Situação Geral dos Tribunais

TSI anulou a decisão do IH de exclusão da candidatura por falta de transparência quanto ao critério de examinação

      No Boletim Oficial de 23 de Setembro de 2009, foi publicado pelo Instituto de Habitação o aviso de abertura do concurso para atribuição de habitação social. Em 25 de Setembro de 2009, foram aprovadas pelo Instituto de Habitação as “directivas para examinação dos boletins de candidatura de habitação social”, as quais não foram tornadas públicas. Estipula-se no n.º 3.1.3.2 das directivas: “Os montantes em moeda estrangeira são convertidos em Patacas à taxa de câmbio em vigor no dia da abertura do concurso (será posteriormente comunicada).” No dia 23 de Dezembro de 2009, o requerente apresentou o Boletim de Candidatura para a Atribuição de Habitação Social e os documentos relacionados.Em 2010, o requerente foi notificado pelo Instituto de Habitação de que ele tinha sido excluído da lista de candidatos à atribuição de habitação social, pela razão de que o valor de 1.077,76 euros que auferia mensalmente a título de pensão de aposentação seria convertido em 12.515,00 patacas à taxa de câmbio EUR/MOP da data da abertura do concurso (1:11,6120), tendo ultrapassado o limite de 11.300,00 patacas fixado para o agregado familiar composto por três elementos na Tabela I no n.º 1 do Despacho do Chefe do Executivo n.º 297/2009. O requerente não se conformou com tal decisão, vindo interpor reclamação para o presidente do Instituto de Habitação e, posteriormente, recurso contencioso para o Tribunal Administrativo, os quais, porém, foram ambos rejeitados.

      Ainda inconformado, o requerente interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal de Segunda Instância, invocando os fundamentos a seguir indicados: 1) à luz do disposto no art.º 2.º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 24/2005 (A organização e funcionamento do Instituto de Habitação),o Presidente do Instituto de Habitação é incompetente para “emitir directivas”, visto que o conjunto de regras a observar para examinação dos boletins de candidatura para atribuição de habitação social teria que ser aprovado pelo Chefe do Executivo; 2) a regra emanada do Presidente do Instituto de Habitação que aplicou uma taxa de câmbio fixada por referência à data de abertura do concurso, para efeitos de conversão do rendimento auferido em moeda estrangeira para patacas, não foi devidamente publicitada no aviso de abertura do concurso, daí ser ilegal.

      O Colectivo do Tribunal de Segunda Instância julgou o caso, tendo-se pronunciado sobre a alegada incompetência do Presidente do Instituto de Habitação para fixar, por “directivas”, regras de examinação dos boletins de candidatura no sentido de que as “directivas para examinação dos boletins de candidatura de habitação social” aprovadas pelo Presidente do Instituto de Habitação não correspondem, na verdade, às “directivas” referidas no art.º 2.º, n.º 1 do Regulamento Administrativo n.º 24/2005, mas antes, são meras instruções internas emitidas pelo superior hierárquico para serem cumpridas por seus subordinados, respeitantes ao procedimento do concurso, termos em que o Presidente do Instituto de Habitação não se submete à aprovação ou autorização do Chefe do Executivo.Aliás, também não deixa de ser verdade que é o próprio Despacho do Chefe do Executivo n.º 296/2009 (art.º 3.º) que vem “atribuir poderes” ao Instituto de Habitação para decidir da abertura do concurso para atribuição de habitação social, sempre que tal seja considerada necessária. Sendo assim, não existe o vício de incompetência do Presidente do Instituto de Habitação invocado pelo recorrente.

      No que respeita à violação de lei pelas directivas em questão, entendeu o Tribunal Colectivo que do princípio da imparcialidade consagrado no art.º 7.º do Código do Procedimento Administrativo pode extrair-se, entre outros corolários, a transparência da Administração Pública,no sentido de que esta tem que ter uma postura transparente, por forma a criar no público confiança na sua acção. Embora a maior parte das directivas ora em causa sejam orientações meramente internas ou procedimentais, há outras que podem trazer repercussões para os candidatos, por exemplo a tal regra sobre a fixação da taxa de câmbio por referência ao dia da abertura do concurso, para efeitos de conversão do rendimento dos candidatos em patacas, da qual, tratando-se dum factor determinante para admissão ou exclusão da candidatura, devia ser dado conhecimento prévio ao público.

      Conforme apontou o Tribunal Colectivo, o concurso para atribuição de habitação social não deixa de ser um concurso público, em que se deve cumprir o princípio da estabilidade das peças do procedimento. Ao abrigo deste princípio, uma vez aberto o procedimento, a entidade adjudicante fica, tanto quanto os interessados, vinculada às regras, não lhe sendo dado desconsiderá-las, nem por via de regra, introduzir-lhes alterações. A regra definida pelo Presidente do Instituto de Habitação sobre a fixação da taxa de câmbio por referência à data da abertura do concurso para efeitos de conversão do rendimento auferido em moeda estrangeira para patacas, para ser válida, teria que ser devida e previamente estipulada no respectivo aviso de abertura do concurso. Mas, na realidade, só no dia 25 de Setembro de 2009, isto é, três dias depois de publicado no Boletim Oficial o dito aviso de abertura do concurso, foram as respectivas directivas aprovadas pelo Presidente do Instituto de Habitação, sem que tenham sido devidamente publicitadas. Nesta conformidade, a aplicação unilateral daquela regra pela entidade recorrida e a decisão de exclusão do recorrente da lista de candidatos  implica a violação do disposto no art.º 5.º, nº 1 do Regulamento de Candidatura para Atribuição de Habitação Social, sendo de anular tal acto administrativo.

      Pelas razões acima expostas, acordaram em conceder provimento ao recurso contencioso, revogar a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e, consequentemente, anular o acto administrativo posto em crise.

      Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 407/2012. 

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

13/11/2014