Acórdãos

Tribunal de Última Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 08/01/2014 72/2013 Recurso em processo penal
    • Assunto

      - Crime de contrafacção de moeda
      - Insuficiência para a decisão da matéria provada
      - Actos preparatórios
      - Tentativa

      Sumário

      1. O Tribunal de Última Instância tem entendido que, para que se verifique o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, é necessário que a matéria de facto provada se apresente insuficiente, incompleta para a decisão proferida, por se verificar lacuna no apuramento da matéria de facto necessária a uma decisão de direito adequada, ou porque impede a decisão de direito ou porque sem ela não é possível chegar-se à conclusão de direito encontrada.
      2. Entendem-se como actos preparatórios aqueles actos do iter criminis que já estão para além da resolução de realizar o tipo-de-ilícito, mas não cabem ainda na previsão do referido n.º 2 do art.º 21.º do Código Penal de Macau.
      3. Ora, face à matéria de facto provada nos autos, nomeadamente todo o planeado ilícito, ao qual aderiu o recorrente com a sua colaboração, e o facto de que o recorrente foi encontrado no quarto do Hotel a usar um computador equiparado com um auscultador, uma câmara de vídeo e um leitor de cartão magnético ligado com transformador, ao lado do qual foram encontrados os cartões de UnionPay dos bancos diferentes (um deles identificado como cartão de crédito), alguns já com os dados magnéticos implantados, completos ou não, outros ainda sem nenhum dado, afigura-se não haver dúvidas que se está já for a do âmbito dos actos preparatórios, já que o recorrente não se limitou a trazer os cartões a Macau nem a adquirir os respectivos equipamentos, mas sim foi muito mais longe: ele iria contrafazer tais cartões, e contrafez efectivamente, com os dados oferecidos por outrem, tudo conforme o combinado e o planeado.
      4. Na realidade, o cartão de crédito em causa, embora ainda sem nenhum dado, está incluído nos cartões que o recorrente iria contrafazer; se não fosse a intervenção da Polícia, o recorrente iria implantar nesse cartão dados necessários, contrafazendo-o.
      5. Está assim verificada uma das situações em que os actos devem ser qualificados como de execução, e não meros preparatórios, que é precisamente a prevista na al. c) do n.º 2 do art.º 21.º do Código Penal de Macau.
      6. Nos termos do n.º 1 do art.º 21.º do Código Penal de Macau, há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se.
      7. A consumação de contrafacção de cartão de crédito só se verifica com a implantação de todos os dados necessários para que o cartão possa ser usado como verdadeiro e legítimo.
      8. O cartão pré-pago, normalmente considerado como cartão de débito, que constitui um meio de pagamento imediato, com débito de uma conta bancária, fica for a da disposição legal da al. b) do n.º 1 do art.º 257.º do Código Penal de Macau.

      Resultado

      - Acordam em julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido A, que passa a ser condenado, pela prática de um crime tentado de contrafacção de moeda p.p. pelo art.º 252.º, conjugado com o art.º 257.º n.º 1, al. b), ambos do Código Penal de Macau, na pena de 1 anos e 6 meses de prisão e um crime de falsificação de documento p.p. pelo art.º 244.º n.º 1, al. a) do Código Penal de Macau na pena de 9 meses de prisão.
      - E em cúmulo jurídico, condena-se o recorrente na pena única de 2 anos de prisão efectiva.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dra. Song Man Lei
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dr. Viriato Lima
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 08/01/2014 82/2013 Recurso de decisão jurisdicional em matéria administrativa
    • Assunto

      - Suspensão da eficácia do acto administrativo.
      - Prejuízo de difícil reparação.
      - Prazo para junção de documentos.
      - Efeito útil da decisão.

      Sumário

      I – Se, na petição do procedimento de suspensão da eficácia do acto administrativo, o requerente se limita a protestar juntar documentos, sem pedir ao Tribunal qualquer prazo para o efeito, este Tribunal profere decisão final quando a tramitação processual chegue a tal termo, não tendo de notificar o requerente para juntar os documentos nem conferir-lhe prazo adicional, se não for pedido.
      II – O facto de o indeferimento da suspensão da eficácia colocar em causa o efeito útil da decisão que vier a ser proferida no recurso contencioso não é, por si, suficiente para o deferimento da providência.

