Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 30/09/2021 674/2021 Recurso em processo penal
    • Assunto

      – transporte de passageiros em automóveis ligeiros de aluguer
      – táxi como automóvel ligeiro destinado ao transporte público
      – aparelho de gravação de som e imagem instalado em táxi
      – utilizar táxi para fins não relacionados com o serviço de táxi
      – art.o 2.o, alínea 1), da Lei n.o 3/2019
      – art.o 23.o, n.o 1, alínea 14), da Lei n.o 3/2019
      – art.o 25.o, n.o 4, da Lei n.o 3/2019
      – prática de crime no exercício de condução em táxi
      – aplicabilidade do art.o 8.o do Decreto-Lei n.o 52/99/M
      – utilização de imagens e sons captados pelo aparelho de gravação
      – consentimento da pessoa titular de imagens e sons
      – investigação criminal
      – finalidades de segurança ou de justiça
      – art.o 80.o, n.os 2 e 5, do Código Civil
      – art.o 113.o, n.o 3, do Código de Processo Penal
      – art.o 32º , n.os 1 e 2, da Lei n.o 3/2019
      – art.o 30.o, n.o 1, do Código Penal
      – art.o 191.o do Código Penal
      – crimes de gravações e fotografias ilícitas
      – carácter lícito da gravação
      – carácter lícito de valoração pelo tribunal do conteúdo da gravação
      – formação da livre convicção sobre os factos em processo penal

      Sumário

      1. Nos termos no art.o 2.o, alínea 1), da Lei n.o 3/2019 (Regime jurídico do transporte de passageiros em automóveis ligeiros de aluguer) (doravante abreviado como Regime Jurídico), “Táxi” é automóvel ligeiro destinado ao transporte público, que está equipado com taxímetro e outros equipamentos legalmente previstos. E um desses equipamentos é aparelho de gravação de som e imagem de marca e modelo aprovados pela Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego (DSAT), cuja instalação, manutenção, aferição, calibração e remoção só podem ser efectuadas pelas entidades autorizadas para o efeito pela DSAT (cfr. O art.o 12.o, n.o 1, alínea 3), e n.o 2, do Regime Jurídico).
      2. É vedado ao condutor de táxi utilizar o táxi para fins não relacionados com o serviço de transporte de passageiros em táxi. E cabe ao Corpo de Polícia de Segurança Pública (CPSP) a fiscalização do cumprimento, inclusivamente, deste preceito legal cogente. (Cfr. O art.o 23.o, n.o 1, alínea 14), e o art.o 25.o, n.o 4, do Regime Jurídico, respectivamente).
      3. A violação da alínea 14) do n.o 1 do art.o 23.o do Regime Jurídico constitui infracção administrativa punível com multa de trinta mil patacas (cfr. O n.o 4 do mesmo art.o 23.o), sem prejuízo da aplicabilidade da seguinte norma do art.o 8.o, com a epígrafe de “Concurso de infracções”, do Decreto-Lei n.o 52/99/M (Regime geral das infracções administrativas e respectivo procedimento) a casos de prática de crime no exercício de condução em táxi.
      4. O tratamento e utilização, para efeitos de investigação criminal – efeitos estes integrados indubitavelmente no âmbito de exigências ou finalidades de segurança ou de justiça – de imagens e sons captados pelo aparelho de gravação instalado dentro de táxi não carecem do consentimento da própria pessoa titular de imagens e/ou sons em causa, por força precisamente do disposto no art.o 80.o, n.os 2 e 5, do Código Civil, regras jurídicas estas que prejudicam evidentemente a tese do arguido taxista recorrente segundo a qual o tribunal recorrido, para efeitos de formação da sua livre convicção sobre os factos no presente processo penal, terá valorado ilegalmente, em violação do art.o 113.o, n.o 3, do Código de Processo Penal, o conteúdo da gravação sonora do aparelho instalado dentro do táxi então por ele conduzido.
      5. As normas ínsitas nos n.os 1 e 2 do art.o 32º do Regime Jurídico não têm a virtude de afastar a aplicabilidade das ditas regras dos n.os 2 e 5 do art.o 80.o do Código Civil (até porque na letra desses n.os 1 e 2 do art.o 32.o do Regime Jurídico nem tenham sido utilizadas pelo seu Legislador expressões tais como “só podem ser…” e “só tem competência…”, respectivamente).
      6. As mesmas regras dos n.os 2 e 5 do art.o 80.o do Código Civil, como relevam logicamente nos termos e para os efeitos do art.o 30.o, n.o 1, do Código Penal, afastam a possibilidade de verificação de crimes de gravações e fotografias ilícitas previstos no art.o 191.o do Código Penal, em toda a situação em que algum passageiro de táxi ou até algum condutor de táxi se opuser à gravação das suas imagens e/ou sons pelo aparelho de gravação instalado dentro de táxi.
      7. Do acima exposto resulta demonstrado o carácter lícito do tratamento e utilização, para efeitos de investigação criminal, do conteúdo de gravação feita pelo aparelho instalado dentro de táxi (cfr. O disposto no art.o 112.o do Código de Processo Penal), carácter lícito este que garante também o carácter lícito de valoração, pelo tribunal recorrido, do conteúdo da gravação em causa, para efeitos de formação da sua livre convicção sobre os factos constitutivos do objecto probando do subjacente processo penal.

       
      • Votação : Com declaração de voto
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dra. Tam Hio Wa
      •   Dra. Chao Im Peng