Situação Geral dos Tribunais

Arguido viu a sua responsabilidade excluída por se ter identificado como não sendo o verdadeiro infractor

        O Ministério Público, junto do Tribunal Judicial de Base, acusou o arguido A pela prática de uma contravenção p. e p. pela Lei do Trânsito Rodoviário (por condução com excesso de velocidade). O Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base decidiu o seguinte: condenou o arguido A pela prática de uma contravenção p. e p. pelos art.ºs 31.º, n.º 1 e 98.º, n.º 2 da Lei do Trânsito Rodoviário, na pena de multa de MOP$3.000,00 e na pena acessória de inibição de condução por 7 meses. Inconformado com a sentença, o arguido veio dela recorrer para o Tribunal de Segunda Instância.

        Realizada a audiência de julgamento, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância apurou os factos seguintes: em 10 de Junho de 2010, pelas 17h25, um automóvel ligeiro circulava numa rua da Taipa à velocidade de 95km/h, acima do limite previsto na Lei do Trânsito Rodoviário. Na altura da ocorrência dos factos, o proprietário desse veículo era o recorrente, ou seja, o arguido A. Mas este, nessa altura, vendeu o veículo ao seu empregado XXX, que, por sua vez, emprestou o mesmo ao seu amigo XXX, isto é, autor da infracção de trânsito ora em causa. O Tribunal a quo, com base no facto de o recorrente não se ter deslocado ao Departamento de Trânsito do Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) para identificar o verdadeiro autor da aludida infracção, nos termos dos art.ºs 132.º e 136.º da Lei do Trânsito Rodoviário, considerou o recorrente como responsável pela contravenção em questão, tendo-o punido da forma supramencionada.

        Entendeu o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância: ao abrigo do disposto no art.º 132.º da Lei do Trânsito Rodoviário, tendo ocorrido a contravenção, quando o agente de autoridade não puder identificar o autor da contravenção, deve ser notificado o proprietário, o adquirente com reserva de propriedade, o usufrutuário ou aquele que, a qualquer título, tenha a posse efectiva do veículo para, no prazo de 15 dias, proceder a essa identificação ou efectuar o pagamento voluntário da multa. O notificado que, no prazo indicado, não proceder à identificação nem provar a utilização abusiva do veículo “é considerado responsável pela contravenção”. Contudo, “com a disposição supracitada, o legislador presume responsável pela contravenção o proprietário do veículo. Trata-se aqui duma presunção legal, que é ilidível, uma vez que o proprietário verá a sua responsabilidade excluída sempre que conseguir provar não ser o autor da infracção às regras de trânsito”. Por esse motivo, o Tribunal a quo, ao não deixar de punir o recorrente ainda que tenha dado como provado que foi outra pessoa que conduziu com excesso de velocidade, de facto, menosprezou o direito processual do recorrente e violou o princípio da culpa, que constitui um princípio fundamental do direito penal. Nestes termos, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância julgou procedente o recurso interposto pelo arguido A, declarando nula a sentença recorrida e absolvendo o recorrente da contravenção imputada. Ao mesmo tempo, ordenou que se notificasse o CPSP para decidir se ia responsabilizar o verdadeiro infractor apurado.

        Cfr. o acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 131/2011.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

11/02/2014