      Resultado

      - Negam provimento ao recurso.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Viriato Lima
      • Juizes adjuntos : Dra. Song Man Lei
      •   Dr. Sam Hou Fai
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 18/12/2013 78/2013 Recurso em processo civil
    • Assunto

      - Artigo 625.º n.º 2 do Código de Processo Civil
      - Impedimento do Juiz para intervir no julgamento do recurso
      - Nulidade do Acórdão por omissão de pronúncia
      - Legitimidade para recorrer
      - Substituição da providência decretada por caução adequada

      Sumário

      1. A violação do contraditório, por não cumprimento do disposto no art.º 625.º n.º 2 do Código de Processo Civil, constitui uma nulidade processual, que deve ser suscitada perante o juiz que praticou a nulidade e no prazo de 10 dias, a contar “do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência”.
      2. Nos termos do art.º 312.º n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, quando tenha conhecimento da verificação de alguma das causas de impedimento, deve o juiz declarar-se impedido. E no caso de não se declarar impedido, podem as partes requerer, até à sentença, a declaração do impedimento. Daí que o requerimento de impedimento de juiz, pelas partes, é sempre feito até à prolação da sentença.
      3. Uma vez concluído pela ilegitimidade da recorrente para interpor recurso, não se admitindo o recurso, fica prejudicada a decisão sobre as restantes questões suscitadas no recurso.
      4. Nos termos do art.º 585.º do Código de Processo Civil, a legitimidade para recorrer é conferida à pessoa que, sendo parte principal na causa, tenha ficado vencida e ainda àquelas directa e efectivamente prejudicadas pela decisão, ainda que não sejam partes na causa ou sejam apenas partes acessórias.
      5. A circunstância de ter prestado caução nos termos do n.º 3 do art.º 332.º do Código de Processo Civil, na pressuposição de que era parte na causa de procedimento cautelar, não transforma a recorrente em parte, nem determina que seja directamente prejudicada pela decisão de procedimento cautelar.

      Resultado

      Acordam em negar provimento ao recurso.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dra. Song Man Lei
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dr. Viriato Lima
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 18/12/2013 74/2013 Recurso de decisão jurisdicional em matéria administrativa
    • Assunto

      - Renovação da autorização de residência
      - Situação juridicamente relevante
      - Alteração da situação juridicamente relevante

      Sumário

      1. Nos termos do art.º 18.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, o interessado que obteve a autorização de residência temporária deve manter, durante todo o período de residência temporária autorizada, a situação juridicamente relevante que fundamentou a concessão dessa autorização e a autorização de residência temporária deve ser cancelada caso se verifique extinção ou alteração dessa situação, excepto quando o interessado se constituir em nova situação jurídica atendível no prazo que lhe for fixado pelo Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau ou a alteração for aceite pelo órgão competente.
      2. No caso de extinção ou alteração da situação, o interessado deve cumprir o dever de comunicação, no prazo de 30 dias a contar da data da extinção ou alteração; e o não cumprimento, sem justa causa, dessa obrigação poderá implicar o cancelamento da autorização de residência temporária.
      3. “A situação juridicamente relevante” refere-se àquela que fundamentou a concessão da autorização de residência temporária, que se encontra necessariamente concretizada, no nosso caso concreto, nos requisitos exigidos no n.º 1 do art.º 3.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005 para a autorização de residência temporária com fundamento na aquisição de bens imóveis em Macau.
      4. Sendo um dos requisitos necessários para a autorização de residência temporária, a detenção dos fundos de valor não inferior à quantia exigida por lei depósitos a prazo nos bancos de Macau constitui, sem dúvida, parte integrante do conceito da “situação juridicamente relevante” que serve de fundamento para a autorização, e não apenas situação de facto como alega o recorrente.
      5. O facto jurídico é o evento juridicamente relevante, susceptível de produzir efeitos de direito, que se traduzem sempre na constituição, modificação ou extinção de uma situação jurídica, daí que a situação jurídica e o facto jurídico são conceitos estreitamente interligados.
      6. Nos termos do n.º 1 do art.º 3.º do Regulamento Administrativo n.º 3/2005, para que seja concedida a autorização de residência temporária com fundamento na aquisição de bens imóveis, são requisitos cumulativos: 1) aquisição de bens imóveis por preço não inferior a um milhão de patacas; 2) detenção de fundos de valor não inferior a quinhentas mil patacas depositados a prazo; e 3) detenção de grau académico de bacharelato ou equivalente (com excepção do n.º 2 do mesmo artigo).
      7. É mais que evidente que, enquanto os requisitos necessários, a lei não atribui maior importância ao primeiro nem menor relevância aos outros, sendo exigido o preenchimento de todos para a concessão da autorização de residência temporária, daí que não se pode qualificar o primeiro como requisito relevante e os outros como secundários ou adicionais.
      8. E o art.º 19.º do mesmo diploma prevê o procedimento a seguir e os requisitos necessários para que seja renovada a autorização de residência, que pressupõe também a manutenção, na pessoa do interessado, dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial, devendo o interessado que obteve a autorização concedida com fundamento em aquisição de bens imóveis provar que os direitos respectivos continuam na sua titularidade.
      9. A interpretação desta norma tem que ser feita conjugadamente com o disposto no art.º 18.º do mesmo diploma, que exige a manutenção, durante todo o período de residência temporária autorizada, da situação juridicamente relevante, sob pena de ser cancelada a autorização.
      10. A excepção prevista na al. 1) do n.º 2 do art.º 19.º refere-se apenas à exigência da prova sobre a manutenção dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial, dispensando a apresentação de nova prova dos requisitos previstos na al. 3) do n.º 1 e nas al.s 1) e 2) do n.º 2 do artigo 3.º, do preço pago e do valor de mercado dos bens relevantes.
      11. A dispensa da apresentação da prova não pode assumir relevância de afastar a exigência quanto à manutenção, em todo o período de residência temporária, dos pressupostos que fundamentaram o deferimento do pedido inicial, que funciona como pressuposto da renovação da residência temporária.

