Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 19/05/2022 173/2022 Recurso de decisões jurisdicionais em matéria administrativa, fiscal e aduaneira
    • Assunto

      - Diferença entre a autorização para o exercício da medicina na RAEM e a para a utilização das técnicas de procriação medicamente assistida, no âmbito do Decreto-Lei n.º 8/99/M, de 15 de Março

      Sumário

      I – Uma vez que as Recorrentes concluíram o internato complementar de obstetrícia e ginecologia no Centro Hospital Conde de S. Januário e são médicas inscritas nos Serviços de Saúde, estão autorizadas a exercer medicina na RAEM. Quando, em 16 de Dezembro de 2016, as Recorrentes requereram aos Serviços de Saúde a autorização para a utilização das técnicas de procriação medicamente assistida, o que elas pediram foi a autorização para a prática de determinados actos médicos, ou seja, aqueles que implicam o recurso a técnicas de procriação medicamente assistida.
      II – Tais actos podem ser enquadrados num campo específico do saber médico que é a chamada medicina de reprodução, a qual, por sua vez, e à luz do enquadramento legal vigente à data da prática dos actos administrativos resultante do Decreto-Lei n.º 8/99/M, de 15 de Março, não constitui uma especialidade médica, mas apenas, quando muito, uma subespecialidade da especialidade da ginecologia/obstetrícia.
      III - Uma iniciativa procedimental das Recorrentes que não reclamava por parte da Administração um verdadeiro acto autorizativo, uma vez que a lei não prevê a competência da Administração para conceder autorização a um médico já licenciado para exercer a profissão para a prática de específicos actos médicos, nem isso, aliás, faria qualquer sentido. Bem vistas as coisas, o acto contenciosamente recorrido não constitui um acto de indeferimento de uma autorização, mas sim consubstancia uma proibição antecipada da prática de determinados actos médicos por parte das Recorrentes.
      IV – Nesta matéria, importa distinguir duas realidades diferentes: uma é a actividade de autorização do exercício privado da profissão médica, que é feita ao abrigo das normas do n.º 1 do artigo 5.º e do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 84/90/M; outra, diferente, é a actividade fiscalização do concreto exercício dessa profissão, que pode resultar em actos de proibição, em regra repressiva ou sucessiva, mas podendo, como no caso em apreço, ser preventiva, cujo fundamento legal seguramente se encontra em outras normas legais que não aquelas antes citadas e que, erradamente, serviram de fundamento jurídico ao acto contenciosamente recorrido.
      V - No caso, só esta segunda actividade é que está em causa, pela simples razão de que, por um lado, as Recorrentes já são titulares de licença para o exercício privado da profissão médica, que, potencialmente, as autoriza a praticar todo o tipo de actos médicos, em especial na área da especialidade da ginecologia/obstetrícia e, por outro lado, não está em causa a ampliação dessa licença de modo a abranger outra especialidade médica para além da já licenciada, pelo que, contrariamente ao doutamente decidido pelo Meritíssimo Juiz a quo, a Administração tenha incorrido em erro de direito ao fundar a prática do acto nas normas do n.º 1 do artigo 5.º e do n.º 1 e da alínea a) do n.º 2 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 84/90/M, o que se impõe à revogação da sentença recorrida e à anulação do acto administrativo ora posto em crise.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Fong Man Chong
      • Juizes adjuntos : Dr. Ho Wai Neng
      •   Dr. Tong Hio Fong