Tribunal de Segunda Instância
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Chan Kuong Seng
- Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Chan Kuong Seng
- Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Com declaração de voto
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
- Dr. Lai Kin Hong
- Simulação de crime
- Não opção pela pena de multa nem substituição da pena de prisão
- Razoabilidade nas condições que fica sujeita a suspensão da execução da pena de prisão
1. Não é censurável a não opção pela pena de multa nem substituição da pena de prisão num caso, não em que um agente da Polícia cometeu um mero crime, situação que, embora sempre anormal, na medida em que representa alguma desconformidade com os valores ínsitos à ordem jurídica e que profissional e eticamente lhe cabe defender e que se tem de ter como possível e provável, mas perante uma atitude e comportamento em que se inventa o cometimento de um crime, comprometendo imaginariamente terceiros, para daí tirar uma vantagem patrimonial comezinha.
2. As condições impostas e que fica sujeita a suspensão da execução da pena devem razoavelmente ser susceptíveis de poderem ser cumpridas, o que não parece ser o caso, ao impor-se o pagamento de MOP 30.000,00, em 2 meses, a quem ganha cerca de MOP10.000,00, sem outros rendimentos, e com os encargos normais de sustentação da família.
– Direito do Trabalho
– trabalho subordinado por conta alheia
– casino
– Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.R.L.
– salário mensal
– gorjetas
– Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto
– Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril
– indemnização pelo trabalho em dias de descanso semanal
– indemnização pelo trabalho em dias de descanso anual
– indemnização pelo trabalho em feriados obrigatórios
– período experimental
– fórmulas de cálculo
– licença de maternidade
– falta da prova exigida do estado de gravidez e do parto
– art.° 37.°, n.ºs 6 e 7, do Decreto-Lei n.° 24/89/M
1. O objecto do Direito do Trabalho é apenas o trabalho por conta alheia, no sentido de que a utilidade patrimonial do trabalho é atribuída a pessoa distinta do trabalhador, ou seja, ao empregador, que a adquire a título originário. Os bens ou serviços produzidos pelo trabalhador ao abrigo do contrato de trabalho por conta alheia não são do trabalhador, mas sim do empregador, que, por sua vez, compensa o trabalhador com uma parte da utilidade patrimonial que obteve com o trabalho deste – o salário.
2. Apesar de o trabalhador poder ter sido chamado pelo seu empregador a trabalhar, ou até ter trabalhado voluntariamente, em dias destinados a descansos semanal e/ou anual e/ou até em feriados obrigatórios, tal não implica que o trabalho assim prestado não precise de ser compensado nos termos legalmente devidos.
3. Aliás, é para proteger o trabalhador contra eventual necessidade, ditada pelo seu empregador, de prestação de trabalho em dias de descansos semanal e/ou anual e/ou de feriados obrigatórios que a lei laboral de Macau tem procurado estipular regras de compensação ou pagamento desse tipo de trabalho, mesmo que prestado de modo voluntário (cfr. Os art.ºs 17.º, n.º 4, 18.º e 21.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, e os art.ºs 17.º, n.ºs 4 e 6, 18.º, 20.º e 24.º, do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, sucessor daquele).
4. Com isso, fica realmente destituído de sentido prático fazer discutir a admissibilidade de limitação voluntária ou de renúncia dos ditos direitos do trabalhador: é que mesmo que o trabalhador se disponibilize a não gozar os dias de descanso semanal e/ou anual e/ou feriados obrigatórios a fim de trabalhar voluntariamente para o seu empregador, a lei laboral sempre o protegerá da situação de prestação de trabalho nesses dias, desde que o trabalhador o reclame.
5. Daí se pode retirar a asserção de que qualquer eventual limitação voluntária ou renúncia voluntária desses direitos por parte do trabalhador é retractável, sob a égide das mencionadas normas cogentes consagradas nesta matéria na lei laboral, o que se justifica pela necessidade de proteger o trabalhador contra a sua compreensível inibição psicológica em discutir frontalmente com o seu empregador aquando da plena vigência da relação contratual de trabalho, sobre o exercício desses seus direitos laborais, caso este não seja cumpridor voluntário nem rigoroso da lei laboral em prol dos interesses daquele.
