Situação Geral dos Tribunais

TSI decreta o divórcio entre as partes, considerando que o simples facto de o autor intentar a acção de divórcio demonstra, por si só, o propósito de não restabelecer a comunhão de vida

      A (marido) e B (mulher) contraíram casamento em Macau no dia 15 de Julho de 2004. Desde 2005, A e B deixaram de viver juntos. Em 14 de Fevereiro de 2011, A intentou acção de divórcio no Tribunal Judicial de Base, pedindo que fosse decretado o divórcio entre eles. B não contestou.

      Após analisadas as circunstâncias do caso, o Tribunal Judicial de Base (TJB) apontou que, nos termos do art.º 1637.º, al. a), conjugado com o art.º 1638.º, n.º 1, ambos do Código Civil, em acção de divórcio com fundamento na separação de facto dos cônjuges, para o tribunal decretar o divórcio,não basta a separação de facto por dois anos, sendo também necessário o propósito de não restabelecer a vida em comum perdurar 2 anos consecutivos. No caso dos autos, só se pode dizer com certeza que, no momento da propositura da acção de divórcio, o autor já tinha o propósito de não restabelecer a vida em comum, mas não se consegue provar a data concreta em que se formou tal propósito. Neste sentido, não estão preenchidos os requisitos do divórcio, julgando-se improcedente a acção proposta pelo autor.

      O autor, discordando do assim decidido, interpôs recurso.

      O Tribunal de Segunda Instância (TSI) julgou o caso, manifestando o seguinte: Tal como indicou o TJB, o decretamento do divórcio por separação de facto pressupõe o preenchimento de dois elementos, um elemento objectivo (falta de comunhão de vida entre os cônjuges) e um elemento subjectivo (haver da parte de ambos ou apenas de um deles um propósito de não restabelecer a comunhão de vida matrimonial). No entanto, não se deve ser demasiado exigente na comprovação do elemento subjectivo, traduzido numa matéria de facto do foro íntimo, sentimental, afectiva. Porque, muitas vezes, a vontade de não restabelecer a comunhão de vida matrimonial se vai cimentando ao longo do tempo, e dificilmente se pode determinar um momento exacto para a sua formação. É verdade que a matéria fáctica nos presentes autos é muito curta, não se mencionando nela quando o autor formou o propósito de não restabelecer a comunhão de vida matrimonial entre ele e a ré. Mas nada impede que o TSI, assento final da fixação da matéria de facto, possa, com base nos factos provados, lançar mão dos juízos de experiência, ou das considerações de probabilidade/razoabilidade para dar como provados outros factos, ou emitir juízos de valor sobre a matéria de facto dada como provada, alterando os que foram emitidos pela 1ª Instância. Na causa vertente, tendo o autor proposto acção de divórcio, a ré tomou uma atitude totalmente passiva, pois nada veio alegar ou contrapor ao afirmado e ao desiderato formulado pelo autor. Tudo conjugado, não será difícil compreender que a separação de facto dos cônjuges que se prolongou, à presente data, por cerca de nove anos não terá deixado de estar imbuída do elemento subjectivo pertinente. Para além disso, o simples facto de o autor intentar a acção de divórcio demonstra, só por si, o propósito de não reatamento da sociedade conjugal.

      Por último, se estas razões não bastassem, sempre se pode dizer que, passados mais de dois anos desde a propositura da acção de divórcio (14 de Fevereiro de 2011) até ao presente momento, já está preenchido o limite mínimo de tempo exigido pelo elemento subjectivo, visto o princípio da actualidade da decisão, consagrado no art.º 566.º do Código de Processo Civil.

      Nos termos acima expendidos, o TSI julgou procedente o recurso, revogando a sentença do TJB e, consequentemente, decretando o divórcio entre o autor e a ré.

      Cfr. Acórdão do TSI, processo n.º 793/2012.

Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância

05/06/2015