Tribunal de Segunda Instância
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Ho Wai Neng
- Dr. José Cândido de Pinho
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
- Dra. Tam Hio Wa
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
- Dra. Tam Hio Wa
- Votação : Com declaração de voto vencido
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
- Dra. Tam Hio Wa
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Ho Wai Neng
- Juizes adjuntos : Dr. José Cândido de Pinho
- Dr. Lai Kin Hong
- Erro de julgamento
- Contrato de trabalho de não residentes
- Regime mais favorável decorrente de um contrato celebrado entre e empregador e uma empresa agenciadora de mão de obra
- Contrato a favor de terceiro
1. Não há erro de julgamento nem se devem quesitar factos não alegados na contestação quando a ré empregadora reconhece e identifica que o trabalhador foi contratado ao abrigo de um determinado contrato, pretendendo sem justificação e sem razão para qualquer superveniência vir depois dar o dito por não dito e dizer que afinal o trabalhador foi contratado ao abrigo de outro contrato, para mais se resulta até que esse contrato respeita a uma realidade diferente.
2. É de aplicar a uma dada relação de trabalho, para além do regulado no contrato celebrado directamente entre o empregador e o trabalhador, o regime legal mais favorável ao trabalhador e que decorre de um contrato celebrado entre o empregador e uma Sociedade prestadora de serviços, ao abrigo do qual o trabalhador foi contratado e ao abrigo do qual, enquanto não residente, foi autorizado a trabalhar em Macau, regime esse devidamente enquadrado por uma previsão normativa constante do Despacho 12/GM/88, de 1 de Fevereiro.
3. A Lei de Bases da Política de Emprego e dos Direitos Laborais, Lei n.º 4/98/M, de 27 de Julho, publicada no BO de Macau n.º 30, I série, no artigo 9.° admite a contratação de trabalhadores não residentes quando se verifiquem determinados pressupostos, estatuindo que essa contratação fica dependente de uma autorização administrativa a conceder individualmente a cada unidade produtiva.
4. O Despacho 12/GM/88 cuida tão somente do procedimento administrativo conducente à obtenção de autorização para a contratação de trabalhadores não residentes e não do conteúdo concreto da relação laboral a estabelecer entre os trabalhadores não residentes e as respectivas entidades patronais
5. O trabalhador só foi contratado porque a Administração autorizou a celebração daquele contrato, devidamente enquadrado por um outro contrato que devia ser celebrado com uma empresa fornecedora de mão-de-obra e onde seriam definidas as condições mínimas da contratação, como flui do artigo 9º, d), d.2) do aludido despacho 12/GM/88.
6. Estamos perante um contrato a favor de terceiro quando, por meio de um contrato, é atribuído um benefício a um terceiro, a ele estranho, que adquire um direito próprio a essa vantagem.
7. Esta noção está plasmada no artigo 437º do CC, aí se delimitando o objecto desse benefício que se pode traduzir numa prestação ou ainda numa remissão de dívidas, numa cedência de créditos ou na constituição, transmissão ou extinção de direitos reais.
8. Será o que acontece quando um dado empregador assume o compromisso perante outrem de celebrar um contrato com um trabalhador, terceiro em relação a esse primitivo contrato, vinculando-se a determinadas estipulações e condições laborais.
9. O facto de a empregadora ter assumido a obrigação de dar trabalho, tal não é incompatível com uma prestação de contratar, relevando aí a modalidade de uma prestação de facere.
10. Nada obsta que da relação entre o promitente e o terceiro (agência prestadora de serviços e mão de obra), para além do assumido nesse contrato entre o promitente e o promissário, nasçam outras obrigações como decorrentes de um outro contrato que seja celebrado entre o promitente (Ré, empregadora) e o terceiro (A., trabalhador).
Crime de “receptação”.
Pena.
Suspensão da execução.
1. A “confissão parcial dos factos”, para além de ter pouco valor atenuativo, é incompatível com um alegado “arrependimento activo”, que, por natureza, implica uma “confissão total e sem reservas”.
2. No crime de “receptação”, o valor dos objectos obtidos por via de comportamento integrador desse ilícito não faz parte dos elementos do tipo, para efeito de qualificação da infracção.
