Situação Geral dos Tribunais

O divórcio litigioso não exige que o propósito de não restabelecer a vida conjugal de uma ou ambas as partes se mantinha por dois anos consecutivos

      A (marido) e B (esposa) casaram-se em 25 de Setembro de 1983. Desde 2011, A não mais regressou à casa de morada de família e mantinha uma relação extraconjugal com outra mulher.

      A intentou uma acção de divórcio litigioso contra B no Tribunal Judicial de Base, alegando que os dois viviam em separação desde 2002 e que não havia de ambas as partes o propósito de restabelecer a vida em comum, pelo que pedindo que fosse decretado o divórcio entre as partes por separação de facto por dois anos consecutivos.

      Realizada a audiência de julgamento, o Juízo de Família e de Menores do Tribunal Judicial de Base entendeu que a relação matrimonial só pode ser extinta por fundamento de separação de facto quando se verifique o preenchimento dos requisitos objectivos e subjectivos há mais dois anos. Dado que o Juízo reconheceu o facto de que o Autor não tinha o propósito de restabelecer a vida em comum com a Ré a partir do dia em que intentou a acção de divórcio litigioso, ou seja, 22 de Novembro de 2012, entendeu o mesmo Juízo que até ao dia da conclusão do debate, ou seja, 10 de Novembro de 2014, o requisito subjectivo (propósito de não restabelecer a vida em comum) ainda não completou dois anos, razão pela qual julgou improcedente o pedido de divórcio litigioso.

      Inconformado, o Autor recorreu para o Tribunal de Segunda Instância.

      Apontou o Tribunal de Segunda Instância: segundo o artigo 1637º, al. a) do Código Civil é fundamento do divórcio litigioso a separação de facto por dois anos consecutivos e o artigo 1638º, nº 1 do mesmo Código reza que na acção de divórcio litigioso por separação de facto deve-se pretender e comprovar que não existe comunhão de vida entre os cônjuges e há da parte de ambos, ou de um deles, o propósito de não a restabelecer. Quanto ao requisito subjectivo, ou seja, os factos que envolvem a disposição interior e afectividade, o Tribunal de Segunda Instância entendeu que, geralmente, a vontade de não restabelecer a vida conjugal surgiu gradualmente com o passar do tempo, não sendo fácil determinar o tempo concreto, devendo, por isso, considerar a matéria de facto no reconhecimento de requisitos subjectivos, conjugando com as regras da experiência comum para julgar se há, ou não, de ambas as partes o propósito de não restabelecer a vida conjugal. Entendeu o mesmo Tribunal que “a lei não exige que, para ser julgada procedente a acção de divórcio litigioso, a intenção de não restabelecimento da vida em comum de uma ou de ambas as partes se deva manter durante os dois anos. Foi comprovado que o Autor não regressou mais à casa de morada de família desde 2011, e foi comprovado ainda que o Autor mantém uma relação extraconjugal com outra mulher e não tem vontade de restabelecer a vida conjugal com a Ré”. Analisadas as situações com as regras de experiência comum, o Tribunal de Segunda Instância entendeu que o Autor decidiu deixar a casa de morada de família por ruptura da relação conjugal entre ele e a Ré. Neste caso concreto, o Autor e a Ré deixaram de viver juntos por ruptura da relação conjugal, tal situação tinha mantido por mais de dois anos consecutivos, pelo menos o Autor manifestou a vontade de não restabelecer a vida em comum. Assim sendo, entendeu o Tribunal de Segunda Instância que foram preenchidos os requisitos para o divórcio por separação de facto, julgando procedente o pedido de divórcio apresentado pelo Autor.

      Nos termos expostos, o Tribunal de Segunda Instância julgou procedente o recurso interposto, decretando o divórcio entre o Autor e a Ré.

      Cfr. o acórdão proferido no processo nº 457/2015 do Tribunal de Segunda Instância.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

08/01/2016