Situação Geral dos Tribunais

Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário 2020/2021

Realizou-se a Sessão Solene de Abertura do Ano Judiciário de 2020/2021, no passado dia 14 de Outubro, pelas 16h30, no Grande Auditório do Centro Cultural de Macau. O Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, presidiu à Sessão que contou com a presença na tribuna de honra dos Presidente da Assembleia Legislativa, Kou Hoi In, Presidente do Tribunal de Última Instância, Sam Hou Fai, Secretário para a Administração e Justiça, Cheong Weng Chon, Procurador, Ip Son Sang, Presidente da Comissão Independente para a Indigitação de Juízes, Lau Cheok Va, e Presidente da Direcção da Associação dos Advogados de Macau, Jorge Neto Valente.

Também estiveram presentes na sessão solene mais de duzentos convidados, nomeadamente os Subdirectores do Gabinete de Ligação do Governo Popular Central na Região Administrativa Especial de Macau, Yao Jian, Luo Yonggang e Yan Zhichan, o Comissário em exercício do Comissariado do Ministério dos Negócios Estrangeiros na Região Administrativa Especial de Macau, Yuan Hengge, os titulares dos principais cargos da R.A.E.M., os membros do Conselho Executivo, os membros da Comissão Independente para a Indigitação de Juízes, os membros do Conselho dos Magistrados Judiciais, os membros do Conselho dos Magistrados do Ministério Público, os deputados à Assembleia Legislativa, os chefes e os assessores do Gabinete do Chefe do Executivo e dos Gabinetes dos titulares dos principais cargos, os directores dos serviços públicos e os advogados.

Na cerimónia, fizeram uso da palavra o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, o Presidente do Tribunal de Última Instância, Sam Hou Fai, o Procurador, Ip Son Sang, e o Presidente da Direcção da Associação dos Advogados de Macau, Jorge Neto Valente.

No seu discurso, o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, referiu que, o Estado de Direito é um dos princípios basilares da R.A.E.M. O Governo da R.A.E.M. continuará, como sempre, a persistir com firmeza na defesa da independência e imparcialidade judiciais, e a colaborar activamente com os órgãos judiciais, executando cabalmente as suas decisões. Continuará a optimizar o mecanismo de formação judiciária e, paralelamente, a reforçar as instalações e equipamentos, os recursos humanos e os meios e instrumentos do sistema judicial.

Os órgãos judiciais têm exercido o poder judicial com independência, em estrita conformidade com a Lei Básica, contribuindo de forma ímpar para o desenvolvimento próspero e estável de Macau. Perspectivando o futuro, o Governo da R.A.E.M. está confiante que, com o esforço conjunto dos sectores judiciário e da advocacia, continuará a ser proporcionado à população de Macau um ambiente de qualidade, assente no Estado de Direito, em prol do seu bem-estar e da continuidade da implementação estável e duradoura do princípio “um País, dois sistemas”.

O Presidente do Tribunal de Última Instância, Sam Hou Fai, manifestou no seu discurso que, no ano judiciário que findou, deram entrada nos tribunais das três instâncias um total de 20.000 processos, foram concluídos 20.078 processos e permanecem pendentes 13.156 processos. O Dr. Sam Hou Fai referenciou ainda os seguintes assuntos: Primeiro, o impacto trazido pela pandemia de COVID-19 aos trabalhos de julgamento de casos exercidos pelos tribunais, as alterações no que respeita ao tipo e modo de prática de crimes, e, durante o período da pandemia, a fim de dar apoio aos trabalhos de combate à pandemia adoptados e realizados pelo Governo da R.A.E.M., o Tribunal Judicial de Base admitiu e julgou, com adequada celeridade, vários processos relacionados com a pandemia. Segundo, evidenciaram-se, preliminarmente, os efeitos da ampliação da competência do Tribunal de Última Instância, introduzida aquando da revisão efectuada à Lei de Bases da Organização Judiciária. No ano judiciário que findou, registou-se um acréscimo nos recursos em processo civil e nos recursos jurisdicionais entrados no TUI. Terceiro, continua elevado o número de processos atinentes a litígios de terreno. No entanto, é de prever que, à medida que forem extintos os processos já entrados, o número de processos referentes a litígios de terreno diminuirá gradualmente.

