tornou impossível (causa da impossibilidade – caducidade da concessão e três a quatro anos imediatamente anteriores).
  A 1ª ré diz que não conseguiu construir em tempo a fracção autónoma que devia entregar aos autores porque a RAEM não lhe permitiu ao colocar-lhe entraves ilegais que impediram a construção atempada.
Por outro lado, a ré diz ainda que a RAEM lhe criou expectativas que lhe permitiria construir mesmo para lá do fim do prazo de aproveitamento da concessão, quer não fazendo terminar a concessão, quer atribuindo-lhe uma nova concessão.
  A actuação de terceiro que a 1ª ré invoca para não lhe ser imputada a título de culpa (censura) a superveniência da impossibilidade da prestação tem de ser avaliada a dois níveis. A criação de entraves ilegais respeita à possibilidade de actuação da 1ª ré e a criação de expectativas que se vieram a frustrar respeita à liberdade de decisão, designadamente à vontade não esclarecida porque formada em erro relativo às expectativas.
  Digam-se desde já três coisas sobre a relevância exculpante da alegada actuação da RAEM materializada em factos objectivamente impossibilitantes (entraves) e em factos subjectivamente desculpantes (expectativas):
  Relativamente à criação de entraves:
  - Não estamos em sede do chamado “facto do príncipe” em que um terceiro estranho à relação contratual impede a prestação por força do seu poder de autoridade pública que o devedor não pode ultrapassar. De acordo com a alegação da 1ª ré, no caso em apreço a RAEM actuou apenas como parte num contrato de concessão por arrendamento e, por vezes, não o cumpriu e criou entraves. É certo que a 1ª ré não teria ao seu dispor meio fácil, ágil e atempado de compelir a RAEM a cumprir a cooperação contratual que alegadamente não cumpriu. Porém, para efeitos de análise, mesmo apesar das reconhecidas dificuldades da 1ª ré, ainda não se justifica qualificar a actuação da RAEM como “facto do príncipe”, o qual, por ser inultrapassável ou só ultrapassável por meios inexigíveis, torna a impossibilidade superveniente da prestação não imputável ao devedor;
  - Relevam apenas para exclusão da culpa da 1ª ré os entraves criados pela actuação da RAEM (alegadamente causadora da impossibilidade da prestação) que ocorreram depois de a 1ª ré ter celebrado o contrato com a 2ª ré, pois que antes disso não havia qualquer prestação devida pela 1ª ré que a RAEM pudesse impossibilitar de cumprir. Não releva, pois, a sugestão/exigência da RAEM para a 1ª ré fazer alterações ao projecto de arquitectura, designadamente aumentando o afastamento entre torres, uma vez que tudo ocorreu antes da celebração do contrato entre as rés. De facto, não existindo ainda dever de prestar, não poderia o mesmo dever ficar impossibilitado de ser cumprido.
  Relativamente às expectativas:
  - Relevam apenas para exclusão da culpa da 1ª ré as expectativas alegadamente criadas pela RAEM antes de a 1ª ré ter celebrado o contrato com o autor, pois que depois disso não foi assumida qualquer prestação pela 1ª ré que pudesse ser fundada em expectativas de poder cumprir. Não releva, pois, a prorrogação do prazo de aproveitamento e a emissão de licença de obras, uma vez que não contribuíram com expectativas para a decisão da 1ª ré de contrair o dever de prestar (construir e entregar) que já havia contraído. De facto, já existindo dever de prestar, não poderia o mesmo ter sido contraído com base em expectativas criadas posteriormente. Refira-se, no entanto, que não se provaram as causas de tais expectativas.
  Vejamos então se deve ser dirigido à 1ª ré um juízo de culpa semelhante ao que é dirigido ao agente nos casos de “actio libera in causa”.
  Se a imputação da impossibilidade se faz pelo juízo de culpa e se esta pode ser aferida “in causa” ou na origem da impossibilidade e não no tempo em que ocorre a impossibilidade, tratar-se-á de impossibilidade da prestação por causa imputável “in causa” ao devedor. Trata-se afinal de imputação da “causa que causou a causa” da impossibilidade.
