Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 03/12/2009 795/2007 Recurso em processo penal
    • Assunto

      – injúria agravada
      – atenuação especial da pena
      – art.o 21.o, alínea e), do Decreto-Lei n.o 27/96/M
      – conteúdo do certificado de registo criminal
      – art.o 27.o, n.o 1, do Decreto-Lei n.o 27/96/M
      – não transcrição da sentença no certificado de registo criminal
      – comunicação da decisão condenatória penal
      – Serviço de Migração
      – renovação de contratação de trabalhador não-residente

      Sumário

      1. Estando os dois arguidos dos autos acusados da prática de um crime de injúria agravada, o mínimo da moldura penal aplicável é de um mês e quinze dias de prisão, nos termos conjugados dos art.os 175.o, n.o 1, 178.o e 41.o, n.o 1, do Código Penal de Macau (CP), pelo que errou o Tribunal a quo ao ter decidido impor a ambos a pena concreta de apenas um mês de prisão, ainda aquém desse mínimo penal.
      2. Não é de conceder atenuação especial da pena ao arguido recorrente, porquanto a haver o sincero arrependimento, esta circunstância, in casu, não tem a pretendida virtude de diminuir, de forma acentuada, a culpa dele, já que este, a despeito de ser oriundo da cidade de Xangai, optou por dizer palavrões injuriosos à moda própria do dialecto cantonense contra um agente policial local em exercício das suas funções de investigação de que o ora recorrente era um dos alvos, com a agravante de que o mesmo insistiu em dizer tais palavrões congéneres por mais duas vezes, não obstante ter sido sempre sucessivamente advertido pelo polícia ofendido depois da primeira e da segunda vezes, da incorrecção dessa conduta, o que denotou um elevado grau de culpa por parte do recorrente.
      3. Por decorrência do disposto na parte inicial da alínea e) do art.o 21.o do Decreto-Lei n.o 27/96/M, de 3 de Junho, “as condenações, relativas a delinquentes primários, em pena não superior a 6 meses de prisão ou em pena não privativa da liberdade” não podem constar dos certificados de registo criminal requeridos ou requisitados para fins não previstos no art.o 20.o do próprio Decreto-Lei.
      4. Entretanto, independentemente dessa disposição legal, “Os tribunais que condenem em pena de prisão até 1 ano ou em pena não privativa da liberdade podem, nos termos do n.o 1 do art.o 27.o desse Decreto-Lei, determinar na sentença ou em despacho posterior, sempre que das circunstâncias que acompanharam o crime não se puder induzir perigo de prática de novos crimes, a não transcrição da respectiva sentença nos certificados a que se refere o artigo 21.o do mesmo diploma legal.
      5. A inexistência de condenação penal é um dos factores a ser levado em conta no procedimento administrativo de renovação da autorização da contratação em Macau de qualquer trabalhador não-residente, pelo que teria andado mal o Tribunal a quo, se não tivesse determinado a comunicação ao Serviço de Migração do Corpo de Polícia de Segurança Pública de Macau para efeitos tidos por convenientes, da sua decisão condenatória tomada contra os dois trabalhadores não-residentes dos autos.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 03/12/2009 417/2007(II) Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      – Direito do Trabalho
      – trabalho subordinado por conta alheia
      – casino
      – Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L.
      – salário mensal
      – gorjetas
      – Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto
      – Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril
      – indemnização pelo trabalho em dias de descanso semanal
      – indemnização pelo trabalho em dias de descanso annual
      – indemnização pelo trabalho em feriados obrigatórios
      – fórmulas de cálculo

