Situação Geral dos Tribunais

O TUI declara que um slogan com capacidade distintiva pode ser registado como marca

Em 17 de Setembro de 2019, A apresentou à então Direcção dos Serviços de Economia o pedido de registo de marca na classe 25, com exemplar de “IT’S LIKE MILK BUT MADE FOR HUMANS”. Por despacho de 30 de Outubro de 2020 do Chefe do Departamento da Propriedade Intelectual, foi indeferido o pedido de registo da marca em causa. Do despacho recorreu A para o Tribunal Judicial de Base, onde foi julgado improcedente o recurso, e, em seguida, A interpôs recurso para o Tribunal de Segunda Instância contra a sentença do TJB. Em 23 de Setembro de 2021, o TSI proferiu acórdão que homologou a sentença do TJB. Ainda inconformada, do acórdão A recorreu para o Tribunal de Última Instância.

O Tribunal Colectivo do TUI conheceu do caso.

De acordo com o Tribunal Colectivo, no caso, a marca que se pretende registar é composta por uma frase. No entendimento do Departamento da Propriedade Intelectual da DSE, do TJB e do TSI, deve-se recusar o registo da marca, uma vez que a dita marca tem inclinação forte de propaganda e inclina-se mais a constituir um slogan; a mesma integra expressões extremamente comuns, que são possivelmente usadas na promoção dos produtos e serviços pelas empresas; sendo composta puramente pelas expressões usuais na linguagem corrente ou nos hábitos leais e constantes do comércio; sendo, ainda, susceptível de induzir em erro o público, uma vez que a marca em causa destina-se ao fornecimento de produtos de vestuário na classe 25, e a parte principal da marca em causa é susceptível de fazer considerar que esta se destina ao fornecimento de leite e lacticínios. Mais, a Lei não proíbe que um slogan – que é um vocábulo de origem inglesa, e que, no fundo, é uma expressão original, breve, concisa, impactante e convincente, tendencialmente fácil de assimilar e lembrar, normalmente utilizada em campanhas políticas, de publicidade ou de propaganda para lançar um produto – seja registado como marca. Mas proíbe, sim, um slogan promocional que se limita a realçar a qualidade dos produtos ou serviços. Ainda que seja um slogan, pode o mesmo ser registado como marca desde que tenha capacidade distintiva, por exemplo: um slogan que constitui um jogo de palavras; com duplo sentido, para que possa ser considerado imaginativo, surpreendente ou inesperado; tem uma originalidade ou ressonância particular; desencadeia na mente do público relevante um processo cognitivo, suscitando a imaginação e exigindo um esforço de interpretação; utiliza e recorre a figuras de linguagem, podendo integrar figuras de semântica, de sintaxe e de som/fonética. Na opinião do Tribunal Colectivo, a marca registanda em causa possui a aludida capacidade distintiva exigida no registo de marca, pois que o jogo de palavras que a mesma encerra, com uma intrigante contradição entre a sua primeira parte (“IT’S LlKE MILK”) e a segunda (“BUT MADE FOR HUMANS”), não deixa de colocar em questão a ideia de que o leite seja sempre um elemento essencial da dieta humana, acabando por instigar a reflexão, desencadeando, por sua vez, um processo cognitivo na mente do público ao qual se dirige, e, sendo, por isso, de fácil memorização, o que a torna capaz de distinguir os produtos a que dizem respeito dos produtos de empresas concorrentes. Quanto à questão de saber se no slogan em causa se verifica o fundamento de recusa do registo de marca consagrado na alínea a) do n.º 2 do art.º 214.º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial, segundo o Tribunal Colectivo, os produtos que se visam assinalar com a marca registanda, integram-se na classe 25, incluindo produtos de vestuário, calçado e chapelaria. Os consumidores não assumirão que o referido tipo de produtos pode ser ingerido como o leite. O slogan em causa não induzirá em erro os consumidores. Para esses consumidores, o dito slogan não indica uma real qualidade dos produtos em causa, não induzindo em erro os consumidores. Assim sendo, no slogan em causa não se verifica o fundamento de recusa do registo de marca previsto na alínea a) do n.º 2 do art.º 214º do Regime Jurídico da Propriedade Industrial.

Nos termos e fundamentos expostos, em conferência, acordaram revogar a decisão recorrida, concedendo-se provimento ao recurso.

Cfr. Acórdão proferido pelo Tribunal de Última Instância no processo n.º 3/2022.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

18/05/2022