Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/09/2012 700/2012 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “ofensa à integridade física”.
      Erro notório na apreciação da prova.
      In dubio pro reo.

      Sumário

      1. O erro notório na apreciação da prova existe quando se dão como provados factos incompatíveis entre si, isto é, que o que se teve como provado ou não provado está em desconformidade com o que realmente se provou, ou que se retirou de um facto tido como provado uma conclusão logicamente inaceitável. O erro existe também quando se violam as regras sobre o valor da prova vinculada, as regras de experiência ou as legis artis. Tem de ser um erro ostensivo, de tal modo evidente que não passa despercebido ao comum dos observadores.

      É na audiência de julgamento que se produzem e avaliam todas as provas (cfr. Artº 336º do C.P.P.M.), e é do seu conjunto, no uso dos seus poderes de livre apreciação da prova conjugados com as regras da experiência (cfr. Artº 114º do mesmo código), que os julgadores adquirem a convicção sobre os factos objecto do processo.
      Assim, sendo que o erro notório na apreciação da prova nada tem a ver com a eventual desconformidade entre a decisão de facto do Tribunal e aquela que entende adequada o Recorrente, irrelevante é, em sede de recurso, alegar-se como fundamento do dito vício, que devia o Tribunal ter dado relevância a determinado meio probatório para formar a sua convicção e assim dar como assente determinados factos, visto que, desta forma, mais não se faz do que pôr em causa a regra da livre convicção do Tribunal.

      Não é por haver depoimentos contraditórios que o Tribunal não pode dar crédito a uma determinada versão dos factos, em detrimento de outra.

      2. O princípio “in dúbio pro reo” identifica-se com o da “presunção da inocência do arguido” e impõe que o julgador valore sempre,em favor dele, um “non liquet”.
      Perante uma situação de dúvida sobre a realidade dos factos constitutivos do crime imputado ao arguido, deve o Tribunal, em harmonia com o princípio “in dúbio pro reo”, decidir pela sua absolvição

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dra. Tam Hio Wa
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/09/2012 657/2012 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “emprego ilegal”.
      Declarações para memória futura.
      Erro notório na apreciação da prova.

      Sumário

      1. Nada impede que as declarações para memória futura sejam tomadas, ainda que não tenha havido arguido constituído, desde que verificados os pressupostos previstos no n.° 1 do art. 253°.
      A lei não restringe a leitura das declarações para memória futura àquelas em que o arguido esteve presente ou lhe foi dada a oportunidade de estar presente, sendo também que o contraditório sempre pode ser assegurado na audiência de julgamento, com a vantagem, para o arguido, de previamente poder conhecer o teor das declarações prestadas para memória futura.

      2. Inexiste erro notório, se o Tribunal se limitou a apreciar a prova em conformidade com o art. 114° do C.P.P.M., sem violar nenhuma regra sobre o valor da prova tarifada, as regras de experiência ou legis artis.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dra. Tam Hio Wa
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/09/2012 681/2012 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “burla”.
      Correcção de acta de julgamento.
      Legitimidade do Ministério Público.
      Prazo para a queixa.
      Crime continuado.

      Sumário

      1. O Tribunal pode rectificar a acta em caso de desconformidade entre o teor do ditado e o ocorrido.

      2. O prazo para a queixa apenas começa a contar da data em que o titular “tiver tido conhecimento do facto” (e dos seus autores), isto é, a partir do momento em que os ofendidos tomem conhecimento que foram enganados e que eram, ou tinham sido, “vítimas” do crime de burla, (e não, a partir da sua prática).

      3. A construção do crime de “burla” supõe a concorrência de vários elementos típicos: (1) o uso de erro ou engano sobre os factos, astuciosamente provocado; (2) a fim de determinar outrem à prática de actos que lhe causam, ou a terceiro, prejuízo patrimonial – (elementos objectivos) – e, por fim, (3) a intenção do agente de obter para si ou terceiro um enriquecimento ilegítimo (elemento subjectivo).
      Impõe-se, assim, num primeiro momento, a verificação de uma conduta (intencional) astuciosa que induza directamente em erro ou engano o lesado, e, num segundo momento, a verificação de um enriquecimento ilegítimo de que resulte prejuízo patrimonial do sujeito passivo ou de terceiro.

