Situação Geral dos Tribunais

Punida a enfermeira-graduada do Centro Hospitalar Conde de S. Januário com pena de aposentação compulsiva, pela falsificação dos registos de trabalho extraordinário

      A, sendo enfermeira-graduada do Centro Hospitalar Conde de S. Januário, foi suspeita de que no período compreendido entre Janeiro de 2011 e Maio de 2012, tendo se aproveitado do mecanismo de cálculo de compensação por trabalho extraordinário adoptado pelo CHCSJ (compensação essa é calculada com base na hora em que conclui a consulta do último utente registada no sistema informático, acrescida de 20 minutos para arrumações), agiu repetidamente durante um longo período de tempo a furtar senhas de acesso ao sistema de informação clínico dos médicos para activar o referido sistema depois de os médicos concluírem as consultas e saírem do gabinete de consulta, lendo os registos clínicos dos utentes sem autorização e alterando as horas de armazenamento dos registos clínicos, para que recebesse as compensações pecuniárias de trabalho extraordinário por meio fraudulento.

      Em 20 de Julho de 2012, o Director dos Serviços de Saúde proferiu despacho, determinando a instauração do processo disciplinar contra A. Em seguida, o Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura proferiu despacho em 30 de Janeiro de 2013, determinando a aplicação da pena de aposentação compulsiva a A e a reposição das quantias de compensação por trabalho extraordinário indevidamente recebidas, com fundamento na violação do dever de zelo previsto no art.º 279º, n.º 2, al. b) e n.º 4, e do dever de lealdade previsto no art.º 279º, n.º 2, al. d) e n.º 6 todos do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.

      Inconformada, A interpôs recurso contencioso para o Tribunal de Segunda Instância, imputando ao acto administrativo recorrido o vício de forma, por falta de fundamentação, e o de violação de lei, por ofensa ao disposto no art.º 337º, n.º 1 do ETAPM e art.º 37º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 6/2006.

      O Tribunal de Segunda Instância conheceu da causa, indicando que o acto administrativo recorrido expôs expressamente o conteúdo do relatório do procedimento disciplinar em que foram descritos todos os factos apurados para a punição e foi demonstrada a falsificação dos registos de trabalho extraordinário pela recorrente, e que esta fundamentação por remissão é admitida pelo art.º 115º, n.º 1 do Código do Procedimento Administrativo, não se dando, assim, razão à recorrente acerca da existência do vício de forma no acto recorrido, por falta de fundamentação. Ademais, acrescentou o Tribunal de Segunda Instância que da petição do recurso se presumiu que, realmente, a recorrente pretendia invocar que a Administração tinha partido para sua punição com base em factos que não tinham sido provados, consubstanciando o vício de erro sobre os pressupostos de facto. Contudo, a recorrente não foi capaz de demonstrar o erro em apreço, apenas indicou uma contagem das horas de trabalho extraordinário que era efectivamente correcta, mas tinha sido considerada errada pela recorrente, bem como revelou simplesmente as situações gerais do seu trabalho, entretanto, não provou que no período de tempo em causa ela fizesse exactamente este ou aquele serviço especial que a obrigou a permanecer mais tempo no hospital, improcedendo, portanto, o dito vício.

      Face à razão apresentada pela recorrente, referente à violação do art.º 337º, n.º 1 do ETAPM, por nem o relatório, nem o acto administrativo, terem indicado as quantias exactas indevidamente recebidas que deveriam ser restituídas, o Tribunal de Segunda Instância apontou que embora o acto administrativo não mencionasse as quantias exactas, verificava-se do aludido acto que este remetia a liquidação para a Direcção dos Serviços de Saúde em conformidade com as informações da causa, cálculo que posteriormente foi efectuado, de que a recorrente foi notificada, não havendo, portanto, desrespeito à disposição em apreço.

      Enfim, entendeu o Tribunal de Segunda Instância que era absolutamente ilógica a violação do disposto no art.º 37º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 6/2006 alegada pela recorrente. Tal disposição prevê a prescrição da obrigatoriedade de reposição das quantias recebidas no prazo de 5 anos, após o seu recebimento. Indicou o Tribunal de Segunda Instância que, in casu, o prazo de prescrição foi interrompido no momento em que foi efectuada a notificação da acusação em processo disciplinar ou quando a Administração determinou a reposição pela recorrente das quantias indevidamente recebidas. Ainda que porventura não se tratasse duma situação interruptiva, nem por isso faria sentido a violação da supracitada disposição invocada pela recorrente, uma vez que a recorrente recebeu indevidamente a primeira remuneração do serviço extraordinário em Fevereiro de 2011, por conseguinte, o prazo de 5 anos ainda não tinha decorrido no momento, nem quando foi praticado o acto que determina a reposição das quantias, nem no momento em que a recorrente o invocou no presente recurso e nem até quando foi proferido este acórdão. Por esta razão, improcedeu-se o vício de violação de lei invocado pela recorrente.

      Face ao exposto, o Tribunal de Segunda Instância negou provimento ao recurso contencioso interposto pela recorrente, mantendo o acto administrativo recorrido.

      Cfr. o acórdão do processo n.º 206/2013 do Tribunal de Segunda Instância.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

05/08/2015