Situação Geral dos Tribunais

As questões de facto estão fora do âmbito do recurso para fixação de jurisprudência

      No Acórdão de 14 de Maio de 2015, proferido pelo Tribunal de Segunda Instância no Processo n.º 220/2015, foi A condenado, pela prática em autoria material e na forma consumada de um crime de falsificação de documento de especial valor, p. p. pelo art.º 244.º, n.º 1, al. c), conjugado com o art.º 245.º do Código Penal de Macau, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos.

      Inconformado, veio A interpor para o Tribunal de Última Instância recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, com fundamento em o referido Acórdão se encontrar em oposição com o Acórdão do TUI de 18 de Março de 2015, no Processo n.º 12/2015. No Acórdão recorrido do TSI, o Tribunal a quo, com base numa informação fornecida pela autoridade policial de Zhuhai, deu como provado que A tinha utilizado o “alvará de funcionamento para sociedade – pessoa colectiva” falsificado, para mostrar a sua capacidade económica e financeira, cometendo, assim, o crime de falsificação de documento de especial valor. E no Acórdão-Fundamento, o TUI considerou que a prova de facto atinente ao crime de contrafacção de cartões de crédito com base apenas num relatório enviado por autoridade policial do Interior da China, indicando que os dois arguidos fazem parte do grupo que procedeu à contrafacção dos cartões de crédito constitui um procedimento contrário ao disposto no artigo 336.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, concluindo pela verificação de erro notório na apreciação da prova.

      O TUI procedeu ao julgamento da causa, indicando os seguintes pressupostos da uniformização de jurisprudência: existe oposição evidente entre as duas decisões; a questão decidida pelas duas decisões é idêntica; a questão sobre a qual se verifica a oposição é fundamental; e a questão sobre a qual há oposição é uma questão de direito.

      No Acórdão de 18 de Março de 2015, no Processo n.º 12/2015, o TUI não decidiu que não era possível dar como provados factos apenas com base em provas produzidas no exterior de Macau, seja no Interior da China, seja noutro local. O que se decidiu foi que, no caso concreto, em que estava em causa a prova de factos que integravam o crime de contrafacção dos cartões de crédito, na falta de confissão dos arguidos, seria fundamental a apreensão aos arguidos de instrumento utilizado na contrafacção dos cartões de crédito e/ou a produção de prova testemunhal de membro das forças policiais do Interior da China ou de outra pessoa com intervenção em tais factos, que pudessem depor em audiência. Não bastando, para a prova dos factos da contrafacção, um relatório policial do Interior da China indicando que os dois arguidos fazem parte do grupo que procedeu à contrafacção dos cartões de crédito.

      No caso vertente, o Acórdão recorrido, de 14 de Maio de 2015, do TSI, deu como provada a falsidade de um documento do Interior da China com base em informação de autoridade policial do Interior da China de que «Na base de dados dos Serviços de Administração da Indústria e do Comércio de Zhuhai não se encontra qualquer elemento atinente à “Sociedade Limitada de Fomento Predial B”, pelo que o respectivo “alvará de funcionamento para sociedade – pessoa colectiva é falsificado», entendendo que tal informação estava submetida ao princípio da livre apreciação da prova. Trata-se, essencialmente, de uma questão de facto e não de direito, e está fora do âmbito da uniformização de jurisprudência.

      Por outro lado, não há nenhuma semelhança entre as questões decididas nos dois Acórdãos. No Acórdão do TUI era essencial prova testemunhal, enquanto no Acórdão recorrido o essencial era informação documental sobre a prova sobre a veracidade ou falsidade de um documento alegadamente emitido por autoridades do Interior da China. Quanto a este aspecto, não se vislumbra haver algum obstáculo a que os tribunais de Macau dêem como provado facto sobre a falsidade de documento com base em documento oficial do exterior de Macau, seja do Interior da China, seja de qualquer outro local. Aqui, a prova testemunhal não só não era necessária, como seria redundante e, até, perniciosa.

      Nestes termos, acordaram em negar provimento ao recurso.

      Cfr. Acórdão do TUI, no Processo n.º 59/2015. 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

24 de Setembro de 2015