Acórdãos

Tribunal de Última Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 30/07/2021 104/2021 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “associação criminosa”.
      Fundamentação da decisão da matéria de facto.
      Insuficiência da matéria de facto provada para a decisão.
      Elementos típicos.

      Sumário

      1. A nova redacção do art. 355°, n.° 2 do C.P.P.M. “reforçou” o dever de fundamentação, exigindo (agora) o “exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do Tribunal”, suficiente (já) não sendo uma (mera) “enumeração dos elementos probatórios” a que se atendeu com a afirmação (conclusiva) de que se lhes deu crédito, evidente sendo assim que o Tribunal deve, (na medida do possível, e ainda que de forma concisa), expor também os “motivos” que o levaram a atribuir relevo e/ou crédito aos elementos probatórios de que se serviu para decidir a matéria de facto da forma que fez.

      Porém, se é certo que com a nova redacção do art. 355°, n.° 2 do C.P.P.M. se pretendeu acabar com a chamada “fundamentação tabelar”, igualmente certo é que com a mesma não se quis introduzir a exigência de uma fundamentação “exaustiva” relativamente a todos os “pontos”, “pormenores” ou “circunstâncias” da matéria de facto.

      Não se pode esquecer que o comando em questão faz, (continua a fazer), referência a “uma exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa…”, não se podendo igualmente olvidar que a “fundamentação do Tribunal” não é o segmento da sentença ou acórdão com o qual se tenta dar resposta a toda e qualquer (eventual e possível) questão (ou dúvida) que os sujeitos processuais possam (ou venham a) ter, (esgotando-se, em absoluto, o tema sobre eventuais e hipotéticas questões), destinando-se, antes, a expor e a permitir conhecer os “motivos que levaram o Tribunal a decidir (a matéria de facto) da forma como decidiu”, (acolhendo, ou não, uma ou mais versões apresentadas e discutidas em audiência de julgamento), devendo-se ter – sempre – em conta os “ingredientes do caso concreto”.

      2. O vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” apenas ocorre “quando o Tribunal não se pronuncia sobre toda a matéria objecto do processo”.

      Isto é, o aludido vício apenas existe se houver “omissão de pronúncia” sobre “factos relevantes”, e os “factos provados” não permitirem uma boa e sã aplicação do direito ao caso submetido a julgamento.

      3. Em termos gerais, são três os elementos essenciais constitutivos da “associação criminosa”:
      - o elemento organizativo: uma recíproca conjugação de vontades, em que os elementos integrantes dão a sua adesão expressa ou tácita com vista à finalidade colectiva, ainda que esses elementos nunca se tenham encontrado nem se conheçam;
      - o elemento de estabilidade associativa: a intenção de manter, no tempo, uma actividade criminosa estável, mesmo que concretamente assim não venha a acontecer;
      - o elemento da finalidade criminosa: a conjugação de vontades visando a obtenção de vantagens ilícitas ou a prática de crimes perfeitamente identificados na lei.

      Daqui resulta, pois, que haverá “associação criminosa” sempre que se configure uma união de vontades, ainda que sem organização ou acordo prévio, com o propósito de, estável e de modo mais ou menos duradouro, se praticarem actos criminosos de certo tipo, ficando assim naturalmente arredado do conceito o mero ajuntamento, ou seja, a simples reunião acidental e precária de pessoas, que sem a mínima estabilidade associativa e sedimentação, praticam uma ou mais acções criminosas.

      Contudo, não é necessário que possua qualquer grau de “organização específica”, ou que provado esteja que ela tenha uma “sede” ou um lugar determinado para “reunião”, não sendo mesmo essencial que os seus membros se reúnam ou que se conheçam.

      Resultado

      - Negado provimento ao recurso.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dra. Song Man Lei