Situação Geral dos Tribunais

Condenada a arguida pelo crime de passagem de moeda falsa, por não ter sido provado o concerto com o falsificador

      Por acórdão do Tribunal Judicial de Base, datado de 17 de Outubro de 2014, A foi condenada pela prática, na forma consumada, de 8 “crimes de passagem de moeda falsa de concerto com o falsificador”, p. e p. pelo art.º 254.º, n.º 1, ex vi do art.º 252.º, n.º 1 e 257.º, n.º 1, todos do Código Penal, na pena de 3 anos e 9 meses de prisão para cada crime; pela prática, na forma tentada, de 2 crimes supra referidos, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão para cada crime; pela prática de 1 “crime de falsificação de documento de especial valor”, p. e p. pelo art.º 245.º do Código Penal, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão; e pela prática de 2 “crimes de uso de documento de identificação alheio”, p. e p. pelo art.º 251.º do Código Penal, na pena de 1 ano de prisão para cada crime. Em cúmulo jurídico, foi-lhe aplicada a pena única de 10 anos e 6 meses de prisão.

      Da supracitada decisão condenatória recorreu A para o Tribunal de Segunda Instância, afirmando que o Tribunal a quo fez uma errada qualificação jurídico-penal dos factos que lhe foram imputados. Para decidir como decidiu, o Tribunal a quo socorreu-se de dois factos: primeiro, os cartões de crédito contrafeitos que a recorrente utilizou foram disponibilizados pelos seus falsificadores; segundo, a ora recorrente agiu em conjugação e em acordo com os falsificadores, agindo como “piloto” ou “motorista” (ou seja, “utilizador dos cartões falsos”), a fim de obter benefícios para si e terceiros. Com base nisso, o Tribunal a quo formou a convicção de que a recorrente cometeu o “crime de passagem de moeda falsa de concerto com o falsificador”, p. e p. pelo art.º 254.º do Código Penal.

      Manifestou o Tribunal de Segunda Instância depois da apreciação da causa que, a recorrente, que não é falsificadora de cartões de crédito, precisa inevitavelmente de obter os cartões de crédito contrafeitos junto dos falsificadores. Mas isso não implica necessariamente um concerto ou acordo entre eles. Para provar a existência de tal concerto ou acordo, ao menos, é preciso demonstrar uma “convergência de vontades e de esforços”. Só pelo facto de disponibilização e fornecimento dos cartões de crédito contrafeitos pelos falsificadores não se revela a existência do dito concerto entre a recorrente e os falsificadores. O segundo facto em que se fundamentou a decisão do Tribunal a quo é um juízo conclusivo da questão de direito, não podendo, portanto, servir de matéria de facto. Para além disso, não há nenhuma outra matéria de facto dada como provada a evidenciar um acordo entre a recorrente e os falsificadores, exigido pelo tipo de crime, também não se provou que a recorrente agisse conforme as instruções dadas pelos falsificadores.

      Nestes termos, o Tribunal Colectivo entendeu que deve a conduta da recorrente ser qualificada como “crime de passagem de moeda falsa”, previsto no art.º 255.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, e não “crime de passagem de moeda falsa de concerto com o falsificador”, previsto no art.º 254.º, tal como foi entendido pelo Tribunal a quo.

      De outra banda, à luz do art.º 392.º, n.º 2, al. a) do Código de Processo Penal, em relação ao 2º arguido B que foi condenado pelo Tribunal a quo como co-autor, o Tribunal de Segunda Instância também procedeu, oficiosamente, à alteração da qualificação jurídico-penal e da pena imposta ao mesmo.

      Alterada a qualificação jurídico-penal dos factos, torna-se necessária a nova determinação da pena. Tendo em conta que a recorrente, embora sendo primária, agiu com dolo intenso, e que são fortes as exigências de prevenção do crime deste género, o Tribunal Colectivo considerou justa e razoável a condenação da recorrente na pena de 2 anos de prisão para cada um dos 8 “crimes de passagem de moeda falsa” cometidos na forma consumada, e na pena de 1 ano de prisão para cada um dos supra referidos crimes cometidos na forma tentada.

      Face ao expendido, acordaram no Tribunal de Segunda Instância em conceder parcial provimento ao recurso, alterando-se a qualificação jurídico-penal efectuada em relação à 1ª arguida A, ficando a mesma condenada na pena única de 8 anos de prisão, alterando-se, também, em aplicação do art.º 392.º do Código de Processo Penal, a dita qualificação efectuada em relação ao 2º arguido B para a de 1 ano de prisão. Tendo em consideração que o 2º arguido ficou em prisão preventiva por um período superior ao da pena efectiva que lhe foi imposta, ordenaram a passagem dos competentes mandados para a sua imediata soltura.

      Vide o Acórdão do TSI, processo n.º 847/2014.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

18/08/2015