Situação Geral dos Tribunais

Arguido foi condenado a 3 anos e 9 meses de prisão por abuso de confiança em valor consideravelmente elevado

      Em Outubro de 2012, B (ofendido), residente do Interior da China, conheceu A (ora recorrente), D e E na cidade de Shenzhen através da apresentação do seu amigo C. Como o ofendido e C mostraram interesse em virem jogar a Macau, exprimiu o recorrente que, se viessem, seriam emprestados a cada um deles 500.000 dólares de HK em fichas para jogar bacará, sem juros ou demais condições, e que, no caso de perderem o dinheiro, teriam um mês para liquidar os empréstimos. No dia 3 de Novembro de 2012, à noite, o ofendido e C, em companhia do recorrente, D e E, chegaram a Macau de navio, tendo o recorrente, a seguir, levado todos ao Hotel XX e alojado o ofendido e E num mesmo quarto. Tendo deixado as bagagens no Hotel, o recorrente e D levaram o ofendido, C e E a um quarto dum clube de VIP, onde o recorrente deu ao ofendido fichas no valor de 500.000 dólares de HK para ele jogar. Até 5 de Novembro de 2012, por volta das 7h, o ofendido ganhou efectivamente 3.460.000 dólares de HK em fichas. Por ter jogado três dias seguidos, o ofendido decidiu descansar um pouco antes de voltar a jogar, altura em que o recorrente se ofereceu para guardar as fichas ganhas por aquele. Pensando que o recorrente merecia confiança, o ofendido concordou em entregar as fichas à sua guarda e regressou, depois, ao Hotel com C para descansar. Quando o ofendido chegou ao quarto do Hotel, E estava lá a descansar, mas veio a sair sozinho do quarto depois de ter atendido uma chamada. Um pouco mais tarde, E ligou para o ofendido, dizendo que o recorrente e os outros tinham que regressar imediatamente ao Interior da China por terem um assunto urgente a tratar, e pedindo que o ofendido e C saíssem do Hotel eles próprios. O ofendido, como tinha confiança no recorrente e nos outros, continuou a ficar no quarto a descansar. Após ter voltado para o Interior da China, o ofendido contactou o recorrente várias vezes, mas o recorrente usou diferentes pretextos para adiar, até que, em 30 de Novembro de 2012, passou a declarar que nunca tinha recebido do ofendido quaisquer fichas, pedindo-lhe para não o contactar. Depois disso, já não conseguiu o ofendido entrar em contacto com o recorrente e E. No dia 3 de Dezembro de 2012, o ofendido dirigiu-se à Polícia Judiciária de Macau para participar o facto e pedir ajuda. No dia 18 de Dezembro de 2012, o recorrente foi interceptado por guardas da Polícia de Segurança Pública aquando da entrada no Território.

      Em 28 de Janeiro de 2014, o recorrente A foi condenado pelo Tribunal Judicial de Base, pela prática de um crime de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado p. e p. pelo Código Penal, na pena de 3 anos e 9 meses de prisão. Não se conformando, o recorrente recorreu para o Tribunal de Segunda Instância, alegando que o Tribunal a quo violou o disposto nos art.ºs 192.º, 40.º e 65.º do Código Penal, bem como os princípios da adequação e da proporcionalidade, devendo passar a ser aplicada uma pena inferior a 3 anos e 9 meses de prisão.

      Conforme entendeu o Colectivo do Tribunal de Segunda Instância, o crime de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado, p. e p. pelo Código Penal e ora cometido pelo recorrente, é punível com pena de prisão de 1 a 8 anos. O recorrente, sendo embora delinquente primário - circunstância que depõe a favor dele, não mostrou em juízo arrependimento pela sua conduta criminosa. O recorrente não é residente de Macau, tem emprego e rendimento legítimos. Mas, enquanto permanecia em Macau na qualidade de visitante, agiu de forma livre, consciente e dolosa, ao apropriar-se do dinheiro do ofendido, donde decorre que é bastante elevado o seu grau de dolo. Por outro lado, na ponderação da necessidade de protecção dos bens jurídicos e da confiança da comunidade, não se deve perder de vista que o abuso de confiança em valor consideravelmente elevado se traduz num crime de ocorrência frequente na sociedade de hoje, estando bem activas as actividades associadas a este crime, as quais não só ofendem os bens patrimoniais das vítimas respectivas, como também prejudica a imagem do Território, o que faz realçar a exigência urgente da prevenção deste tipo de crime.

      Tendo analisado os factos respectivos e todas as circunstâncias que depõem a favor ou contra o recorrente, particularmente o valor do dinheiro envolvido no caso vertente, entendeu o Tribunal de Segunda Instância que a pena de 3 anos e 9 meses de prisão aplicada pelo Tribunal a quo ao recorrente, pela prática de um crime de abuso de confiança em valor consideravelmente elevado, e correspondente a cerca de três sétimos do limite máximo da moldura penal de tal crime, está em conformidade com as exigências de prevenção geral e especial, não parecendo excessivamente severa. Pelo exposto, acordaram em julgar improcedente o recurso interposto pelo recorrente e, em consequência, manter a decisão recorrida.

      Cfr. Acórdão do Tribunal de Segunda Instância, processo n.º 179/2014.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

25/11/2014