      Sumário

      1. O objecto do Direito do Trabalho é apenas o trabalho por conta alheia, no sentido de que a utilidade patrimonial do trabalho é atribuída a pessoa distinta do trabalhador, ou seja, ao empregador, que a adquire a título originário. Os bens ou serviços produzidos pelo trabalhador ao abrigo do contrato de trabalho por conta alheia não são do trabalhador, mas sim do empregador, que, por sua vez, compensa o trabalhador com uma parte da utilidade patrimonial que obteve com o trabalho deste – o salário.
      2. Apesar de o trabalhador poder ter sido chamado pelo seu empregador a trabalhar, ou até ter trabalhado voluntariamente, em dias destinados a descansos semanal e/ou annual e/ou até em feriados obrigatórios, tal não implica que o trabalho assim prestado não precise de ser compensado nos termos legalmente devidos.
      3. Aliás, é para proteger o trabalhador contra eventual necessidade, ditada pelo seu empregador, de prestação de trabalho em dias de descansos semanal e/ou annual e/ou de feriados obrigatórios que a lei laboral de Macau tem procurado estipular regras de compensação ou pagamento desse tipo de trabalho, mesmo que prestado de modo voluntário (cfr. Designadamente, os art.ºs 17.º, n.º 4, 18.º e 21.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, e os art.ºs 17.º, n.ºs 4 e 6, 18.º, 20.º e 24.º, do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, sucessor daquele).
      4. Com isso, fica realmente destituído de sentido prático fazer discutir a admissibilidade de limitação voluntária ou de renúncia dos ditos direitos do trabalhador: é que mesmo que o trabalhador se disponibilize a não gozar os dias de descanso semanal e/ou annual e/ou feriados obrigatórios a fim de trabalhar voluntariamente para o seu empregador, a lei laboral sempre o protegerá da situação de prestação de trabalho nesses dias, desde que o trabalhador o reclame.
      5. Daí se pode retirar a asserção de que qualquer eventual limitação voluntária ou renúncia voluntária desses direitos por parte do trabalhador é retractável, sob a égide das mencionadas normas cogentes consagradas nesta matéria na lei laboral, o que se justifica pela necessidade de proteger o trabalhador contra a sua compreensível inibição psicológica em discutir frontalmente com o seu empregador aquando da plena vigência da relação contratual de trabalho, sobre o exercício desses seus direitos laborais, caso este não seja cumpridor voluntário nem rigoroso da lei laboral em prol dos interesses daquele.
      6. O salário do Autor como trabalhador da Ré Sociedade de Turismo de Diversões de Macau, S.A.R.L., sendo composto por uma parte quantitativa fixa de valor reduzido, e por um outra remanescente, de quantia variável consoante o montante de gorjetas dadas pelos clientes dos casinos da mesma sociedade exploradora de jogos a seus trabalhadores, e depois distribuídas periodicamente por esta aos seus trabalhadores segundo as regras pré-fixadas, está em quantum materialmente variável, devido exclusivamente a essa forma do seu cálculo, e já não também em função do resultado de trabalho efectivamente produzido, nem, tão-pouco, do período de trabalho efectivamente prestado.
      7. Por isso, a quota-parte de gorjetas a ser distribuída ao Autor integra precisamente o seu salário, pois caso contrário, ninguém estaria disposto a trabalhar por conta dessa sociedade por anos seguidos como trabalhador dos casinos da Ré, sabendo, entretanto, que a prestação fixa do seu salário era de valor muito reduzido.
      8. Deste modo, o salário do Autor não é salário diário nem fixado em função do período de trabalho efectivamente prestado, mas sim salário mensal, por ser este a situação-regra, por normal.
      9. Antes da entrada em vigor, no dia 1 de Setembro de 1984, da primeira lei reguladora das Relações de Trabalho em Macau, ou seja, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, toda a relação de trabalho em Macau tinha que ser regida pelo próprio convencionado entre as duas partes empregadora e trabalhadora.
      10. E desde o dia 1 de Setembro de 1984 até 2 de Abril de 1989 inclusive, já vigoravam, salvo o tratamento mais favorável para a parte trabalhadora resultante de outro regime, os condicionalismos mínimos legais garantísticos a observar em Macau nomeadamente nas relações de trabalho remunerado por conta alheia, pela primeira vez traçados sob a forma de lei nesse Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto.
      11. E a partir do dia 3 de Abril de 1989 e até à data de cessação da relação entre o Autor e a Ré, vigorou o regime consagrado no Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, revogatório daquele primeiro diploma, com a nuance de que os seus art.ºs 17.º (apenas no seu n.º 6) e 26.º (excepto o seu n.º 1) passaram a ter a redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei n.º 32/90/M, de 9 de Julho, vocacionado a afastar as dúvidas até então surgidas quanto ao regime de descanso semanal no caso de trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado.
      12. O n.º 1 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M visa tão-só proteger o trabalhador contra eventual redução do seu salário mensal por parte do seu empregador sob pretexto de não prestação de trabalho nos períodos de descanso semanal e annual e dos feriados obrigatórios, e, por isso, já não se destina a determinar o desconto do valor da remuneração normal na compensação/indemnização pecuniária a pagar ao trabalhador no caso de prestação de trabalho em algum desses dias.
      13. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dia de descanso semanal no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, que entrou imediatamente em vigor, por força do seu art.º 57.º, no próprio dia da sua publicação (3 de Abril de 1989), com intuito legislativo nítido de favorecer quanto antes a classe trabalhadora, pois este novo diploma lhe confere mais direitos laborais do que os já garantidos no anterior Decreto-Lei n.º 101/84/M, a fórmula é o “dobro da retribuição normal”. Isto é, e matematicamente falando, 2 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso semanal por ano, não gozados.
      14. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso annual sob a vigência do Decreto-Lei n.º 101/84/M a partir do dia 1 de Setembro de 1984, a fórmula é (art.ºs 24.º, n.º 2, e 23.º – eram seis dias, logicamente úteis, de descanso annual) o “salário correspondente a esse período”. Isto é, 1 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso annual vencidos mas não gozados.
      15. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso annual no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula é (art.ºs 24.º e 21.º) o “triplo da retribuição normal”, se houver prova do impedimento pelo empregador do gozo desses dias, como pressupõe expressamente a letra do art.° 24.°. Isto é, 3 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso annual vencidos mas não gozados. Pois, caso contrário, já haverá que aplicar analogicamente a fórmula do “dobro da retribuição normal” à situação objectiva de prestação de trabalho nos dias de descanso annual, I.e., sem qualquer impedimento por acção da entidade patronal do exercício do direito do gozo desse descanso, sob pena de flagrante injustiça relativa em confronto com a compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.
      16. E para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pelo Autor à Ré em feriados obrigatórios “remumerados” sob a vigência do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula é o “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além naturalmente da retribuição a que tem direito, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho (art.ºs 20.º, n.º 1, e 19.º, n.ºs 2 e 3), o que, à falta de outra fórmula remuneratória convencionada mais favorável à parte trabalhadora, equivale, materialmente, ao “triplo da retribuição normal”, que se justifica, aliás, pelo especial significado desses dias que os tornou eleitos pelo próprio legislador como sendo feriados obrigatórios “remunerados”.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 26/11/2009 473/2009 Recurso em processo civil e laboral
    •  
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      • Juizes adjuntos : Dr. Lai Kin Hong
      •   Dr. Choi Mou Pan
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 26/11/2009 961/2009 Recurso em processo civil e laboral
    •  
      • Votação : Com declaração de voto
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dr. João A. G. Gil de Oliveira
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 26/11/2009 507/2008 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Marcas
      - Nulidade do julgamento
      - Marca notória