6. O salário da Autora como trabalhadora da Ré Sociedade de Turismo de Diversões de Macau, S.A.R.L., sendo composto por uma parte quantitativa fixa de valor reduzido, e por um outra remanescente, de quantia variável consoante o montante de gorjetas dadas pelos clientes dos casinos da mesma sociedade exploradora de jogos a seus trabalhadores, e depois distribuídas periodicamente por esta aos seus trabalhadores segundo as regras pré-fixadas, está em quantum materialmente variável, devido exclusivamente a essa forma do seu cálculo, e já não também em função do resultado de trabalho efectivamente produzido, nem, tão-pouco, do período de trabalho efectivamente prestado.
7. Por isso, a quota-parte de gorjetas a ser distribuída à Autora integra precisamente o seu salário, pois caso contrário, ninguém estaria disposto a trabalhar por conta dessa sociedade por anos seguidos como trabalhador dos casinos da Ré, sabendo, entretanto, que a prestação fixa do seu salário era de valor muito reduzido.
8. Deste modo, o salário da Autora não é salário diário nem fixado em função do período de trabalho efectivamente prestado, mas sim salário mensal, por ser este a situação-regra, por normal.
9. Antes da entrada em vigor, no dia 1 de Setembro de 1984, da primeira lei reguladora das Relações de Trabalho em Macau, ou seja, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, toda a relação de trabalho em Macau tinha que ser regida pelo próprio convencionado entre as duas partes empregadora e trabalhadora.
10. E desde o dia 1 de Setembro de 1984 até 2 de Abril de 1989 inclusive, já vigoravam, salvo o tratamento mais favorável para a parte trabalhadora resultante de outro regime, os condicionalismos mínimos legais garantísticos a observar em Macau nomeadamente nas relações de trabalho remunerado por conta alheia, pela primeira vez traçados sob a forma de lei nesse Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto.
11. E a partir do dia 3 de Abril de 1989, tem vigorado o regime consagrado no Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, revogatório daquele primeiro diploma, com a nuance de que os seus art.ºs 17.º (apenas no seu n.º 6) e 26.º (excepto o seu n.º 1) passaram a ter a redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei n.º 32/90/M, de 9 de Julho, vocacionado a afastar as dúvidas até então surgidas quanto ao regime de descanso semanal no caso de trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado.
12. O n.º 1 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M visa tão-só proteger o trabalhador contra eventual redução do seu salário mensal por parte do seu empregador sob pretexto de não prestação de trabalho nos períodos de descanso semanal e anual e dos feriados obrigatórios, e, por isso, já não se destina a determinar o desconto do valor da remuneração normal na compensação/indemnização pecuniária a pagar ao trabalhador no caso de prestação de trabalho em algum desses dias.
13. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dia de descanso semanal no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, que entrou imediatamente em vigor, por força do seu art.º 57.º, no próprio dia da sua publicação (3 de Abril de 1989), com intuito legislativo nítido de favorecer quanto antes a classe trabalhadora, pois este novo diploma lhe confere mais direitos laborais do que os já garantidos no anterior Decreto-Lei n.º 101/84/M, a fórmula é o “dobro da retribuição normal”. Isto é, e matematicamente falando, 2 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso semanal por ano, não gozados.
14. O primeiro dia de descanso semanal a que o trabalhador tinha direito deveria ser o dia imediatamente seguinte ao primeiro período de seis dias de trabalho prestado logo após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 24/89/M em 3 de Abril de 1989, pois o descanso só se justifica depois de cada período de trabalho de seis dias, tal como o que se pode retirar da letra do n.º 1 do art.º 17.º deste diploma, sendo de defender que a entidade patronal não pode fazer variar o dia de repouso semanal, tornando incerto o dia destinado a esse fim.
15. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso anual no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M (sendo claro que o direito a descanso anual em cada ano civil só se vence naturalmente depois de decorrido o ano civil a que esse direito anual se reporta), a fórmula é o “triplo da retribuição normal”, se houver prova do impedimento pelo empregador do gozo desses dias, como pressupõe expressamente a letra do art.° 24.°. Isto é, 3 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso anual vencidos mas não gozados. Pois, caso contrário, já haverá que aplicar analogicamente a fórmula do “dobro da retribuição normal” à situação objectiva de prestação de trabalho nos dias de descanso anual, i.e., sem qualquer impedimento por acção da entidade patronal do exercício do direito do gozo desse descanso, sob pena de flagrante injustiça relativa em confronto com a compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.
