Situação Geral dos Tribunais

Basta a exibição de documento de identificação alheio com intenção de ocultar a verdadeira identidade para integrar o crime de uso de documento alheio

        A, residente do Interior da China, foi expulso de Macau pela polícia em 10 de Maio de 2011 e interdito de reentrar durante o período de 11 de Maio de 2011 a 10 de Maio de 2016. A fim de reentrar no Território, A, em 2 de Setembro de 2011, nadou de Zhuhai para Macau, onde chegou a entrar clandestinamente. B, amigo de A, mora numa fracção autónoma do Bloco 4 do Edifício Centro Internacional, na qual morava também A nessa altura. Desde Setembro de 2011, A acolhia na mesma fracção autónoma C que entrou em Macau de forma clandestina, mediante o pagamento de uma renda diária de $250.

        Enquanto permanecia em Macau, A obteve, por via desconhecida, um Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Hong Kong, com o n.º XXX, cujo titular é XXX. Em 17 de Outubro de 2011, no decurso duma investigação domiciliária realizada por agentes da Polícia de Segurança Pública na fracção autónoma supracitada, A mostrou, como próprio documento legal de identificação, aos agentes policiais o aludido Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Hong Kong n.º XXX, com o propósito de encobrir a sua permanência ilegal em Macau.

        Tendo presentes os factos supra descritos, o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, após julgamento, absolveu os arguidos A e B da prática de um crime de acolhimento que lhes foi imputado, e o arguido A da prática de um crime de uso de documento alheio, mas condenou o arguido A pela prática de um crime de reentrada ilegal.

        Da decisão de primeira instância na parte referente à absolvição de A do crime de uso de documento alheio, o Ministério Público recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, invocando a violação pela decisão recorrida do disposto no art.º 20.º da Lei n.º 6/2004.

        Depois da apreciação e análise do caso vertente, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância acolheu o fundamento em que se baseou o recurso do Ministério Público, apontando que o Tribunal recorrido interpretou erradamente o referido preceito legal quanto ao tipo do crime de uso de documento alheio. Na óptica do Tribunal recorrido, a exibição do Bilhete de Identidade de Residente Permanente de Hong Kong, por si só, não era bastante para convencer a polícia de que o interessado permanecia legalmente em Macau, daí a conduta de A consubstanciar uma “tentativa manifestamente impossível”, devendo o mesmo ser absolvido. No entanto, entendeu o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância que, para o preenchimento deste tipo de crime, a lei não exige que a pessoa que utilize documento de identificação alheio mostre, ao mesmo tempo, documento de entrada e permanência a quem inspeccione documentos, sendo que basta a utilização de documento de identificação alheio com intenção de encobrir a sua permanência ilegal em Macau e se esquivar das sanções jurídicas relativas à imigração ilegal para integrar o crime de uso de documento alheio.

        Nos termos acima expostos, acordaram no Tribunal de Segunda Instância em julgar procedente o recurso interposto pelo Ministério Público, passando a condenar o arguido A pela prática de um crime de uso de documento alheio p. e p. pelo art.º 20.º da Lei n.º 6/2004, reenviando o processo ao Juízo recorrido para este determinar a medida da pena.

        Vide o Acórdão do TSI, processo n.º 288/2014.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

14/07/2015