Elemento do tipo é a intenção de obter vantagem patrimonial para si ou para outra pessoa, intenção que não significa que a aquisição da coisa tenha de ser feita por preço inferior ao do seu valor real.
O desvalor do momento da intenção não se encontra em querer adquirir um objecto por preço inferior ao seu valor –– ambição lícita a todo o contratante –– antes em querer adquiri-lo com a consciência de que o proveito auferido se deve à sua proveniência ilícita.
3. Em causa estando uma pena de 1 ano de prisão afastada está a aplicabilidade do art. 44° do C.P.M. para efeitos de substituição da pena.
4. O artigo 48º do Código Penal de Macau faculta ao juiz julgador a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido quando:
– a pena de prisão aplicada o tenha sido em medida não superior a três (3) anos; e,
– conclua que a simples censura do facto e ameaça de prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (cfr. Art.º 40.º), isto, tendo em conta a personalidade do agente, as condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste.
E, mesmo sendo favorável o prognóstico relativamente ao delinquente, apreciado à luz de considerações exclusivas da execução da prisão não deverá ser decretada a suspensão se a ela se opuseram as necessidades e prevenção do crime.
Crime de “desobediência” e de “associação criminosa”.
Recorribilidade da decisão que condena arguido julgado à revelia.
Erro notório na apreciação da prova.
Renovação da prova.
Inutilidade.
Absolvição.
1. Não é de conhecer do recurso interposto de decisão condenatória de arguido julgado à revelia e ainda não notificado.
2. Estando os arguidos acusados da prática do crime de “desobediência” e de “associação criminosa”, pelos quais foram absolvidos no T.J.B., e verificando-se que a matéria de facto que lhes era imputada não permite tal condenação, inútil é então apreciar-se do pedido de renovação da prova e do vício de erro notório na apreciação da prova assacado à decisão recorrida.
Crime de “exposição ou abandono”.
“Insuficiência da matéria de facto provada para a decisão”.
“Erro notório na apreciação da prova”.
Crime de “perigo concreto”.
Exposição.
Abandono.
Agravação pelo resultado.
Tentativa.
Punibilidade.
Pena.
Atenuação especial.
Suspensão da execução da pena.
1. O vício de “insuficiência da matéria de facto provada para a decisão” apenas ocorre quando o Tribunal omite pronúncia sobre matéria objecto do processo.
2. O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.
De facto, “É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. Artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. Artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.
3. O crime de “exposição ou abandono” é um crime de “perigo concreto”, em que o bem protegido é a “vida humana”.
4. A tentativa de um crime pode deixar de ser punível, desde que o agente:
- abandone voluntária e espontaneamente a execução do crime, omitindo a prática de mais actos de execução, sendo, vulgarmente apelidada de “desistência voluntária” – art. 23°, n.° 1, 1.a parte do C.P.M.;
- impeça, voluntária e espontaneamente, a consumação, e ainda que com o concurso de outras pessoas, evite que o resultado do crime se produza, (“arrependimento activo eficaz”) – art. 23.°, n.° 1, 2a parte;
- impeça a verificação do resultado não compreendido no tipo no caso de se tratar de crimes formais que se consumam independentemente da produção de resultado material, e o agente, tenha, mesmo assim, evitado, por intervenção própria e voluntária, ou com o concurso de estranhos, que se produza o resultado que se segue à acção típica (“desistência voluntária em crimes consumados formais”) – art. 23.°, n.°1, parte final; e,
- faça um esforço sério para evitar a consumação do crime ou o seu resultado – demonstrando através de actos concretos, (não bastando a mera intenção), mas, que, todavia, não foi determinante para o evitar (“arrependimento activo”, mas ineficaz) – art. 23.°, n.° 2.
5. Não é punível a conduta do arguido que, após expor o ofendido, ferido, a uma situação de que ele, por si só, não podia defender-se, colocando em perigo a sua vida, telefona logo de seguida, à Polícia para o socorrer, evitando assim a verificação dos “resultados” previstos no n.° 3 e 4 do art. 135° do C.P.M., pois que tal conduta integra a previsão do art. 23°, n.° 1, parte final, do mesmo Código.