  A prestação tornou-se impossível. Mas no momento em que a prestação foi acordada seria já previsível a um bom pai de família medianamente previdente e prudente que era consistente a probabilidade de não ser possível a construção no prazo de aproveitamento? E se fosse previsível, como procederia um bom pai de família? Contrataria, arriscando que a impossibilidade não ocorreria? Contrataria apenas depois de esclarecer a outra parte contratual da probabilidade de não ser possível a construção no prazo de aproveitamento? Ou não contrataria? Se contratasse pura e simplesmente, a 1ª ré não deve ser censurada em termos de culpa. Se o bom pai de família não contratasse ou só contratasse depois de esclarecer a contraparte e de obter a adesão desta, então a ré deve ser censurada “in causa” por a prestação se ter tornado impossível mais tarde como já era ponderável e devia ser ponderado no momento em que o dever de prestar foi criado.
  A 1ª ré invoca um acto de terceiro como causador da impossibilidade da prestação. Porém, para a 1ª ré ficar imune ao juízo de culpa “in causa” é necessário que o acto de terceiro, além de inevitável como o “facto do príncipe” e o caso de força maior, se apresentasse como imprevisível (como o caso fortuito) ou improvável a uma pessoa que, no momento da criação do dever de prestar, actuasse com a diligência média com que actuaria o “bonus pater familias”. Não releva, pois, para a questão da culpa da 1ª ré aqui em apreço, saber se a actuação da RAEM é ela própria ilícita e culposa ou contrária à lei e censurável, relevando apenas saber se é inevitável e imprevisível.
  Há que valorar a conduta da 1ª ré em termos de censura por observância ou inobservância voluntária e livre dos deveres de cuidado que se impunham a um bom pai de família medianamente previdente e diligente na situação em que a 1ª ré contratou com a 2ª ré e no momento em que contratou.
  Tal operação tem de ser feita sem nunca perder de vista que se presume a culpa da 1ª ré por ter ocorrido impossibilidade superveniente da prestação a seu cargo e que tal presunção impõe à 1ª ré o ónus de prova (e de alegação) de factos com eficácia desculpante (arts. 790º, nº 1 e 788º, nº 1 do CC).
  O “bom pai de família” comerciante/empresário.
  O grau de diligência devido que determinará se o grau de diligência observado pela 1ª ré é ou não susceptível de censura é aquele que observaria um bom pai de família nas circunstâncias em que a ré actuou.
  A 1ª ré é uma sociedade comercial, um agente económico que, num ambiente jurídico-comercial de incentivo à livre iniciativa com vista ao progresso económico e social se propõe desenvolver uma actividade económica lucrativa que pressupõe correr riscos comerciais os quais serão, afinal, a justificação jusfilosófica do lucro (ou uma das justificações possíveis).
  No caso dos autos, a 1ª ré quando contratou com a 2ª ré desenvolveu a sua actividade comercial propondo-se construir e vender um imóvel. Na ordem jurídica da RAEM não é, em abstracto, censurável pelo padrão do bom pai de família comerciante que a 1ª ré tenha arriscado construir e que, mediante um preço, se tenha obrigado a construir e a entregar à 2ª ré.
  Porém, a 1ª ré trouxe a 2ª ré (e ao concordar com a cessão da posição contratual trouxe também a 1ª autora) para a sua esfera de risco ou para a sua esfera de organização comercial onde se inseria a RAEM na qualidade de concessionária e de entidade administrativa competente em matéria urbanística e ambiental.
  Não parece haver dúvidas que o dever de cuidado que observaria um bom pai de família aumenta quando não arrisca sozinho mas insere na sua esfera de risco e de organização o credor sem que este tenha qualquer poder de controlar ou interferir nesse risco e nessa organização exclusivas do círculo de actividade comercial do devedor. Retenha-se que a 1ª ré se “queixa” que já antes de ter celebrado o contrato com a 2ª ré (cedente) a RAEM lhe vinha dificultando indevidamente a conclusão do empreendimento ao exigir alterações ao projecto de arquitectura e estudos de impacto ambiental, não se sabendo por que razão seria de esperar que a atitude da RAEM mudasse depois da celebração do contrato entre as rés.
  A censura do devedor pela impossibilidade da prestação fundada na aceitação imprudente do risco de obtenção/construção de coisa futura aumenta se o devedor “arrasta” o credor para esse risco em condições que o bonus pater familias não arrastaria.
  E aumenta ainda mais se o devedor não adverte o credor dos riscos organizacionais ou outros em que o insere, cabendo ao devedor demonstrar que advertiu se quiser ilidir a presunção de culpa que sobre si impende. Na verdade, “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé…” – art. 219º, nº 1 do CC.