16. Sob a égide do Decreto-Lei n.º 24/89/M, são seis dias de feriados obrigatórios “remunerados” por ano, sendo certo que a Lei n.º 8/2000, de 8 de Maio, que mantém igualmente em dez dias os feriados obrigatórios, deixa intocados esses mesmos seis dias de feriados obrigatórios “remunerados”, quais sejam, o Primeiro de Janeiro, os Três Dias do Ano Novo Chinês, o Primeiro de Maio e o Primeiro de Outubro.
17. E para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pela Autora à Ré em feriados obrigatórios “remumerados” sob a vigência do Decreto-Lei n.º 24/89/M (e ocorridos depois do período experimental dos primeiros três meses da sua relação de trabalho), a fórmula é o “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além naturalmente da retribuição a que tem direito, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho (art.ºs 20.º, n.º 1, e 19.º, n.ºs 2 e 3), o que, à falta de outra fórmula remuneratória convencionada mais favorável à parte trabalhadora, equivale, materialmente, ao “triplo da retribuição normal”, que se justifica, aliás, pelo especial significado desses dias que os tornou eleitos pelo próprio legislador como sendo feriados obrigatórios “remunerados”.
18. Entretanto, no âmbito do mesmo Decreto-Lei n.º 24/89/M, a Autora não pode reclamar a indemnização pelo trabalho prestado nos quatro dias de feriados obrigatórios “não remunerados”, uma vez que o n.º 2 do art.º 20.º deste diploma só prevê a indemnização do trabalho em feriados obrigatórios “não remunerados” prestado ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo, e já não também na situação da alínea c) do mesmo n.º 1.
19. Atenta a redacção dos n.°s 1 e 6 do art.° 37.° do Decreto-Lei n.° 24/89/M, de 3 de Abril, é manifesto que para efeitos de gozo da licença de maternidade, naturalmente com limitação posta pelo n.° 5 do mesmo preceito, basta à trabalhadora em causa pedi-la mesmo que verbalmente, e ainda que sem apresentação logo da prova do seu estado de gravidez (que aliás se ressalta logo como facto notório, atento o estado necessariamente já muitíssimo avançado, se não mesmo derradeiro, de gravidez postulado pelo legislador juslaboral na legiferação do n.° 2 do mesmo art.° 37.°) e do parto.
20. Prova essa que só se tornará obrigatória se a sua entidade patronal vier a exigir expressamente a sua apresentação à luz do n.° 6 do dito art.° 37.°, sendo certo que só na falta da prova assim exigida pela entidade patronal é que poderá acontecer a consequência cominada no subsequente n.° 7.
21. Daí que configurando a “falta da prova exigida” pelo empregador do estado de gravidez e do parto das trabalhadoras ao seu serviço nitidamente um facto impeditivo nomeadamente da concessão da remuneração correspondente ao período da licença de maternidade, nos termos expressa e conjugadamente ditados naqueles n.ºs 6 e 7 do art.° 37.°, é exclusivamente à Ré que, nos termos do art.º 335.º, n.º 2, do Código Civil de Macau, cabe provar que tenha chegado a exercer o direito de exigir da Autora a prova do estado de gravidez e do parto e que, não obstante o assim exigido, a Autora não lhe tenha apresentado essa prova.
– resposta deficiente aos quesitos
– reenvio do processo
– art.º 629.º, n.º 4, do Código de Processo Civil
– repetição de julgamento
Caso o Tribunal a quo tenha respondido de modo insanavelmente deficiente a determinada matéria de facto então quesitada com pertinência para a decisão jurídica da causa, é necessário ordenar oficiosamente o reenvio do processo nos termos do art.º 629.º, n.º 4, do Código de Processo Civil de Macau, com vista à repetição do julgamento de facto na parte afectada.
- Gorjetas.
- Trabalho prestado em dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios.
- Compensação.
1. Resultando provado que o trabalhador recebia como contrapartida da sua actividade laboral duas quantias, uma fixa e outra variável em função do montante das gorjetas recebidas, é de se considerar que tais quantias variáveis integram o seu salário.
2. O trabalho prestado em dias de descanso semanal, anual e feriados obrigatórios, ainda que de forma voluntária, não implica uma renúncia do trabalhador à sua respectiva compensação.
