Tribunal de Segunda Instância
- Relator : Dr. Chan Kuong Seng
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Relator : Dr. Choi Mou Pan
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Ho Wai Neng
- Dr. José Cândido de Pinho
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Cândido de Pinho
- Juizes adjuntos : Dr. Tong Hio Fong
- Dr. Lai Kin Hong
- Insolvência; requisitos; prova
- Qualidade de comerciante
1. Dispondo o n.º 1 do artigo 1185.° do Código de Processo Civil – “"1. O Devedor que não seja empresário comercial pode ser declarado em estado de insolvência quando o activo do seu património seja inferior ao seu passivo." -, o legislador, ciente de que essa prova podia não ser fácil, avançou com um critério objectivo, estabelecendo uma presunção no n.º 1 do art. 1186º/a do CPC, fazendo presumir a insolvência do devedor contra quem corram duas execuções não embargadas.
2. A doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que quem é gerente ou mesmo sócio de uma sociedade comercial não é obrigatoriamente comerciante, colocando-se, apenas alguma reserva, minoritária embora, nas situações das sociedades em nome colectivo.
3. Os actos objectivamente comerciais não implicam que o sejam sob o ponto de vista subjectivamente comercial. O que releva para que seja decretada a falência é a qualidade de comerciante do requerido. A figura do comerciante individual é reconduzida no nosso ordenamento, actualmente, ao empresário individual e não obstante a lei lhe cometer diversas obrigações especiais (art. 12º do C. Com.), o conceito não pode deixar de ser doutrinariamente enquadrado.É assim que se deve ter como comerciante aquele que faz da prática dessa profissão, de forma regular e habitual, praticando os actos concretizados na lei.
4. Não pode o requerido prevalecer-se de uma presunção do registo se afirma factos donde se retira que muito provavelmente já não exerce o comércio em Macau, pela razão simples de que aqui não tem meios de exercer ou gerir o seu estabelecimento (que nem sabemos sequer se existe): aqui não reside, não tem sede, agente ou representante. Aliás, não só deixou caducar o seu bilhete de residente de Macau, como afirma que não tem, desde há muito, qualquer ligação com a RAEM. Não faria com certeza tal afirmação se aqui desenvolvesse actividade comercial.
5. Independentemente da comprovação rigorosa do exacto montante das dívidas de terceiros, pelo requerido representados, não se deixa de ter por certa a dívida cartular não impugnada e expressa nas livranças que foram subscritas e se contém dentro daqueles valores, pelo que tanto bastaria para se apreciar da insuficiência do activo recorrente tendente à solvabilidade das suas obrigações, situação concretizada nas execuções - não embargadas - em que o banco credor não teve sucesso e não conseguiu penhorar bens suficientes para solver as suas responsabilidades.
6. Se o banco requerente alegou e provou matéria, não só presumidamente demonstrativa de uma situação de insolvência, como alegou as responsabilidades do requerido demonstrativas da sua situação passiva perante as dívidas que não se mostram satisfeitas com o decurso e tramitação das duas execuções referidas, mostram-se integrados os requisitos substantivos que permitem o decretamento da insolvência..
7. Perante uma prova diabólica, o ónus da prova não pode ser visto como uma “vaca sagrada” no sentido de que que há apenas um dever unilateral para uma das partes a quem cabe tudo fazer, mesmo o impossível. Perante a alegação e comprovação do facto muito objectivo, o de que uma parte interessada em ser paga de uma quantia que desembolsou não conseguiu obter bens para satisfação do seu crédito, não pode o devedor querer sustentar que afinal tem bens, mas, apesar disso, não paga. Se pretende demonstrar que aquela aparente insuficiência de bens não corresponde à verdade, cabe-lhe contrapor dizendo que afinal tem bens e quais. Não é razoável que o requerido pretenda que o requerente prove que aquele não tem bens em Hong Kong ou em qualquer outra parte do Mundo, a partir do momento em que os não encontra em Macau.