      Sumário

      1. Não havendo recurso da decisão, as nulidades da sentença podem ser reclamadas perante o Tribunal a quo, - art. 571.°, n.º 3, do Código de Processo Civil -, sendo certo que a ordem jurídica não pactua com a inadmissibilidade de reparação de uma injustiça clamorosa cometida perante erro evidente que resulta dos próprios termos da sentença.

      2. Assim, se se entrou com um pressuposto errado, cujo erro resulta dos próprios termos da sentença, na transposição da matéria tido por assente e que, por erro, não foi transcrita como tal, isto é, foi feito um registo da marca considerado um pressuposto da acção de impugnação de outro registo e o Tribunal laborou na pressuposição de que tal pressuposto se não verificara, é de anular o julgamento.

      3. A notoriedade da marca constitui fundamento de oposição a outro registo, ainda que prévio, até em nome do princípio da concorrência leal, ao abrigo da Convenção da União de Paris. Assim, se uma dada marca, aposta a produtos fabricados desde o séc. XVIII, no Reino Unido, com registos em inúmeros países espalhados pelo Mundo, nomeadamente em países e ordenamentos do Oriente, como China, Hong Kong e Japão, entre outros, sendo tal marca e produtos conhecidos de um público destinatário e consumidor desse tipo de produtos, com agentes e lojas próprias, com um reconhecimento de garantia de qualidade por parte da Coroa Britânica, tal marca, em que o toque referenciador passa por uma raposa estilizada, merece protecção no ordenamento de Macau, mesmo contra um registo prévio, se o terceiro interessado nesse registo pretendeu registar exactamente uma marca com o mesmo distintivo figurativo.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong