O Tribunal de Segunda Instância passa a condenar o arguido pela prática simultânea do crime de condução sob influência de estupefacientes e crime de consumo ilícito de estupefacientes, por serem diferentes os bens jurídicos protegidos nos dois crimes
Em 7 de Outubro de 2014, o Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base condenou o arguido A, pela prática de um crime de condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo n.º 2 do art.º 90º da Lei do Trânsito Rodoviário, na pena de 6 meses de prisão efectiva e na pena acessória de inibição de condução pelo período de 1 ano e 6 meses. A par disso, o arguido foi ainda acusado da prática, em autoria material e na forma deliberada e consumada, de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo art.º 14º da Lei n.º 17/2009, de 10 de Agosto, que foi absorvido pelo supracitado crime de condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo n.º 2 do art.º 90º da Lei do Trânsito Rodoviário, razão pela qual, não foi autonomamente punido.
Inconformados, o Ministério Público e o arguido interpuseram recurso para o Tribunal de Segunda Instância.
O Ministério Público discordou com a decisão do Tribunal a quo que reconheceu a relação de absorção entre o crime de condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas e o crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas e, em consequência, não puniu autonomamente este último crime. Mais, entendeu que a referida decisão violou as normas legais, padecendo do vício de erro na aplicação da lei, previsto no n.º 1 do art.º 400º do Código de Processo Penal.
Por seu turno, entendeu o arguido que o Tribunal a quo não substituiu a pena de prisão que lhe foi imposta por multa, desobedecendo, portanto, ao disposto no art.º 44º do Código Penal, e que não se verificou a necessidade da execução efectiva da pena de prisão tanto em termos da prevenção geral como prevenção especial, invocando a substituição da pena de prisão por pena não privativa da liberdade.
Finda a apreciação do caso, o Tribunal Colectivo do Tribunal de Segunda Instância considerou que o crime de condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas e o crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas eram completamente diferentes na sua natureza e protegiam bens jurídicos distintos. O bem jurídico protegido pelo crime de condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas consiste na segurança dos utentes da via pública, enquanto o crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas visa assegurar, em primeiro lugar, a saúde pessoal do agente e, em seguida, a saúde pública. Assim sendo, concedeu-se provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, passando o arguido a ser condenado pela prática simultânea de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, p. e p. pelo art.º 14º da Lei n.º 17/2009, de 10 de Agosto.
Ademais, face ao recurso interposto pelo arguido, pelas circunstâncias expostas no caso, averiguou-se que o arguido tinha baixo grau de arrependimento, fraca consciência na observação da lei e elevado grau da intensidade do dolo. Nesta conformidade, tendo-se em conta as situações concretas do caso e os problemas reais enfrentados pela sociedade de Macau, mormente os antecedentes criminais do arguido, verificou-se que a substituição da pena de prisão por multa ou a suspensão da execução da pena aplicada ao arguido não realizaria de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, sobretudo não satisfaria as exigências da prevenção especial.
Face ao expendido, acordaram em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e negar provimento ao recurso interposto pelo arguido, passando o arguido a ser condenado, pela prática de um crime de consumo ilícito de estupefacientes e de substâncias psicotrópicas, na pena de 1 mês de prisão, e, pela prática de um crime de condução sob influência de estupefacientes ou substâncias psicotrópicas, na pena de 6 meses de prisão. Em cúmulo jurídico, o arguido foi condenado na pena de 7 meses de prisão efectiva.
Cfr. os acórdãos dos processos n.º 784/2014 e n.º 784/2014-I do Tribunal de Segunda Instância.
Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância
20/07/2016