  Mas vejamos mais de perto nos factos provados quais as circunstâncias em que a 1ª ré arriscou.
  O contrato foi celebrado com a 2ª ré em 11/4/2011 e a 1ª ré necessitava de um período de três a quatro anos para construir e entregar a fracção autónoma acordada. Na referida data era expectável que o prazo de aproveitamento terminaria em 28/02/2014 se não viesse mais tarde, como veio, a ser prorrogado. Não disporia, pois, a 1ª ré de três anos para construir desde a celebração do contrato até ao termo do prazo de aproveitamento não prorrogado ainda. Na data do contrato a 1ª ré não tinha ainda licença administrativa para iniciar as obras e estava advertida que só lhe seria emitida depois de apresentar relatórios de circulação de ar e de estudo de impacto ambiental que fossem aprovados. Na mesma data da celebração do contrato com a 2ª ré, a 1ª ré não tinha ainda apresentado o relatório de impacto ambiental para ser aprovado, só o tendo apresentado em 11 de Maio seguinte. Não se provaram factos onde se possa concluir que a 1ª ré tinha razões para confiar que o prazo de aproveitamento e o prazo de concessão seriam prorrogados nem que lhe seria atribuída nova concessão do mesmo terreno.
  Perante esta factualidade, um bom pai de família comerciante e empresário comercial empreendedor que estivesse determinado a prosseguir a sua actividade comercial contrataria com a 2ª ré sem a avisar das vicissitudes referidas? Relembre-se antes de responder que é à 1ª ré que cabe alegar e provar que esclareceu a 2ª ré (ou que isso era desnecessário por esta já estar esclarecido) antes de a inserir na sua esfera de organização e de risco empresarial e que cabe alegar e provar que tinha razões para confiar na extensão do prazo de aproveitamento ou da concessão.
  Afigura-se que, em face do elevado risco advindo da escassez de prazo para construir e da “lenta e exigente” relação com os serviços competentes da RAEM, um bom pai de família empresário, empreendedor, prudente e atento aos interesses legítimos dos demais agentes económicos não celebraria o contrato que a ré celebrou com a 2ª ré sem o conhecimento efectivo e a aceitação por parte desta do risco de impossibilidade da prestação que veio a concretizar-se.
  A contratação que a 1ª ré fez com a 2ª ré nestas circunstâncias de escassez de tempo e num contexto de anterior “relacionamento lento e exigente” com a RAEM configura em si mesmo uma violação do dever objectivo de cuidado por parte da 1ª ré que se projectou “in causa” naquilo que mais tarde viria a ser a causa efectiva da impossibilidade da prestação. Portanto, mesmo que a 1ª ré tenha sido diligente com vista a conseguir construir, não foi cuidadosa como seria no seu lugar um bom pai de família, mas foi temerária, ao inserir a 2ª ré (cedente) na sua esfera de risco, do risco de não conseguir construir atempadamente, risco que era claramente visível a um bom pai de família.
  A censura a dirigir à 1ª ré não deriva do facto de ter empreendido e corrido risco empresarial, mas deriva, pois, do facto de ter colocado a 2ª ré (cedente) no risco da própria 1ª ré quando esse risco já era antecipável a um bom pai de família medianamente previdente e quando este pai de família, caso pretendesse arriscar, arriscaria sozinho sem ampliar a sua esfera de risco a terceiros sem os esclarecer ou então esclareceria esse mesmo risco, o que se presume que a 1ª ré não fez.
  A censura que a ordem jurídica dirige à actuação da 1ª ré por ter ocorrido a impossibilidade da prestação é uma censura “in causa”.
  A 1ª ré contratou sem observar os cuidados que, no seu lugar, observaria o bom pai de família para evitar que ocorresse de surpresa para a outra parte contratante a impossibilidade da prestação que a própria 1ª ré criava por via contratual, pelo que não actuou com o cuidado objectivamente devido, sendo negligente a sua actuação, uma das formas de culpa cível em matéria de responsabilidade civil.
  À 1ª ré pode ser dirigido um juízo de censura em termos de culpa pela expansão temerária e unilateral da sua esfera de risco. Não é de risco que se trata, mas de culpa pela expansão do risco.
  Em termos puramente de risco que a 1ª ré não comunicou ao autor, se a 1ª ré tivesse conseguido construir receberia os lucros que houvesse sem ter de os repartir com a 2ª ré (cedente) nem com a 1ª autora (cessionária) e, como não conseguiu construir, recebe os prejuízos que haja, também sem ter de os repartir.
