Situação Geral dos Tribunais

Pedido de indemnização civil do caso de afogamento ocorrido na Piscina do Carmo foi decidido hoje em última instância

    Em 26 de Junho de 2006 pelas 16h00, Ho, do sexo feminino e de 26 anos de idade, afogou-se infelizmente quando estava a nadar na piscina exterior da Piscina do Carmo da Taipa. Na altura, Mok, nadador-salvador de serviço que se encontrava na piscina exterior para prestar serviços de salvamento, não viu nada de anormal mas sim foi outro nadador que passou por ali que descobriu que alguém se afogou e lhe chamou em voz alta, e naquele momento Mok só tomou conhecimento do assunto. Com o auxílio prestado pelo nadador e um outro nadador-salvador, Ho foi retirada da água e foi encaminhada a hospital, porém, em 29 de Junho de 2006, às 16H05, foi confirmado óbito da mesma.

      O Ministério Público acusou Mok, nadador-salvador de serviço na ocorrência do facto, da prática do crime de homicídio por negligência enquanto os pais da falecida deduziram pedido de indemnização civil contra Mok, Wong, concessionário de serviços de salvamento da piscina e a Região Administrativa Especial de Macau, proprietária da Piscina do Carmo da Taipa.

      Em 2010, em sede de primeira instância, o Tribunal Colectivo do Tribunal Judicial de Base julgou improcedente a acusação do crime de homicídio por negligência deduzida contra o nadador-salvador Mok e absolveu-o na totalidade do pedido de indemnização civil deduzido pelos pais da falecida e condenou, solidariamente, Wong e a Região Administrativa Especial de Macau, a pagarem aos pais da falecida a quantia de MOP$2.280.000,00, a título de alimentos, a quantia de MOP$119.953,00, a título de despesas de funeral, médicas e hospitalares da falecida, a quantia de MOP$800.000,00, a título de indemnização por perda do direito à vida da falecida e a quantia de MOP$300.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, pelas dores sofridas pela falecida antes da morte e pelos danos dos pais da falecida resultantes da morte da sua filha (MOP$100.000,00 a cada um), perfazendo um total de MOP$3.499.953,00.

      Inconformados com o assim decidido, Wong, concessionário de serviços de salvamento da Piscina do Carmo, a RAEM e os pais da falecida interpuseram recurso para o Tribunal de Segunda Instância.

      Em 11 de Setembro de 2014, o Tribunal de Segunda Instância decidiu, em sede de segunda instância, excluir a RAEM, proprietária da piscina, da indemnização, confirmando a responsabilidade pelo risco de Wong a título de comitente, anulando o acórdão a quo na parte referente à indemnização a título de alimentos, aumentando os valores da indemnização por danos não patrimoniais da própria falecida e dos pais da falecida para MOP$200.000,00, a cada um, e mantendo as restantes partes do acórdão a quo.

      Ainda inconformados, vieram Wong e os pais da falecida recorrer para o Tribunal de Última Instância. Wong entendeu que não deveria ele responder a título de comitente e, por sua vez, os pais da falecida alegaram que eles deveriam ter direito aos salários que a falecida auferiria durante a sua vida e demandaram o aumento do valor da indemnização por perda do direito à vida e dos valores da indemnização por danos não patrimoniais da própria falecida e dos seus pais.

      Conhecendo do processo, o Tribunal de Última Instância entendeu que in casu, o nadador-salvador Mok praticou um facto ilícito e culposo: facto ilícito porque foi ele contra a vida da vítima, o direito de personalidade mais importante, suprimindo-o; facto culposo porque, sendo um nadador-salvador contratado para observar as situações da piscina, ele tem obrigação de ter atenção aos movimentos dos banhistas na piscina e só assim lhe permite detectar situações anómalas ocorridas na piscina. No caso sub judice, o afogamento da vítima durou 5 minutos, sem que Mok tenha visto nada de anormal, a sua conduta integra a negligência inconsciente prevista na alínea b) do artigo 14.º do Código Penal, pelo que, sendo o patrão do nadador-salvador Mok, Wong, concessionário de serviços de salvamento da piscina, deve responder a título de comitente nos termos do artigo 493.º do Código Civil.

      Em relação às indemnizações por danos, o Tribunal Colectivo entendeu que a decisão do Tribunal de Primeira Instância violou o princípio dispositivo ao condenar no pagamento de alimentos, pois os pais da falecida demandaram o pagamento dos salários e outros abonos complementares que a vítima receberia durante 38 anos, mas, o Tribunal de Primeira Instância condenou o pagamento de alimentos, não havendo, porém, nenhuma relação entre uma e outra prestação. Mais ainda que in casu não só não se provou que a vítima prestasse alimentos aos pais, como não se demonstra que estes necessitassem de alimentos da filha, pelo que, os pais da falecida não têm direito a receber indemnização a título de substituição de alimentos. O Tribunal Colectivo mais entendeu que os pais da falecida também não têm direito aos salários que a falecida poderia auferir se continuasse viva, porque só a vítima viva pode ser sujeita de tal direito pois a personalidade jurídica cessa com a morte, e ainda, nenhuma norma ou princípio jurídico atribui a terceiros os vencimentos que a vítima viria presumivelmente a auferir na sua vida activa se fosse viva, razões pelas quais o Tribunal Colectivo manteve o acórdão do Tribunal de Segunda Instância na parte referente a esta questão.

      No que toca aos valores da indemnização por danos não patrimoniais, o Tribunal Colectivo entendeu que atenda a idade da vítima, os critérios legais e casos paralelos, é o mais adequado fixar a quantia de MOP$1.000.000,00 a título de indemnização por perda do direito à vida da falecida. Quanto às indemnizações por danos, pelas dores sofridas pela falecida antes da morte e pelos danos sofridos pelos pais da falecida resultantes da morte da filha, o Tribunal Colectivo entendeu que os valores fixados pelo Tribunal de Segunda Instância não se mostram irrazoáveis, pelo que, decidiu manter os mesmos.

      Pelas razões acima apontadas, o Tribunal de Última Instância negou provimento ao recurso interposto por Wong e concedeu provimento parcial ao recurso interposto pelos pais da falecida, condenando Wong a pagar MOP$1.000.000,00 pela perda do direito à vida da falecida, no mais mantendo o acórdão proferido pelo Tribunal de Segunda Instância.

      Cfr. Acórdão do Tribunal de Última Instância, processo n.º 122/2014.

 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

28/01/2015