O Dr. Sam Hou Fai acrescentou: Este ano comemora-se o 21º aniversário do Retorno de Macau à Pátria, e a implementação da política de “um País, dois sistemas” em Macau entrou numa fase intercalar. Cumpre-nos não só reflectir sobre as experiências bem-sucedidas e as deficiências verificadas na aplicação da política de “um País, dois sistemas” em Macau, como também analisar e estudar atentamente os desafios e problemas enfrentados durante a aplicação do sistema jurídico de Macau que, por motivos históricos, se inspirou no sistema de Portugal. Vejamos, a título de exemplo, o regime de impedimentos que vigora no âmbito do Direito Público. Trata-se de um regime específico estabelecido com vista a assegurar a imparcialidade e a justiça, além de evitar o tráfico de influências. À luz da legislação ora vigente em Macau, seja o poder executivo, seja o legislativo ou o judiciário, sujeita-se, no seu funcionamento, ao regime de impedimentos. Apesar de algumas diferenças normativas concretas existentes no que se refere aos diferentes poderes, a verdade é que se exige sempre que os trabalhadores da Função Pública, no exercício do poder público, se declarem impedidos quando se relacionarem, de certo modo, com o assunto a tratar ou com os interessados. Este regime, a vigorar numa jurisdição de grande dimensão, teria, provavelmente, influência limitada sobre o funcionamento dos órgãos de poder e menor possibilidade de ser infringido, dada a sua grande dimensão territorial e populacional. Mas já levanta problemas sérios e notórios numa sociedade pequena como a nossa, onde a grande maioria da população, sendo de etnia chinesa, em que valoriza muito o relacionamento interpessoal, muitas vezes assente numa comunidade associativa onde os habitantes em geral têm relações próximas e interesses cruzados. Numa sociedade como a de Macau, em que se verificam as características e o ambiente acima referenciados, para salvaguardar a imparcialidade e a justiça, o cumprimento da lei tem que ser rigoroso, mostrando-se de se exigir critérios mais elevados. Só assim é que os nossos órgãos administrativos, legislativos e judiciais podem conquistar a confiança do povo, ganhar a dignidade e o respeito que lhes são devidos, e que o interesse público e a justiça podem ser efectivamente salvaguardados e realizados. O Dr. Sam Hou Fai fez um apelo a todos os magistrados, especialmente àqueles mais novos que há pouco tempo iniciaram a sua carreira na magistratura, de que devemos gerir com ponderação a relação entre o relacionamento interpessoal e a justiça, partindo de nós próprios, dos nossos familiares, amigos e colegas, mantendo adequada distância com a sociedade, de modo a evitar que possamos ser implicados ou aproveitados, ou que a nossa imparcialidade possa ser alvo de suspeita.

O Dr. Sam Hou Fai salientou no seu discurso que o mundo de hoje está a passar por mudanças profundas nunca vistas no último século. Do mesmo passo, temos vindo a assistir na Região vizinha a um incessante crescendo de distúrbios, num sério desafio e ameaça à implementação do princípio “um País, dois sistemas”. Necessitamos fazer uma boa síntese das práticas e experiências acumuladas pelos tribunais das três instâncias ao longo dos 21 anos desde a implementação da Lei Básica de Macau, de interpretar as suas normas, dentro do âmbito delimitado pela mesma, no julgamento dos processos judiciais, sempre no cumprimento rigoroso da responsabilidade constitucional imposta pela Lei Básica. E a nós, enquanto magistrados, compete compreender com exactidão o papel e as funções desempenhadas pelos órgãos judiciais no enquadramento do sistema político de Macau, dominar com precisão a conotação do princípio “um País, dois sistemas”, para assim não só salvaguardar a legalidade e a ordem da R.A.E.M., defender os direitos e liberdades dos cidadãos, assim como os legítimos interesses públicos e privados, como ainda tornarmo-nos numa força firme na defesa da ordem constitucional consagrada pela Constituição da República Popular da China e pela Lei Básica de Macau.

De acordo com o Dr. Sam Hou Fai, há duas questões que merecem a nossa atenção: A primeira é a de substituição dos juízes da geração mais velha pela mais nova. Está prestes a chegar a altura da substituição dos juízes da geração mais velha pela mais nova. Por essa razão, o reforço na formação dos juízes e na elevação da qualidade profissional dos novos juízes configura-se como um problema que merece a nossa atenção. A segunda é a de acesso ao grau superior e de formação dos funcionários de justiça. Apela-se ao Governo para proceder a alterações adequadas ao regime de recrutamento, selecção e formação dos funcionários de justiça, para resolver os problemas com que se confrontaram os órgãos judiciais no que respeita ao acesso ao grau superior e à formação dos funcionários de justiça.

