Situação Geral dos Tribunais

Homem que ofendeu esposa como dolo eventual foi sujeito à punição penal

        No dia 16 de Outubro de 2009, o arguido (recorrente) e a sua esposa (ofendida), na residência deles, tiveram discussões sobre a relação extraconjugal que o arguido tinha em Zhuhai. No decurso das discussões, o arguido avançou e empurrou a ofendida, que caiu no chão, ficando ferida no pulso esquerdo. A seguir, o arguido deixou a residência, enquanto a ofendida pediu ajuda à polícia. A conduta agressiva do arguido causou lesões à ofendida, necessitando esta de dois dias para se recuperar. Com base nisso, o Tribunal Judicial de Base condenou o arguido pela prática dolosa, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa simples à integridade física previsto e punível pelo Código Penal, na pena de três meses de prisão, suspensa na sua execução por dois anos, sob as condições de: 1. que o arguido ficasse sujeito ao regime de prova durante o tempo de duração da suspensão; 2. que o arguido pagasse à ofendida a indemnização fixada no presente processodentro de um mês após a sentença trânsito em julgado.

        Inconformado com a sentença proferida pelo Tribunal Judicial de Base, o arguido recorreu para o Tribunal de Segunda Instância. No entender do recorrente, o Tribunal a quo estava errado ao considerar dolosa a conduta do recorrente, uma vez que a factualidade provada apenas permitia afirmar que o recorrente “avançou e empurrou a ofendida”, actos esses que foram praticados pelo recorrente não com a intenção ou na expectativa de ofender o corpo da ofendida, mas por, e tão-só, querer livrar-se dela, sendo que só assim se explicaria porque é que “a seguir, o arguido deixou a residência”, em vez de continuar as discussões ou praticar mais actos agressivos. Ponderando que não se podia concluir seguramente que o recorrente tinha a vontade ou a resolução criminosa de ofender a integridade física da ofendida, dever-se-ia, com observância do princípio in dubio pro reo, prolatar uma decisão mais favorável ao recorrente em caso de dúvida relativa à existência dos factos, ou, até mesmo, absolvê-lo do crime imputado.

        Após o julgamento, o Tribunal de Segunda Instância considerou manifestamente improcedente o recurso interposto pelo recorrente. Em primeiro lugar, não estava alicerçado em nenhum facto o fundamento invocado pelo recorrente de ele só ter empurrado a ofendida para se livrar dela. Após notificado da acusação, o recorrente não apresentou novos factos para serem apreciados pelo Tribunal, e só veio fazê-lo na fase de recurso, o que não é permitido por lei, daí o Tribunal ad quem não ter condições para, desrespeitando o princípio do contraditório, dar por provados os novos factos invocados pelo recorrente. Para além disso, apesar de apenas se ter provado no caso vertente que o recorrente tinha empurrado a ofendida, sendo tal actuação espontânea, o agente podia, de facto, prever a consequência da sua conduta, acresce que, na perspectiva objectiva, a sua conduta levou a que a ofendida tenha caído e ficado ferido, entendeu o Tribunal que, dentre as três formas de dolo previstas no art.º 13.º do Código Penal, se verificava, pelo menos, dolo eventual na sua conduta, a qual, portanto, devia ser penalizada.

        O Tribunal de Segunda Instância decidiu indeferir o recurso do recorrente.

        Cfr. Sentença do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 701/2011.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

16/05/2014