Tribunal de Segunda Instância
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Chan Kuong Seng
- Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Choi Mou Pan
- Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
- Dr. Chan Kuong Seng
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
- Dr. José Maria Dias Azedo
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Lai Kin Hong
- Dr. Choi Mou Pan
– Direito do Trabalho
– trabalho subordinado por conta alheia
– casino
– Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L.
– salário mensal
– gorjetas
– Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto
– Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril
– indemnização pelo trabalho em dias de descanso semanal
– indemnização pelo trabalho em dias de descanso annual
– indemnização pelo trabalho em feriados obrigatórios
– fórmulas de cálculo
1. O objecto do Direito do Trabalho é apenas o trabalho por conta alheia, no sentido de que a utilidade patrimonial do trabalho é atribuída a pessoa distinta do trabalhador, ou seja, ao empregador, que a adquire a título originário. Os bens ou serviços produzidos pelo trabalhador ao abrigo do contrato de trabalho por conta alheia não são do trabalhador, mas sim do empregador, que, por sua vez, compensa o trabalhador com uma parte da utilidade patrimonial que obteve com o trabalho deste – o salário.
2. Apesar de o trabalhador poder ter sido chamado pelo seu empregador a trabalhar, ou até ter trabalhado voluntariamente, em dias destinados a descansos semanal e/ou annual e/ou até em feriados obrigatórios, tal não implica que o trabalho assim prestado não precise de ser compensado nos termos legalmente devidos.
3. Aliás, é para proteger o trabalhador contra eventual necessidade, ditada pelo seu empregador, de prestação de trabalho em dias de descansos semanal e/ou annual e/ou de feriados obrigatórios que a lei laboral de Macau tem procurado estipular regras de compensação ou pagamento desse tipo de trabalho, mesmo que prestado de modo voluntário (cfr. Designadamente, os art.ºs 17.º, n.º 4, 18.º e 21.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, e os art.ºs 17.º, n.ºs 4 e 6, 18.º, 20.º e 24.º, do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, sucessor daquele).
4. Com isso, fica realmente destituído de sentido prático fazer discutir a admissibilidade de limitação voluntária ou de renúncia dos ditos direitos do trabalhador: é que mesmo que o trabalhador se disponibilize a não gozar os dias de descanso semanal e/ou annual e/ou feriados obrigatórios a fim de trabalhar voluntariamente para o seu empregador, a lei laboral sempre o protegerá da situação de prestação de trabalho nesses dias, desde que o trabalhador o reclame.
5. Daí se pode retirar a asserção de que qualquer eventual limitação voluntária ou renúncia voluntária desses direitos por parte do trabalhador é retractável, sob a égide das mencionadas normas cogentes consagradas nesta matéria na lei laboral, o que se justifica pela necessidade de proteger o trabalhador contra a sua compreensível inibição psicológica em discutir frontalmente com o seu empregador aquando da plena vigência da relação contratual de trabalho, sobre o exercício desses seus direitos laborais, caso este não seja cumpridor voluntário nem rigoroso da lei laboral em prol dos interesses daquele.
6. O salário da Autora como trabalhadora da Ré Sociedade de Turismo de Diversões de Macau, S.A.R.L., sendo composto por uma parte quantitativa fixa de valor reduzido, e por um outra remanescente, de quantia variável consoante o montante de gorjetas dadas pelos clientes dos casinos da mesma sociedade exploradora de jogos a seus trabalhadores, e depois distribuídas periodicamente por esta aos seus trabalhadores segundo as regras pré-fixadas, está em quantum materialmente variável, devido exclusivamente a essa forma do seu cálculo, e já não também em função do resultado de trabalho efectivamente produzido, nem, tão-pouco, do período de trabalho efectivamente prestado.
7. Por isso, a quota-parte de gorjetas a ser distribuída à Autora integra precisamente o seu salário, pois caso contrário, ninguém estaria disposto a trabalhar por conta dessa sociedade por anos seguidos como trabalhador dos casinos da Ré, sabendo, entretanto, que a prestação fixa do seu salário era de valor muito reduzido.
8. Deste modo, o salário da Autora não é salário diário nem fixado em função do período de trabalho efectivamente prestado, mas sim salário mensal, por ser este a situação-regra, por normal.
9. Antes da entrada em vigor, no dia 1 de Setembro de 1984, da primeira lei reguladora das Relações de Trabalho em Macau, ou seja, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, toda a relação de trabalho em Macau tinha que ser regida pelo próprio convencionado entre as duas partes empregadora e trabalhadora.
10. E desde o dia 1 de Setembro de 1984 até 2 de Abril de 1989 inclusive, já vigoravam, salvo o tratamento mais favorável para a parte trabalhadora resultante de outro regime, os condicionalismos mínimos legais garantísticos a observar em Macau nomeadamente nas relações de trabalho remunerado por conta alheia, pela primeira vez traçados sob a forma de lei nesse Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto.
11. E a partir do dia 3 de Abril de 1989 e até à data de cessação da relação entre a Autora e a Ré, vigorou o regime consagrado no Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, revogatório daquele primeiro diploma, com a nuance de que os seus art.ºs 17.º (apenas no seu n.º 6) e 26.º (excepto o seu n.º 1) passaram a ter a redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei n.º 32/90/M, de 9 de Julho, vocacionado a afastar as dúvidas até então surgidas quanto ao regime de descanso semanal no caso de trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado.
