Situação Geral dos Tribunais

O tempo da posse do título de permanência temporária não deve ser considerado como tempo de residência em Macau

       O recorrente, sendo natural da China, em data não determinada, mas sempre anterior a 26 de Abril de 1982, entrou ilegalmente em Macau. Em 10 de Abril de 1982, no âmbito de operação do registo dos trabalhadores indocumentados, foi-lhe emitido o Título de Permanência Temporária. Em 4 de Outubro de 1984, foi-lhe emitida pela PSP a Cédula de Identificação Policial, com o prazo de validade até 4 de Outubro de 1989. Em 20 de Novembro de 1987, foi o recorrente entregue pelas autoridades policiais às autoridades chinesas e, após prisão preventiva, cumpriu pena de prisão no Interior da China até 25 de Setembro de 2008. Em 8 de Outubro de 2008, o recorrente pediu ao SIM que lhe fosse emitido o Certificado de Confirmação do Direito de Residência.

       Por despacho do Director dos SIM de 19 de Março de 2013, foi indeferido tal requerimento. Inconformado, o recorrente recorreu hierarquicamente do indeferimento para a Secretária para a Administração e Justiça que, por despacho de 28 de Maio de 2013, manteve a decisão recorrida. O recorrente interpôs recurso contencioso de anulação para o Tribunal de Segunda Instância. Em 26 de Junho de 2014, o Tribunal de Segunda Instância negou provimento ao recurso.

       Inconformado, o recorrente interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Última Instância, considerando que: o tempo durante o qual o recorrente foi titular de título de permanência temporária deve ser considerado como tempo de residência em Macau, visto ter-lhe sido emitida, em 4 de Outubro de 1984, cédula de identificação policial, com o prazo de validade até 4 de Outubro de 1989. O recorrente residiu habitualmente em Macau por sete anos consecutivos, antes do estabelecimento da RAEM, portanto, o acórdão recorrido, ao assim não entender, violou o disposto no artigo 1.º, n.º 1, alínea 2) e 2.º, n.º 2, da Lei n.º 8/1999. A par disso, o acórdão recorrido violou princípios de direito internacional.

       No entendimento do Tribunal Colectivo do Tribunal de Última Instância, foram títulos de identificação que foram entregues aos indivíduos que estavam ilegalmente em Macau, isto é, indocumentados vindos do Interior da China, aquando de duas operações de legalização de imigrantes ilegais, ocorridas em 1982 e 1990. Tais títulos habilitavam os seus titulares a trabalhar em Macau, mas não lhes reconhecia qualidade de residentes de Macau. Assim sendo, não se vislumbra fundamento para a tese do recorrente. Na verdade, em 20 de Novembro de 1987, foi o recorrente entregue pelas autoridades policiais às autoridades chinesas e, após prisão preventiva, cumpriu pena de prisão no Interior da China até 25 de Setembro de 2008. Assim, o recorrente residiu habitual e legalmente em Macau desde 4 de Outubro de 1984 até 20 de Novembro de 1987, o que é insuficiente para perfazer o tempo de 7 anos previsto na lei, para obter o estatuto de residente permanente.

       A tese do recorrente é a de que, mesmo estando preso no Interior da China se deve considerar tal tempo como residindo em Macau, além do mais, porque considera ilegal a sua entrega à China.

       Entendeu o Tribunal Colectivo do Tribunal de Última Instância que essa não era a melhor interpretação da lei. O recorrente desde que ficou preso no Interior da China, deixou de residir habitualmente em Macau, embora tivesse o direito de aqui residir. A eventual ilegalidade da sua entrega às autoridades da China – que não cabe apreciar até porque não fundamentada pelo recorrente - não altera os dados do problema. Não modifica a sua residência. Nem os requisitos para se tornar residente de Macau. A lei exige a residência habitual em Macau durante 7 anos consecutivos. E não o direito de residência em Macau durante 7 anos consecutivos. Aquela eventual ilegalidade pode fundamentar, quanto muito, reparação por danos causados pela perda de chance de obter o estatuto de residente permanente da RAEM, questão que não cumpre apreciar. Restaria saber a quem pedir tal reparação, dado que os factos que a motivaram foram praticados por órgãos de pessoa colectiva – Território de Macau – que já não existe.

       Perante a questão de violação dos princípios de direito internacional, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Última Instância considerou que não tinha cabimento a invocação de violação de princípios de direito internacional, com base no direito de todo o indivíduo a uma ligação jurídica e afectiva com um país. A haver alguma ligação do recorrente era certamente com o Interior da China, já que em Macau residiu pouco mais de 5 anos.

       Face ao expendido, o Tribunal Colectivo negou provimento ao recurso jurisdicional.

       Cfr. o acórdão do processo n.º 115/2014 do Tribunal de Última Instância.

  

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

30/01/2015