Situação Geral dos Tribunais

O tribunal não sustentou o pedido de indemnização pela perda de proventos devido à escassez de provas

       A 1ª Autora A e a 2ª Autora B (menor, representada pela sua mãe, ora 1ª Autora A) intentaram acção no Tribunal Judicial de Base contra D (1ª Ré) e C (companhia seguradora, ora 2ª Ré), na qual pediram ao Tribunal que condenasse as Rés a pagar-lhes uma quantia total de MOP5.263.770,00, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais.

       Os factos principais desta causa: a 1ª Ré D conduzia o veículo e embateu no motociclo da Autora que estava a circular na mesma estrada, causando lesões físicas às vítimas que eram a duas Autoras do caso. Em consequência do acidente, a 1ª Autora sofreu hérnia de disco na vértebra cervical, foi submetida a uma intervenção cirúrgica e pagou de despesas médicas e medicamentosas um total de MOP68.795,00, enquanto a 2ª Autora sofreu contusão na perna inferior esquerda e gastou MOP4.405,00. Após ser lesada, a 1ª Autora esteve incapacitada de trabalhar entre 11 de Dezembro de 2009 e 20 de Maio de 2010. Apesar de ter retomado o seu trabalho normal em 20 de Maio de 2010, em Julho do mesmo ano, devido às dores intensas que tinha do lado direito do pescoço em consequência do acidente, a 1ª Autora teve de internar em hospital entre 16 e 20 de Julho de 2010 para se submeter a uma intervenção cirúrgica de descompressão discal por plasma, a que se seguiu um período de baixa médica até 19 de Novembro de 2010 e foi despedida na mesma data pela sua entidade patronal. A 1ª Autora tinha 42 anos de idade na altura em que estava lesada em consequência do acidente.

       Entre a 1ª Ré D e a 2ª Ré C foi celebrado o contrato de seguro obrigatório, através do qual a responsabilidade de indemnização foi transferida à 2ª Ré, desde que o valor de indemnização não exceda ao limite máximo da quantia segurada (MOP1.000.000,00). Caso o valor de indemnização exceda ao limite máximo da quantia segurada, a condutora que contribua para o acidente de viação em causa, ou seja, a 1ª Ré, será responsável pelo pagamento do valor remanescente da indemnização.

       O Tribunal Judicial de Base julgou parcialmente procedente a acção intentada pela Autora A, condenando a companhia seguradora, ora 2ª Ré C, a efectuar o pagamento das seguintes prestações pecuniárias a favor das duas Autoras: MOP167.211,34 a título de indemnização pelos danos patrimoniais (MOP162.356,34 a favor da 1ª Autora e MOP4.855,00 a favor da 2ª Autora); MOP320.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais (MOP300.000,00 a favor da 1ª Autora e MOP20.000,00 a favor da 2ª Autora), acrescidas de juros legais, contados a partir do dia seguinte à sentença e até efectivo e integral pagamento. A par disso, a companhia seguradora, ora 2ª Ré C, foi ainda condenada a pagar à Autora a indemnização pela perda parcial do salário respeitante ao mês de Agosto de 2010 que tinha sido deduzido pela entidade patronal, por faltas por doença, cuja quantia concreta seria liquidada em execução da sentença. O valor total de indemnização não excedeu ao limite máximo da quantia segurada, pelo que se absolveu a 1ª Ré D dos pedidos intentados pelas Autoras.

       Inconformadas com a referida decisão, as duas Autoras recorreram para Tribunal de Segunda Instância, impugnando principalmente as seguintes duas questões: 1. Proventos perdidos; 2. Indemnização pelos danos morais.

       No que concerne aos proventos perdidos, a 1ª Autora A invocou na petição inicial que, por ser despedida pela entidade patronal em consequência do acidente de viação em causa, tinha direito à indemnização pela perda dos rendimentos do trabalho referentes a futuro 23 anos, solicitando assim ao Tribunal que condenasse as duas Rés a pagar-lhe, solidariamente, a quantia de MOP4.120.680,00 em conformidade com a idade e o provento que ela tinha na ocorrência do acidente. A Recorrente entendeu que o acidente de viação em apreço era justamente a causa da incapacidade para o trabalho sofrida pela 1ª Autora, razão pela qual esta ainda não conseguiu retomar o emprego. Ela tinha 42 anos de idade na altura em que se encontrava lesada, teria ainda à sua frente 23 anos de vida profissional activa em situação normal, é divorciada, tem a seu cargo 3 filhos ainda a estudar e sua mãe já muito idosa, bem como é responsável pelas despesas familiares.

