Situação Geral dos Tribunais

A decisão proferida em 2ª instância sobre o caso de associação criminosa de auxílio à imigração clandestina confirmou a condenação de seis homens a penas de 4 a 8 anos de prisão

        Em Junho de 2013, a Polícia Judiciária resolveu um caso de auxílio à imigração clandestina, tendo detido dez pessoas. Após investigação, ficou apurado que desde finais de 2012 até ao início de 2013, seis dos indivíduos acima referidos (A, B, C, D, E e F) e os fugitivos K e L, entre outros, formaram uma associação criminosa dedicada ao auxílio à imigração clandestina, nomeadamente transportando, a título oneroso, para Macau indivíduos do Interior da China que quisessem vir jogar, e buscando-os aquando da saída do Território. A divisão das tarefas entre os membros desta associação criminosa é bastante clara: K, A e B eram chefes da associação criminosa, responsáveis pelo planeamento e coordenação da actividade global de imigração clandestina; L era responsável por conduzir a lancha rápida, transportando os imigrantes clandestinos de Zhuhai para Macau para eles entrarem no Território por via marítima; C era responsável por observar a situação de patrulhamento diurno da Polícia na Taipa e em Coloane, organizar os imigrantes clandestinos em locais retirados após o desembarque à espera do veículo que os buscaria; D é responsável pela coordenação do uso de veículos e pela angariação de novos membros como motoristas; E e F, por sua vez, foram angariados recentemente como motoristas na associação criminosa, encarregando-se de buscar e transportar os imigrantes clandestinos. No período compreendido entre 20 de Março e 27 de Junho de 2013, a dita associação criminosa realizou seis acções, tendo auxiliado diversas pessoas a entrarem ou saírem ilegalmente de Macau.

        Em Julho de 2014, por acórdão do Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Base, foram os arguidos A, B, C, D, E e F condenados pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de associação criminosa, na pena (individual) de 4 anos e 6 meses de prisão no caso de A, B, C, e na pena (individual) de 3 anos e 6 meses de prisão no caso de D, E e F; A e C foram condenados pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de quatro crimes de auxílio, na pena (individual) de 5 anos e 6 meses de prisão por cada crime praticado; D, E e F foram condenados pela prática, em co-autoria material e na forma consumada, de um crime de auxílio, na pena (individual) de 5 anos e 6 meses de prisão. Em cúmulo jurídico, A, B, C, D, E e F foram condenados respectivamente nas penas de prisão de 8 anos, de 4 anos e 6 meses, de 8 anos, de 6 anos, de 6 anos e de 6 anos. Inconformados, todos recorreram para o Tribunal de Segunda Instância.

        O Tribunal de Segunda Instância pronunciou-se sobre os fundamentos invocados pelos recorrentes um após outro.

        Em primeiro lugar, em relação à renovação da prova peticionada por A, C e E, salientou o Tribunal Colectivo que, como os recorrentes não indicaram as provas que entendiam deverem ser renovadas, nem referiram os factos que cada uma delas se destinava a esclarecer, é manifesta a improcedência de tal pretensão.

        Em segundo lugar, no concernente ao vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada assacado por D e E, e ao vício de erro notório na apreciação da prova imputado por A, B, C, E e F, conforme o Tribunal Colectivo, o Tribunal a quo formou a sua convicção após uma análise global de toda a prova produzida e existente nos autos, tendo consultado os autos compostos por 9 volumes, com quase 2000 páginas e outros 7 apensos, e ouvido mais de 20 testemunhas.Com efeito, o Tribunal a quo apreciou a prova em total respeito ao estatuído no art.º 114º do Código de Processo Penal, não tendo violado nenhuma regra sobre o valor das provas legais e tarifadas, regra de experiência ou legis artis, não tendo igualmente extraído nenhuma conclusão ilógica, daí ser de improceder este fundamento.

        Acerca da questão da violação dos art.º 339.º, n.º 1 e do art.º 340.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, suscitada por D e F ao alegarem que, em audiência de julgamento, e por iniciativa do Ministério Público, foi alterada a qualificação jurídico-penal inicialmente efectuada, com aditamento de factos, o Tribunal Colectivo apontou que, na sessão da audiência de julgamento em que o Ministério Público requereu a alteração da qualificação jurídico-penal inicialmente efectuada, pelo Mm.º Juiz Presidente foi concedida a palavra a todos os arguidos para, querendo, se pronunciarem, certo sendo que os Ilustres Defensores de D e F declararam “nada ter a opor”. Foi por isso que o julgamento prosseguiu com as requeridas alterações. Assim sendo, agiram contra o princípio da boa fé e da lealdade processual ao voltarem a levantar tal questão em sede de recurso.

        Por último, no que diz respeito à qualificação jurídico-penal e à medida da pena, conforme inculcou o Tribunal Colectivo, A, B, C, D, E, F e K, L, entre outras pessoas, constituíram um grupo com certa duração (desde início de 2012 até meados de 2013), com estrutura organizativa e clara divisão de tarefas entre os membros, tendo como escopo adquirir interesses ilegítimos através do auxílio para a entrada e saída de imigrantes clandestinos, pelo que, evidentemente, estão verificados todos os elementos integrantes do crime de associação criminosa. Para além disso, de harmonia com os factos dados como assentes, J, I, H e G, respectivamente sob a organização dos arguidos A, C, F, dos arguidos A, C, D, dos arguidos A, C, E e dos arguidos A, C, entraram ilegalmente em Macau por via marítima (de lancha rápida), respectivamente em 19 de Junho de 2013, em 19 de Junho de 2013, em 23 de Junho de 2013 e em 25 de Junho de 2013, e pagaram aos arguidos MOP$7.000, MOP$5.500, MOP$7.000 e MOP$6.000 a título de retribuição. Nestes termos, a conduta dos arguidos já preenche os elementos constitutivos do crime de auxílio previsto no art.º 14.º, n.º 2 da Lei n.º 6/2004. Quanto a A e C, o seu comportamento não consubstancia um crime continuado, visto que cada operação deles exigia um “novo desígnio”, com “novos arranjos”, “acertos” e “preparativos”, não existindo, portanto, a necessária “situação exterior” que tornasse diminuída a culpa dos arguidos. Nesta conformidade, nenhuma censura merece a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Base que condenou cada um de A, B, C, D, E e F pela prática de um crime de associação criminosa, cada um de A e C pela prática de quatro crimes de auxílio, e cada um de D, E e F pela prática de um crime de auxílio.

        Ponderando as molduras penais fixadas para o crime de associação criminosa e o crime de auxílio (3 a 10 anos de prisão e 5 a 8 anos de prisão, respectivamente), a pena de 5 anos e 6 meses de prisão aplicada a A, B e C pela prática do crime de associação criminosa, a pena de 3 anos e 6 meses de prisão aplicada a D, E e F pela prática do crime de associação criminosa, e a pena de 5 anos e 6 meses de prisão aplicada a A, C, D, F e E por cada crime de auxílio praticado, apresentam-se próximas do respectivo limite mínimo das penas aplicáveis, não existindo margem para qualquer redução. Em sede de cúmulo jurídico, há que dizer que as penas únicas, atentos os critérios para a sua determinação estatuídos no art.º 71º do Código Penal, se mostram bastante benevolentes, não devendo ser atenuadas.

        Face ao exposto, acordaram em negar provimento aos recursos interpostos pelos recorrentes, mantendo-se a decisão recorrida.

        Vide o Acórdão do TSI, processo n.º 531/2014.

  

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

27/03/2015