Pedido de registo da marca, caixa para cartas de jogar, apresentado por uma companhia de jogos de fortuna ou azar foi recusado
Em 23 de Junho de 2008 a Companhia A requereu junto ao Departamento de Propriedade Industrial da Direcção dos Serviços de Economia o registo da marca (N/36855) caixa para cartas de jogar, a qual consiste no seguinte:
para assinalar produtos da classe 28.ª. O Departamento de Propriedade Industrial proferiu o despacho de recusa do registo da marca por a mesma não ter capacidade distintiva, não podendo ser objecto de protecção.
Do aludido despacho, a Companhia A interpôs recurso contencioso para o Tribunal Judicial de Base, alegando que o despacho fez incorrecta aplicação da legislação e como tal requereu a sua anulação e se ordenou que se procedesse ao registo da marca do produto requerido. O Tribunal Judicial de Base entendeu que nos termos do artigo 199.º n.º 1 alínea a) do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, a referida caixa para cartas de jogar é a forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico, não tendo capacidade distintiva, pelo que, não pode registar-se como marca e, em consequência, julgou improcedente o recurso.
Não se conformando com o decidido, a Companhia A recorreu para o Tribunal de Segunda Instância.
A recorrente alegou que os botões, a altura e o comprimento do distribuidor das cartas de jogar inteligente que pretendeu registar como marca têm características específicas, a configuração exterior e o formato deste são distintos de outros distribuidores, pelo que, deve ter capacidade distintiva. Mais a recorrente alegou que a Direcção dos Serviços de Economia concedeu o título de patente de invenção ao referido distribuidor das cartas de jogar inteligente, porém, tal patente só tem por objecto as funcionalidades e as particularidades do distribuidor das cartas de jogar inteligente, nenhuma das funcionalidades e particularidades impõe a configuração tridimensional exterior do distribuidor, e a sua configuração exterior é somente ornamental e não funcional nem está associada com qualquer efeito técnico, pelo que, entendeu que o Tribunal Judicial de Base não podia recusar o registo de marca do distribuidor das cartas de jogar inteligente com fundamento de que o mesmo é a forma do produto necessária à obtenção de um resultado técnico.
O Tribunal de Segunda Instância procedeu ao julgamento da causa, concordando com o entendimento do Tribunal Judicial de Base, entendendo que as funções do distribuidor das cartas de jogar inteligente que a recorrente pretende registar são basicamente iguais às dos distribuidores genéricos, isto é, destinam-se ambos a guardar as cartas, permitir que estas sejam retiradas pelo croupier, sem serem vistas e serem depois distribuídas, e a sua configuração exterior também não é específica ou especial. Além disso, apesar de o design da configuração exterior do produto não ser objecto de nenhum patente de invenção, isto não implica que tal design só é ornamental e não está associada com qualquer efeito técnico, pelo contrário, são precisamente as funções básicas do distribuidor das cartas de jogar que impõem necessariamente a configuração tridimensional exterior da marca registanda, pelo que, o Tribunal de Segunda Instância julgou que a referida marca não tem capacidade definitiva por não preencher o artigo 197.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial.
Aliás, a recorrente também defendeu que a marca registanda já adquiriu, por via do chamado secondary meaning, a capacidade distintiva de marca por a forma ornamental do distribuidor das cartas de jogar estar de tal modo divulgada nos casinos de Macau que os consumidores que vêem este distribuidor de cartas conseguem imediatamente identificar o seu produto.
O Tribunal de Segunda Instância entendeu que estes factos invocados pela recorrente não foram dados por provados pelo Tribunal Judicial de Base nem o mesmo se pronunciou sobre esta questão, porém, em vez de impugnar a matéria de facto provada ou arguir a nulidade de sentença por omissão de pronúncia, a recorrente veio limitar-se a repetir, nesta instância, aquilo que já foi alegado sobre a invocada aquisição da capacidade distintiva através do secondary meaning na petição do recurso para o Tribunal Judicial de Base, pelo que, o Tribunal de Segunda Instância julgou improcedente esta parte de recurso por inexistência de matéria de facto e por carácter não oficioso do conhecimento da questão de secondary meaning.
Pelos acima expostos, o Tribunal de Segunda Instância julgou improcedente o recurso, mantendo na íntegra a sentença recorrida e mantendo a decisão da Direcção dos Serviços de Economia que indeferiu o pedido de registo de marca da recorrente.
Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, Processo n.º 929/2009
Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância
07/07/2015