12. O n.º 1 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M visa tão-só proteger o trabalhador contra eventual redução do seu salário mensal por parte do seu empregador sob pretexto de não prestação de trabalho nos períodos de descanso semanal e annual e dos feriados obrigatórios, e, por isso, já não se destina a determinar o desconto do valor da remuneração normal na compensação/indemnização pecuniária a pagar ao trabalhador no caso de prestação de trabalho em algum desses dias.
13. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dia de descanso semanal no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, que entrou imediatamente em vigor, por força do seu art.º 57.º, no próprio dia da sua publicação (3 de Abril de 1989), com intuito legislativo nítido de favorecer quanto antes a classe trabalhadora, pois este novo diploma lhe confere mais direitos laborais do que os já garantidos no anterior Decreto-Lei n.º 101/84/M, a fórmula é o “dobro da retribuição normal”. Isto é, e matematicamente falando, 2 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso semanal por ano, não gozados.
14. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso annual sob a vigência do Decreto-Lei n.º 101/84/M a partir do dia 1 de Setembro de 1984, a fórmula é (art.ºs 24.º, n.º 2, e 23.º – eram seis dias, logicamente úteis, de descanso annual) o “salário correspondente a esse período”. Isto é, 1 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso annual vencidos mas não gozados.
15. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso annual no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula é (art.ºs 24.º e 21.º) o “triplo da retribuição normal”, se houver prova do impedimento pelo empregador do gozo desses dias, como pressupõe expressamente a letra do art.° 24.°. Isto é, 3 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso annual vencidos mas não gozados. Pois, caso contrário, já haverá que aplicar analogicamente a fórmula do “dobro da retribuição normal” à situação objectiva de prestação de trabalho nos dias de descanso annual, I.e., sem qualquer impedimento por acção da entidade patronal do exercício do direito do gozo desse descanso, sob pena de flagrante injustiça relativa em confronto com a compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.
16. E para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pela Autora à Ré em feriados obrigatórios “remumerados” sob a vigência do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula é o “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além naturalmente da retribuição a que tem direito, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho (art.ºs 20.º, n.º 1, e 19.º, n.ºs 2 e 3), o que, à falta de outra fórmula remuneratória convencionada mais favorável à parte trabalhadora, equivale, materialmente, ao “triplo da retribuição normal”, que se justifica, aliás, pelo especial significado desses dias que os tornou eleitos pelo próprio legislador como sendo feriados obrigatórios “remunerados”.
- Revisão de decisão arbitral; competência da Comissão
- Estabelecimento de quota litis em honorários de advogados
1. É de confirmar uma decisão da Comissão Arbitral de Zhuhai, competente para o efeito e composta de acordo com as regras regulamentares internas e legais da RPC, relativa à condenação no pagamento de honorários a uma Sociedade de Advogados por parte de uma empresa de Macau, tendo esta sido devidamente citada e não interferindo a decisão proferida com quaisquer princípios e valores de ordem pública da RAEM
2. Ainda que proibida, basicamente, a quota litis nas regras internas do Código Deontológico dos Advogados de Macau, se no contrato que serviu de base àquela decisão, uma cláusula dessa natureza integra parcelarmente a composição dos honorários convencionados, tal não é de forma a impedir a revisão da decisão proferida.
- Acidente de viação; repartição de culpas
- Danos não patrimoniais
1. Exclui-se a culpa de um dos intervenientes por ser a conduta de um dos intervenientes a única causadora do acidente, não deixando qualquer margem de actuação em termos medianamente exigíveis ao outro envolvido nesse processo para actuar de forma a evitá-lo. É o caso clássico da criança que inopinada e repentinamente salta para a estrada atrás de uma bola por detrás de um obstáculo situado for a da estrada, v.g. o portão de um jardim.
2. Não é de censurar a distribuição de culpas em 60% para o ciclista e 40% para o automobilista, quando este circula com uma velocidade inadequada para o local e onde a velocidade deve ser reduzida e aquele procede a uma manobra repentina, invadindo a faixa de trânsito contrária.
3. A extensão das lesões corporais, contusões e lacerações na cabeça, ombro, mãos e fractura na escápula esquerda, um período de internamento hospitalar de 38 dias, continuação de tratamento ambulatório, por alguns meses, a idade menos jovem do A. com menos expectativas de arranjar um trabalho, a necessidade que tinha das mãos e dos braços, as angústias, dores, incertezas resultantes daquela doença, tudo isso cria um quadro relevante a ser compensado, pensando-se que o valor encontrado de MOP100.00,00 não é excessivo.
- Insuficiência da matéria de facto
- Estupefacientes; lei nova mais favorável
1. Pode dizer-se que há insuficiência para a decisão da matéria de facto quando há uma lacuna no apuramento de factos que deviam ter sido apurados e o não foram, fosse porque constantes da matéria da acusação, da defesa, ou tal decorresse da necessidade de apurar factos decorrentes da audiência de julgamento, impedindo uma decisão de direito em conformidade com o objecto do processo.
2. Se do texto da sentença se retira claramente a preocupação do Tribunal em analisar a possibilidade que o recorrente configura, tendo sido muito claro na exclusão da possibilidade de aqueles produtos não pertencerem ao arguido, conforme se alcança da motivação da convicção acima transcrita, ficamos então apenas perante uma divergência em relação à conviccão do Tribunal, haja em vista o disposto no art. 114º do CPP, o que não releva em termos de configuração de qualquer vício invalidante do julgamento ou da sentença proferida.
3. Abstractamente, desde logo o regime da lei nova é mais favorável relativamente ao crime de tráfico de estupefacientes e detenção de utensilagem para consumo de tais produtos.
