Situação Geral dos Tribunais

Funcionário sancionado com pena de suspensão de funções por seis meses devido à viciação de documento constante do seu processo individual viu o seu recurso ser julgado improcedente pelo TUI

      O Director dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes proferiu despacho em 26 de Maio de 2010 que mandou abrir um processo de averiguações contra Teng XX, técnico superior assessor do quadro da Direcção dos Serviços de Solos, Obras Públicas e Transportes (DSSOPT), por suspeitar o mesmo da viciação não autorizada de documento constante do seu processo individual.

      Após averiguações, ficou apurado que, no dia 14 de Maio de 2010, Teng XX, na consulta do seu processo individual, precedida da autorização da Chefe da Divisão Administrativa da DSSOPT, acrescentou, por si próprio, a uma declaração de não desejar proceder a descontos para efeitos de aposentação e sobrevivência por ele subscrita em 28 de Setembro de 1992, debaixo da assinatura, uma frase manuscrita “Nota: Fui cancelado esta declaração em 30 de Setembro de 1992.”

      Em 19 de Janeiro de 2012, o Senhor Secretário para os Transportes e Obras Públicas proferiu despacho no processo disciplinar instaurado contra Teng XX, ordenando que lhe fosse aplicada a pena de suspensão de funções por 6 meses.

     Discordando de tal decisão, Teng XX interpôs recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância, tendo, porém, este Tribunal negado provimento ao seu recurso contencioso.

      Teng XX, ainda inconformado, veio interpor recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância, invocando a seu favor os fundamentos a seguir indicados: 1) Não se exclui a hipótese de um terceiro, seu inimigo, fazer intencionalmente a declaração falsa no intuito de o prejudicar, ou a sua doença causar psicose que lhe fez ter ilações e o levou a praticar o acto, sem que ele tenha conseguido ter auto-controlo. A instrutora não tentou com todos os esforços investigar o caso, verificando-se, portanto, a deficiência de diligências para a descoberta da verdade, que alegadamente constitui a nulidade insanável prevista no art.º 298.º n.º 1 do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau (ETAPM). 2) Não havendo ainda sentença transitada em julgado no processo penal instaurado pelo Ministério Público contra Teng XX pela suspeita da prática do crime de falsificação de documentos, a entidade recorrida, ao aplicar a Teng XX uma pena disciplinar à luz do disposto na al. o) do n.º 2 do art.º 315.º do ETAPM, incorreu em erro na aplicação do pressuposto legal. 3) Não foram ponderadas pela entidade recorrida todas as circunstâncias que militam a favor de Teng XX, nomeadamente a doença mental por ele sofrida desde há muito tempo, o tempo de serviço com mais de 20 anos com bom comportamento, sem ter cometido nenhum erro e o facto de a sua conduta não ter afectado o serviço nem terceiro, daí a violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da igualdade.

      O Colectivo do Tribunal de Última Instância procedeu ao julgamento do caso. Desde logo, em relação ao primeiro fundamento supracitado, referiu o Tribunal Colectivo que o estado mental do recorrente não é susceptível de abalar a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal de Segunda Instância. Além disso, em consequência da junção dum relatório médico sobre o estado de saúde de Teng XX apresentado por este, a instrutora do processo disciplinar chegou efectivamente a solicitar informações ao médico do Centro Hospitalar Conde de S. Januário com vista a apurar se Teng XX se encontrava em devidas condições psíquicas na prática dos factos que lhe foram imputados, solicitação esta que não foi satisfeita porque não havia autorização de próprio Teng XX. Acresce que face ao comportamento e à reacção do recorrente revelados no processo disciplinar, tais como a apresentação dos documentos e das testemunhas e a constituição do advogado para interpor recurso contencioso, não se pode aceitar a tese do recorrente quanto à gravidade da sua doença, que alegadamente lhe faz incapaz de agir com autonomia e com auto-controlo. Assim sendo, improcede este fundamento.

      No concernente ao segundo fundamento, indicou o Tribunal Colectivo que, a al. o) do n.º 2 do art.º 315.º do ETAPM fala nas duas situações: uma reporta-se aos arguidos que “forem condenados, por sentença transitada em julgado em que seja decretada pena de demissão”, enquanto outra diz respeito aos que, “por qualquer forma, revelem indignidade ou falta de idoneidade moral para o exercício das funções”. No caso vertente, independentemente de ter ou não Teng XX sido condenado por sentença transitada em julgado, não se pode ignorar que a sua conduta, de fazer constar falsamente um facto juridicamente relevante num documento arquivado no seu processo individual, revela sem dúvida a indignidade ou falta de idoneidade moral para o exercício das funções, o que legitima a aplicação das penas de demissão ou de aposentação compulsiva. Improcede também esta argumentação do recorrente.

      Quanto à alegada violação dos princípios da proporcionalidade, da justiça e da igualdade, na opinião do Tribunal Colectivo, a aplicação, graduação e escolha da medida concreta da pena disciplinar cabem na discricionariedade da Administração, judicialmente sindicável apenas nos casos em que há erro manifesto ou a total desrazoabilidade no exercício de poderes discricionários. No caso dos autos, não obstante a aplicabilidade da pena de aposentação compulsiva, foi finalmente aplicada a Teng XX a pena de suspensão de funções por 6 meses, precisamente tendo em consideração as circunstâncias atenuantes. Assim sendo, não pode proceder também este fundamento invocado.

      Nos termos acima expostos, acordaram no Tribunal de Última Instância em negar provimento ao recurso jurisdicional.

      Cfr. Acórdão do TUI, processo n.º 20/2014.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

26/01/2015