Situação Geral dos Tribunais

Não é admitida prova testemunhal no procedimento de suspensão de eficácia de actos administrativos

      A é residente de Hong Kong e foi colocada em Macau por uma Companhia de Hong Kong, passando a exercer funções de coordenadora dum restaurante. A seguir, por A ter prestado trabalho sem que estivesse autorizada, a Direcção dos Serviços para os Assuntos Laborais aplicou-lhe multa com fundamento na violação do disposto na alínea 1) do n.º 5 do art.º 32º da Lei n.º 21/2009. Por esta razão, o Comandante do Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau revogou, por despacho, a autorização de permanência em Macau de A. Inconformada, A interpôs recurso hierárquico necessário para o Secretário para a Segurança de Macau, que o rejeitou por despacho de 6 de Janeiro de 2015.

      A requereu junto do Tribunal de Segunda Instância providência cautelar de suspensão da eficácia do supra referido despacho do Secretário para a Segurança, alegando, como fundamento, que a execução imediata do despacho lhe causaria prejuízos de difícil reparação, incluindo: 1) A requerente é agora coordenadora de restaurante. A empresa onde trabalha irá abrir mais três restaurantes em Macau, altura em que a requerente irá ser promovida a gerente e até a gerente distrital. A revogação da autorização de permanência causar-lhe-á a perda dessas oportunidades; 2) Neste momento a requerente coabita com um residente de Macau e pretende casar com ele. A perda do namorado causar-lhe-á um choque profundo; 3) A revogação da autorização de permanência fará com que ela não consiga ganhar dinheiro para cuidar do irmão mais novo; 4) A requerente gosta mais da sua vida em Macau; 5) A revogação da autorização de permanência fará com que ela não consiga cuidar do animal de estimação que uma amiga lhe deixou há três anos. A fim de provar os factos acima referidos a requerente também ofereceu três testemunhas, pedindo que estas fossem ouvidas pelo Tribunal.

      Por acórdão de 12 de Fevereiro de 2015, o Tribunal de Segunda Instânciaindeferiu o requerimento de ouvir as testemunhas, e entendeu que não se verificava o requisito de que a execução do acto causaria previsivelmente prejuízos de difícil reparação para a requerente, razão pela qual indeferiu o pedido da suspensão da eficácia do acto administrativo.

      Inconformada, A interpôs recurso para o Tribunal de Última Instância.

      O Tribunal de Última Instância conheceu da causa. Em primeiro lugar, o Colectivo entendeu que é correcta a prática do Tribunal de Segunda Instância de não ter ouvido as testemunhas. Uma vez que no procedimento de suspensão de eficácia de actos administrativos, apesar de o legislador não dispor directamente o afastamento de prova por testemunhas, ele afastou tal prova indirectamente através de estabelecer um processamento donde resultava não haver uma fase de produção de prova testemunhal, designadamente, prevendo apenas prova documental (o artigo 123.º, n.º 3 do Código do Procedimento Administrativo). Como o mero requerimento da providência e consequente citação do órgão administrativo impedem, em regra, este de iniciar ou prosseguir a execução do acto, então o procedimento deve ser célere. Ora, a produção de prova testemunhal é incompatível com essa celeridade processual. Por isso, o legislador estabeleceu tal processamento donde resultava não haver a fase de produção de prova testemunhal. Isso não viola de forma alguma as disposições da Lei Básica. Acresce que a decisão da providência é provisória. Daí não de poder dizer que a limitação à prova documental fira, gravemente, os interesses da Justiça.

      No que tange aos prejuízos de difícil reparação invocados pela recorrente. Segundo o Colectivo, quanto à oportunidade de promoção, não fez a recorrente qualquer prova de que a empresa onde trabalha iria abrir mais três restaurantes em Macau, ou que a recorrente, mera funcionária de um restaurante, iria ser promovida a gerente e até a gerente distrital; quanto à separação do namorado,se, como a recorrente alegou, a relação com o namorado é tão forte que planeiam casar, o regresso dela a Hong Kong não provocaria a ruptura da relação; Quanto ao animal de estimação, o Tribunal de Segunda Instância já anotou que a recorrente pode levar o cão para Hong Kong, mas a mesma não respondeu a esse argumento. Além de que no momento em que aceitou ficar com o cão ela tinha que ter equacionado um destino a dar ao animal no caso de a sua permanência em Macau não se eternizar. Nessa ocasião também deveria ter ponderado as consequências da separação do seu animal de estimação para a sua saúde psíquica; no que diz respeito à vontade e ao gosto de viver em Macau, segundo o Colectivo, ainda que tal vontade e tal gosto fossem reais, sempre tal situação era transitória. Se lhe fosse dada razão neste recurso contencioso, regressaria a Macau. Se perdesse o recurso contencioso, a questão deixaria de se pôr. Pelo que não se verificaram prejuízos de difícil reparação.

      Face ao exposto, o Colectivo decidiu negar provimento ao recurso jurisdicional.

      Cfr. acórdão do Tribunal de Última Instância, processo n.º 23/2015.

 

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

07/05/2015