      Resultado

      Acordam em negar provimento ao recurso.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dra. Song Man Lei
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dr. Viriato Lima
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 18/12/2013 77/2013 Recurso de decisão jurisdicional em matéria administrativa
    • Assunto

      - Direito disciplinar da função pública.
      - Processo disciplinar.
      - Ónus da Prova.
      - Circunstância agravante.
      - Conhecimento e falta de aplicação das normas legais e regulamentares.
      - Deveres de zelo e de obediência.
      - Discricionariedade.
      - Contencioso de anulação.
      - Contencioso de plena jurisdição.
      - Princípio do aproveitamento dos actos administrativos praticados no exercício de poderes vinculados.

      Sumário

      I – No direito disciplinar da função pública, constituindo dever de zelo conhecer as normas legais e regulamentares e as instruções dos seus superiores hierárquicos, a falta de aplicação das normas legais e regulamentares, por negligência ou dolosamente, constitui violação do dever de zelo, por maioria de razão.
      II – A falta de aplicação dolosa das instruções dos seus superiores hierárquicos constitui violação do dever de obediência.
      III – Não constitui circunstância agravante da responsabilidade disciplinar, prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 283.º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública (produção efectiva de resultados prejudiciais ao serviço público ou ao interesse geral, nos casos em que o funcionário ou agente pudesse ou devesse prever essa consequência como efeito necessário da sua conduta) a divulgação, em vários jornais locais, que, um caso de uma médica dermatologista do Hospital Conde de S. Januário estava a ser investigado pelo Comissariado contra a Corrupção, por suspeita de acumulação de funções num centro de beleza sem prévia autorização e de recomendação aos seus pacientes do tratamento no mesmo centro de beleza, prejudicando a imagem dos Serviços de Saúde, se não se prova que tal divulgação é da responsabilidade da arguida, nem que esta tivesse previsto ou pudesse ou devesse prever como efeito necessário da sua conduta a divulgação, nos jornais, da investigação pelo Comissariado contra a Corrupção.
      IV – Em processo disciplinar o ónus da prova dos factos que constituem elemento de circunstâncias agravantes compete à Administração, a menos que sejam notórios.
      V - O princípio do aproveitamento dos actos administrativos pelo tribunal, não invalidando o acto, apesar do vício constatado, só vale na área dos actos vinculados, o que não se verifica no domínio da dosimetria das penas disciplinares da função pública, que comporta uma margem de discricionariedade.

      Resultado

      - Concedem provimento ao presente recurso jurisdicional, revogam o acórdão recorrido, concedem provimento ao recurso contencioso e anulam o acto recorrido por violação do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 283.º do Estatuto dos Trabalhadores da Administração Pública de Macau.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Viriato Lima
      • Juizes adjuntos : Dra. Song Man Lei
      •   Dr. Sam Hou Fai