Situação Geral dos Tribunais

Declarou-se resolvido o contrato por incumprimento da promessa pelos vendedores, os quais se condenaram a pagar o dobro do sinal ao comprador que perdeu o interesse na aquisição

        Em 28 de Março de 2007, A celebrou com um casal, B e C, um contrato-promessa, nos termos do qual aquele prometeu comprar, e estes prometeram vender, livre de quaisquer ónus ou encargos e devoluta, uma fracção autónoma de um edifício situado na Rua de Nam Keng, pelo preço de HKD$2.850.000,00. Na altura, A pagou a B e C um total de HKD$570.000,00, a título de sinal, tendo prometido ao mesmo tempo que o remanescente em dívida, no montante de HKD$2,280,000.00, seria pago na data de celebração da escritura pública de compra e venda. Tendo marcado junto de um escritório de advogados a data para a celebração da escritura pública de compra e venda, B e C comunicaram a A que a escritura pública iria ser outorgada a 28 de Maio de 2007. Todavia, A ficou a saber que, sobre a fracção autónoma que prometeu adquirir, pendia junto do Tribunal Judicial de Base uma acção de execução específica de contrato-promessa intentada contra B e C por um terceiro, pelo que, no dia 28 de Maio, ele não compareceu ao escritório de advogados acima aludido. Mais tarde, B e C voltaram a pedir a A para vir outorgar a escritura pública ao escritório no dia 20 de Junho de 2007, mas A, desta vez, também não compareceu.

        A intentou uma acção de condenação com processo ordinário contra B e C, pedindo ao Tribunal Judicial de Base que declarasse que os Réus, por causa que lhes era imputável, tinham faltado ao cumprimento da sua obrigação, que declarasse resolvido o contrato-promessa, com fundamento no incumprimento definitivo e culposo por parte dos Réus, e que condenasse estes ao pagamento do sinal em dobro, acrescido de juros de mora.Contestaram os Réus, deduzindo reconvenção, pedindo a sua absolvição dos pedidos formulados pelo Autor e a condenação do Autor ao pagamento do montante de MOP$4.316,00, dispendido com a marcação da escritura pública de compra e venda, declarando-se ainda a perda do sinal por este prestado, por seu incumprimento contratual.

        Por sentença de 5 de Novembro de 2009, o Tribunal Judicial de Base julgou procedente a acção intentada pelo Autor, declarou resolvido o respectivo contrato-promessa, condenou os Réus a pagar ao Autor a quantia total de HKD$1,140,000.00, correspondente ao sinal já pago, em dobro, e, por fim, absolveu o Autor do pedido convencional deduzido pelos Réus. De tal decisão, os Réus recorreram para o Tribunal de Segunda Instância, que negou provimento ao seu recurso.

        Ainda inconformados, os Réus interpuseram recurso para o Tribunal de Última Instância, alegando que o acórdão recorrido tinha incorrido nos vícios de erro de julgamento e de violação da lei, sendo ainda nulo por violação do art.º 571.º n.º 1, al.s b), c) e d) do Código de Processo Civil de Macau.

        Após o julgamento, o Tribunal de Última Instância entendeu o seguinte: A questão-chave neste caso concreto consiste em apurar se háperda do interesse na aquisição do referido bem imóvel por parte do credor, isto é, o promitente-comprador. Dado que, na celebração do contrato-promessa de compra e venda, os promitentes-vendedores se comprometeram a assegurar que a fracção autónoma em causa era vendida livre de quaisquer ónus e encargos, mas que até à data marcada para a outorga da escritura pública de compra e venda, ainda pendia uma acção de execução específica de contrato-promessa de compra e venda dessa mesma fracção autónoma, proposta contra os Réus por um terceiro promitente-comprador, os Réus, na realidade, não cumpriram a sua promessa, o que os fez constituir em mora. Numa perspectiva objectiva, um homem qualquer medianamente considerado em termos de inteligência, sensatez e diligência, colocado na posição do Autor, não teria mais interesse na outorga da escritura pública de compra e venda da fracção autónoma em causa, sob pena de correr o risco de, mesmo se pagando o remanescente do preço no montante de HKD$2,280,000.00, a sua pretensão de comprar o imóvel cair no insucesso, sendo evidente ninguém querer correr tal risco, pelo que é forçoso concluir que se verifica a perda do interesse objectiva na aquisição do imóvel por parte do Autor. Ao abrigo do disposto no art.º 797.º, n.º 1, al. a) do Código Civil, considera-se para os efeitos constantes do art.º 790.º como não cumprida a obrigação.

        Pelo facto de o não cumprimento da obrigação se dever a causa imputável aos Réus, há que reconhecer ao Autor o direito de resolver o contrato-promessa vertido nos autos e exigir o dobro do sinal já pago - art.º 436.º, n.º 2 do Código Civil.

        Pelas razões acima expostas, o Tribunal de Última Instância negou provimento ao recurso.

        Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância, processo n.º 9/2013.

 

 Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

14/05/2014