  A 1ª ré diz que tudo fez para conseguir construir e que, por isso, não merece censura por não ter conseguido construir atempadamente e assim evitar a caducidade da concessão que provocou, afinal, a sua impossibilidade jurídica de construir. Porém, não é na falta de esforço para construir que deve fundar-se o juízo de culpa quanto à impossibilidade da prestação. O juízo de culpa deve antecipar-se “in causa” e aí, conclui-se que a 1ª ré, sem esclarecer claramente a 2ª ré, nem deveria ter criado o dever de prestar e, assim, teria evitado a impossibilidade de o cumprir que veio a verificar-se, como era antecipável a quem actuasse com mediana prudência e cuidado para não causar danos a terceiros decorrentes da impossibilidade de cumprir a obrigação de construir e entregar fracções autónomas de prédio urbano.
  Em conclusão, a impossibilidade da prestação devida pela 1ª ré é imputável à devedora (1ª ré) a título de culpa (negligência ou inobservância do cuidado devido) porquanto essa impossibilidade era previsível a um comerciante medianamente prudente no momento em que o dever de prestar foi assumido pela 1ª ré e essa previsibilidade levaria aquele comerciante a não contratar como a 1ª ré contratou ou a fazê-lo apenas depois de obter a adesão da 2ª ré ao seu risco empresarial.
  …”。
從上述轉錄的內容可見,原審法院已詳細論證了第一被告的不履行責任,我們認同有關見解,故基於訴訟經濟原則及根據《民事訴訟法典》第631條第5款之規定,引用上述見解和依據,裁定這部分的上訴理由不成立。
事實上,本院在涉及“(Z)”事件的案件中已多次強調(見中級法院在卷宗編號1142/2019、1145/2019、1150/2019及1192/2019內作出的裁判),澳門特別行政區僅和土地承批人,即本案之第一被告,建立了法律關係;一切因應承批土地所作出的行為,均是針對土地承批人/第一被告而作出。因此,即使假設該等行為損害了土地承批人/第一被告的權益,例如無法如期利用土地而導致其需向預約買受人作出賠償,也只能是土地承批人/第一被告在履行其賠償義務後再向澳門特別行政區追討賠償,而非預約買受人可直接向澳門特別行政區追討因土地承批人/第一被告違反與其簽定的預約買賣合同的賠償責任。
只有在澳門特別行政區濫用權利,行為特別惡劣的情況下其才需負上相關賠償責任,然而本案並不存在該等情況。
4. 就賠償金額方面:
第一被告認為基於合同不履行非其責任,故只應按不當得利規則(《民法典》第784條第1款之規定)作出返還。
此外,亦認為即使假設其在相關的合同不履行存有過錯,雙倍的定金賠償是明顯過高,應根據衡平原則作出縮減。
我們在前述部分已認定第一被告需對合同的不履行負上責任,故不能適用《民法典》第784條第1款之規定,按不當得利規則作出返還。
就賠償金額方面,根據《民法典》第3條的規定,法院在下列任一情況下可按衡平原則處理案件:
a) 法律規定容許者;
b) 當事人有合意,且有關之法律關係非為不可處分者;
c) 當事人按適用於仲裁條款之規定,預先約定採用衡平原則者。
《民法典》第436條第5款明確容許經適當配合後適用第801條之規定,即容許法院當認為賠償金額過高時按衡平原則減少違約賠償金額。
為此,我們需考慮原告們的實際損失是多少,即其共付出了多少金錢以取得相關的合同地位來決定是否適用衡平原則作出縮減。
在本個案中,原告們向原預約買受人(D)支付了港幣2,356,000.00元(900,000+1,456,000)以取得相關的預約買受人合同地位。
倘按平均年利率3.5%計算8年(2012-2019年)的利息,可獲得港幣659,680.00元的利息,即共有港幣3,015,680.00元。
原告們可獲得雙倍定金的賠償是港幣2,292,000.00元(1,146,000 x 2),並不高於前述的金額。
由此可見,原審法院不以衡平原則對賠償金額作出縮減是正確的,應予以維持。
*
四. 決定
綜上所述,裁決第一被告的上訴不成立,維持原審法院的決定。
*
訴訟費用由第一被告支付。
作出適當通知。
2024年05月30日

裁判書製作人
何偉寧

第一助審法官
唐曉峰

第二助審法官
李宏信




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220/2024