       No entendimento do Tribunal colectivo do Tribunal de Segunda Instância: a Autora pediu a indemnização pela perda dos rendimentos do trabalho respeitantes a futuro 23 anos. A procedência de tal pedido depende do apuramento da incapacidade total para o trabalho ou ganho de rendimento sofrida pela Autora em futuro 23 anos. À luz do princípio dispositivo das partes, previsto no art.º 5º do Código de Processo Civil, à Autora cabe invocar os factos formulados na sua pretensão. In casu, o Tribunal, tendo observado os factos invocados pela Autora na petição inicial, não verificou que a Autora tivesse invocado o facto que demonstrasse a continuidade da sua incapacidade total para o trabalho ao longo do período entre 19 de Novembro de 2010, após ser despedida, e quando teria 65 anos de idade. Ademais, os factos assentes na primeira instância eram difíceis de levar o Tribunal a presumir que as aludidas lesões causassem necessariamente à 1ª Autora, no futuro, a incapacidade para qualquer trabalho remunerado. A Autora não invocou facto que demonstrasse a sua incapacidade permanente para o trabalho, bem como o Tribunal, só com base nos factos assentes na primeira instância, não presumiu a incapacidade permanente para o trabalho sofrida pela Autora, pelo que não se verificou a incorrecção naquela parte da decisão do Tribunal a quo, sendo devidamente mantida.

       Quanto à indemnização pelos danos morais, as 1ª e 2ª Autoras não se conformaram com o montante da indemnização pelos danos morais, fixado pelo tribunal de primeira instância, considerando que as quantias de MOP300.000,00 e MOP20.000,00, respectivamente fixadas, eram demasiado reduzidas, pois, invocaram o aumento das quantias de indemnização para os valores não inferiores a MOP700.000,00 e MOP80.000,00.

       Na opinião do Tribunal colectivo do Tribunal de Segunda Instância: dano moral consiste na lesão da vítima que afecta os seus bens jurídicos, tais como a integridade física, a saúde, a vida, a liberdade, a aparência, a reputação e o bom nome, como por exemplo a emoção desagradável derivada das dores físicas, do desgosto moral, da angústia, da ofensa do bom nome e da alteração da aparência. Tal prejuízo não pode ser avaliado nem reparado pecuniariamente, pois, a indemnização pelos danos morais consagrada na lei serve precisamente para compensar ou diminuir o desgosto, sofrimento, inquietação e angústia causados a vítima pelo dano moral.

       Tendo em conta a inquietação moral e o incómodo na vida da 1ª Autora que foram provocados pelas dores resultantes das lesões sofridas, pela incapacidade para o trabalho que durou mais de 5 meses contados a partir da ocorrência do acidente, bem como pela intervenção cirúrgica de descompressão e baixa médica emergentes das dores no pescoço e ombros, averiguou-se que era idóneo o valor de indemnização de MOP300.000,00 fixado pelo Tribunal a quo, não havendo desobediência dos critérios previstos nos n.ºs 1 e 3 do art.º 489º do Código Civil. Conforme os factos provados, a 2ª Autora sofreu contusão na perna inferior esquerda e ficou com trauma psicológico. Pela quantia de MOP4.405,00 gasta em tratamentos médicos, presumiu-se que a contusão na perna inferior esquerda não fosse grave, porém, a gravidade do trauma psicológico da mesma era difícil de presumir por escassez de factos. Deste modo, nesta causa não houve demais fundamentos de facto bastantes que levassem o Tribunal a elevar os montantes fixados pelo tribunal de primeira instância, sem outra opção, determinou-se manter os montantes fixados pelo tribunal de primeira instância.

       Acordaram no colectivo do Tribunal de Segunda Instância em negar provimento ao recurso interposto pelas Autoras, mantendo a sentença a quo.

       Cfr. o acórdão do processo n.º 785/2012 do Tribunal de Segunda Instância. 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

11/06/2014