O Dr. Sam Hou Fai fez um balanço dos honorários adiantados pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância aos defensores dos arguidos, após a entrada em vigor da nova redacção do art.º 76º do Regime das Custas nos Tribunais dada pela Lei de Bases da Organização Judiciária, bem como expressou os seus agradecimentos ao Exmo. Senhor Chefe do Executivo e ao Governo da R.A.E.M. pela atenção e suporte que foram dados no que se refere ao aperfeiçoamento das condições de funcionamento dos tribunais.

No seu discurso, o Procurador, Ip Son Sang assinalou que, no ano judiciário 2019/2020, foram autuados 12.109 inquéritos, o que representa uma diminuição de cerca de 18%, comparando com os 14.714 inquéritos autuados no ano judiciário anterior; dos 14.451 inquéritos concluídos, foram deduzidas 3.869 acusações e proferidos 10.308 despachos de arquivamento, após a investigação; e foram interpostos 53 recursos em matéria penal e apresentadas 429 respostas a recursos penais. No âmbito da promoção de processos em matéria civil e laboral, no passado ano judiciário foram tramitados 567 processos laborais, o que representa uma diminuição de cerca de 11%, face aos 640 do ano judiciário anterior, bem como 55 processos relativos à averiguação oficiosa da maternidade ou da paternidade; foram instaurados 707 processos civis e laborais e 1.134 processos internos pré-processuais, tendo sido concluídos 1.312 processos desta natureza. Foram registados 103 processos novos no Serviço do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo, dos quais existem 6 acções de indemnização intentadas na sequência de declaração de caducidade de concessões de terrenos pelo Governo da R.A.E.M.; o Serviço do Ministério Público junto dos Tribunais de Segunda e Última Instâncias interveio em 1.319 processos do Tribunal de Segunda Instância, 38 dos quais relacionados com os terrenos, e em 168 processos do Tribunal de Última Instância, 27 dos quais relacionados com os terrenos.

O Dr. Ip Son Sang fez uma apresentação da prática judicial desenvolvida pelo Ministério Público que merece ser realçada: Primeiro, combate à ofensa sexual de menores e protecção dos seus direitos e interesses legítimos. Propõe-se que seja reforçada a acção conjunta entre as partes, tais como a família, a escola, as instituições de assistência social e a polícia, procurando elevar a consciência social da protecção de menores e estabelecer uma rede preventiva para que os menores não se tornem em ofendidos, bem como introduzir aos menores a consciência e medidas de auto-protecção na vida quotidiana, de modo a construir, em conjunto, um ambiente seguro de crescimento saudável para os menores. Segundo, atenção e combate contínuo ao crime de violência doméstica. O Ministério Público tem mantido cooperação estreita com os diversos serviços competentes e associações em causa, com o objectivo de prevenir e reprimir a violência doméstica por meios jurídicos, proporcionando assim protecção legal para famílias e ambiente social com harmonia. Terceiro, participação integral no trabalho relativo ao combate do branqueamento de capitais e financiamento ao terrorismo. Espera-se que, com os esforços conjuntos prestados pelos serviços administrativos competentes da R.A.E.M. e pelo Ministério Público, se eleve a capacidade de inspecção antecedente e investigação na área de combate ao branqueamento de capitais, e prevenir e reprimir conjuntamente as respectivas actividades ilícitas, no sentido de assegurar verdadeiramente a segurança e estabilidade do regime financeiro da R.A.E.M.

O Presidente da Associação dos Advogados, Jorge Neto Valente, expressou, no seu discurso, que, este ano, devido ao impacto causado pela pandemia, a actividade profissional dos Advogados tem-se ressentido, com forte quebra do movimento dos escritórios. Dos quais, os Notários Privados foram os mais afectados.

Ademais, o Dr. Jorge Neto Valente mostrou ainda atenção e apresentou suas opiniões e sugestões quanto às questões relativas à eficiência, qualidade e reforma judiciais, à governança electrónica, à eficiência administrativa e à implementação da Lei da Arbitragem.