      O crime de burla é um crime de dano, que se consuma quando existe um prejuízo efectivo no património do sujeito passivo, mas também de resultado, pois apenas se consuma com a saída do valor da esfera patrimonial do sujeito passivo, consubstanciada num prejuízo efectivo.

      4. A realização plúrima do mesmo tipo de crime pode constituir: a) um só crime, se ao longo de toda a realização tiver persistido o dolo ou resolução inicial; b) um só crime, na forma continuada, se toda a actuação não obedecer ao mesmo dolo, mas este estiver interligado por factores externos que arrastam o agente para a reiteração das condutas; c) um concurso de infracções, se não se verificar qualquer dos casos anteriores.

      5. O conceito de crime continuado é definido como a realização plúrima do mesmo tipo ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente”, e que, a não verificação de um dos pressupostos da figura do crime continuado impõe o seu afastamento, fazendo reverter a figura da acumulação real ou material.

      6. A diminuição sensível da culpa só tem lugar quando a ocasião favorável à prática do crime se repete sem que o agente tenha contribuído para essa repetição. Isto é, quando a ocasião se proporciona ao agente e não quando ele activamente a provoca. No caso de o agente provocar a repetição da ocasião criminosa não há diminuição sensível da culpa. Ao invés, a culpa pode até ser mais grave por revelar firmeza e persistência do propósito criminoso.

      A experiência e as leis da psicologia ensinam-nos que, em regra, se entre diversos actos medeia um largo espaço de tempo, a resolução que porventura inicialmente os abrangia a todos se esgota no intervalo da execução, de tal sorte que os últimos não são já a sua mera descarga, mas supõem um novo processo deliberativo. Daqui resulta então que se deve considerar existente uma pluralidade de resoluções sempre que se não verifique, entre as actividades do agente, uma conexão no tempo tal que, de harmonia com a experiência normal de vida e as leis psicológicas conhecidas, se possa e deva aceitar que ele as executou a todas sem ter de renovar o respectivo processo de motivação.

      7. Ainda que tenha a ora recorrente engendrado um plano para conseguir apropriar-se de quantias monetárias, há que ter em conta que a ulterior acção concreta da mesma sobre as vítimas, convencendo-as da sua capacidade de lhes arranjar emprego, torna evidente a autonomia de cada uma das específicas actuações da arguida face a cada uma das suas vítimas, traduzindo-se, em autónomas resoluções criminosas.

       
      • Votação : Com declaração de voto vencido
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dra. Tam Hio Wa
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/09/2012 621/2012 Recurso em processo penal
    • Assunto

      – art.o 95.o, n.o 4, do Código de Processo Civil
      – art.o 97.o, n.o 2, do Código de Processo Penal
      – processo penal
      – prática de acto processual fora do prazo mediante pagamento da
      multa
      – justo impedimento

      Sumário

      1. Em processo penal, não é aplicável o mecanismo do art.º 95.º, n.º 4 (e 5 e 6), do Código de Processo Civil.
      2. De facto, o art.º 97.º, n.º 2, do Código de Processo Penal reza que “Os actos processuais só podem ser praticados fora dos prazos estabelecidos por lei, …, a requerimento do interessado …, desde que se prove justo impedimento”. E a utilização aí do advérbio “só” afasta qualquer ilusão acerca da possibilidade da prática de acto processual fora do prazo mediante o mecanismo de pagamento da multa previsto no art.º 95.º, n.º 4 (5 e 6), do Código de Processo Civil.

       
      • Votação : Com declaração de voto vencido
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dra. Tam Hio Wa
      •   Dr. José Maria Dias Azedo
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/09/2012 742/2012 Recurso em processo penal
    •  
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dra. Tam Hio Wa
      •   Dr. José Maria Dias Azedo