Situação Geral dos Tribunais

Negou-se provimento ao recurso contencioso em face da impossibilidade de comprovação da titularidade do direito relativo à sepultura

      Em 14 de Janeiro de 2005, o cônjuge do recorrente faleceu em Macau. Em 6 de Junho de 2013, o recorrente, pretendendo proceder à junção do seu cônjuge falecido com inumados na sepultura perpétua n.º XX no Cemitério de S. Miguel Arcanjo (vulgarmente conhecido por Cemitério Ocidental), apresentou um requerimento ao Instituto para os Assuntos Cívicos e Municipais (adiante, designado abreviadamente por IACM), no qual indicou que não tinha conseguido encontrar os documentos concernentes à referida sepultura perpétua para proceder seguindo as formalidades normais, pedindo, assim, que fosse autorizada a pretendida junção do seu cônjuge com familiares deste na sepultura perpétua n.º XX no Cemitério de S. Miguel Arcanjo. De acordo com os documentos e arquivos no IACM, a sepultura perpétua n.º XX no Cemitério de S. Miguel Arcanjo foi adquirida no dia 22 de Maio de 1924.

      No relatório elaborado pelo pessoal do IACM, referiu-se que, pelo facto de o recorrente não ter fornecido o título de aquisição da sepultura perpétua n.º XX, ao que acrescia que o IACM, após pesquisa, não tinha encontrado documento respeitante a essa aquisição, era impossível comprovar que o recorrente fosse titular do direito relativo à sepultura, a que se reporta o art.º 9.º, n.º 2 do Regulamento Administrativo n.º 37/2003, ou que, como tal, tivesse legitimidade para utilizar a sepultura em causa, termos em que se propôs o indeferimento do respectivo pedido de junção. O Chefe dos Serviços de Ambiente e Licenciamento do IACM (doravante, designado por entidade recorrida) proferiu despacho no relatório acima mencionado no sentido de indeferir o pedido.

      O recorrente interpôs recurso contencioso para o Tribunal Administrativo, peticionando a anulação do acto recorrido. Alegou o mesmo materialmente que o acto recorrido tinha violado o disposto no art.º 9.º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 37/2003, assim também o princípio do inquisitório consagrado no art.º 86.º do Código do Procedimento Administrativo. No entender do recorrente, ele, agindo no interesse e por conta do seu cônjuge falecido, que é interessado, tem legitimidade para usar a sepultura perpétua em questão. Ademais, segundo ele, sendo bastante remota a aquisição da sepultura, é desculpável ele não conseguir mostrar o respectivo título de aquisição. Por seu turno, o IACM, uma vez que tem em arquivo os dados de inumação sobre a sepultura, pode ter conhecimento de que os inumados passíveis da junção são os pais e irmãos do cônjuge do recorrente. Com base nisso, defendeu o recorrente que a entidade recorrida não tinha cumprido bem o seu dever instrutório, sendo de anular o acto recorrido em virtude da sua ilegalidade.

      O Tribunal Administrativo sublinhou o seguinte: Apesar de a entidade recorrida ter invocado no acto recorrido a previsão do art.º 9.º, al. 2) do Regulamento Administrativo n.º 37/2003, isso não justifica clara e suficientemente a ilegitimidade do recorrente para utilizar a sepultura perpétua em apreço. Até porque este Tribunal também não concorda que o direito de uso de sepultura perpétua dependa meramente da detenção do documento comprovativo do título de propriedade. Todavia, tendo em conta que, em lado algum, o recorrente expôs em que medida o vício supracitado teria prejudicado a validade do acto recorrido, este Tribunal não pode declarar, ex officio, a anulação de tal acto com base no vício mencionado.

      Entendimento do Tribunal Administrativo: O conteúdo essencial do acto impugnado consiste na impossibilidade de provar que o recorrente seja titular do direito relativo à dita sepultura, ou que, como tal, tenha legitimidade para utilizar essa sepultura. De facto, não existem nos autos provas suficientes que permitam afirmar o recorrente ser titular do direito relativo à aludida sepultura perpétua (confrontando a data de aquisição da sepultura registada no IACM e a data de nascimento do recorrente, apercebe-se logo de que este não pode ser o adquirente originário da sepultura, tendo o recorrente também referido nas alegações que tinha morrido o adquirente), razão pela qual ao recorrente, nos termos do art.º 26.º do Regulamento Administrativo n.º 37/2003, não é permitido utilizar a sepultura n.º XX no Cemitério de S. Miguel Arcanjo para inumar o seu cônjuge falecido, já que lhe falta provar a sua titularidade do direito relativo a tal sepultura.

      O recorrente ainda invocou que a entidade recorrida não tinha cumprido bem o seu dever de averiguar os factos. Dir-se-ia que a entidade recorrida, sem dúvida, não se absteve de proceder a outras diligências instrutórias, só que, com os seus arquivos, não chegou a apurar as informações sobre a aquisição da sepultura perpétua. Não estão em falta, porém, os dados sobre a utilização da sepultura (dados pessoais dos inumados e datas de inumação), os quais assumem um carácter meramente instrumental, não servindo, por si só, como prova dos direitos relativos à sepultura perpétua. Como há muito tempo que tiveram lugar o facto respectivo (a data registada de aquisição é 22 de Maio de 1924), atentos os prazos limite gerais no procedimento administrativo, embora a entidade recorrida, na apreciação do requerimento de junção apresentado pelo recorrente, apenas se tenha socorrido aos arquivos, sem determinar oficiosamente demais diligências instrutórias, a decisão impugnada, na óptica deste Tribunal, não violou o princípio do inquisitório preceituado nos art.ºs 59.º e 86.º do Código do Procedimento Administrativo.

      Face ao exposto, o Tribunal Administrativo julgou improcedentes todos os fundamentos invocados pelo recorrente no seu recurso, absolvendo a entidade recorrida dos pedidos formulados por aquele contra esta.

      Cfr. Sentença do Tribunal Administrativo, processo n.º 1028/13-ADM.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

13/06/2014