Tribunal de Segunda Instância
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Chan Kuong Seng
- Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Choi Mou Pan
- Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. Chan Kuong Seng
- Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
- Dr. Lai Kin Hong
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
- Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
- Dr. Lai Kin Hong
– âmbito de decisão do recurso
– esgotamento do poder jurisdicional
– art.º 569.º, n.º 1, do Código de Processo Civil
– reparação da decisão intercalar recorrida
– sustentação da decisão intercalar recorrida
– efeitos do recurso da sentença sobre causa laboral
– prova pericial
– salário justo
– Direito do Trabalho
– princípio do favor laboratoris
– trabalho subordinado por conta alheia
– prestação do trabalhador
– retribuição
– subordinação jurídica
– teoria do risco
– teoria do beneficiário dos resultados obtidos
– casino
– Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A.
– croupier
– salário mensal
– gorjetas
– trabalho por turnos e nocturno
– trabalho normal em regime diurno
– Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril
– art.º 26.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 24/89/M
– indemnização pelo trabalho em dias de descanso semanal
– indemnização pelo trabalho em dias de descanso annual
– indemnização pelo trabalho em feriados obrigatórios
– período experimental
– paz social
– obediência à lei
– art.º 7.º, n.ºs 1 e 3, do Código Civil
1. O tribunal ad quem só resolve as questões concretamente postas pela parte recorrente e delimitadas pelas conclusões das suas alegações de recurso, transitando em julgado as questões nelas não contidas, mesmo que alguma vez tenham aí sido invocadas.
2. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista, pelo que o que importa é que o tribunal decida a questão posta, não lhe incumbindo, pois, apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.
3. Com o proferimento da sentença final sobre o mérito da causa, já fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional da Primeira Instância (cfr. O art.° 569.°, n.° 1, do Código de Processo Civil de Macau), pelo que a partir desse momento, já não se afigura processualmente admissível a emissão do eventual juízo de reparação de alguma decisão então tomada antes da sentença e entretanto objecto de recurso intercalar, nem faz sentido lógico a formulação do eventual juízo de sustentação da decisão intercalar, por esta ter que ser obviamente mantida tal e qual, por força dos efeitos da pronúncia daquela sentença final.
4. Deve ser indeferida, por impertinente ou inadequada, qualquer pretensão de realização da prova pericial sobre o que se deve entender por salário justo em Macau.
5. O Direito do Trabalho aparece com a generalização de um tipo específico de trabalho humano – o trabalho produtivo, voluntário, dependente e por conta alheia – que substitui definitivamente o trabalho forçoso característico das economias do mundo antigo, tipo de trabalho específico esse que com a Revolução Industrial alcançou importância suficiente de modo a determinar a necessidade de se criar um corpo normativo dirigido à sua regulamentação.
6. Sendo reconhecido em geral que o trabalhador se encontra numa posição de inferioridade em relação ao empregador no estabelecimento e desenvolvimento da relação do trabalho, o Direito do Trabalho assume-se como um direito de protecção e justifica-se pela necessidade de corrigir, por via legal, certas situações de desigualdade, através da imposição de restrições ao normal desenvolvimento do princípio da autonomia da vontade, por um lado, e, por outro, pela constatação de que, sem a intervenção do legislador juslaboralístico, o trabalhador fica sujeito a todo um conjunto de pressões de que não pode facilmente escapar, em virtude da necessidade que tem do emprego e do salário para dar satisfação a necessidades vitais suas e dos seus familiares.
7. Portanto, ao interpretar e aplicar qualquer legislação juslaboralística, há que atender necessariamente ao princípio do favor laboratoris elaborado pela doutrina atentas essas especificidades do Direito do Trabalho, a fim de ir ao encontro da exigência do cânone de hermenêutica jurídica do n.º 1 do art.º 8.º do Código Civil de Macau.
8. Na verdade, este princípio do favor laboratoris, como um dos derivados do princípio da protecção do trabalhador informador do Direito do Trabalho, para além de orientar o legislador na feitura das normas juslaborais (sendo exemplo paradigmático disto o próprio disposto no art.º 5.º, n.º 1, e no art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril), deve ser tido pelo menos também como farol de interpretação da lei laboral, sob o qual o intérprete-aplicador do direito deve escolher, na dúvida, o sentido ou a solução que mais favorável se mostre aos trabalhadores no caso considerado, em virtude do objectivo de protecção do trabalhador que o Direito do Trabalho visa prosseguir.
9. O contrato de trabalho subordinado caracteriza-se por três elementos essenciais: a prestação do trabalhador, a retribuição e a subordinação jurídica.
10. No tocante ao primeiro elemento, o que está in obligatio é a própria actividade a que o trabalhador se obrigou e que a outra parte, o empregador, organiza e dirige no sentido de um resultado que está for a do contrato. Por isso, o trabalhador que tenha cumprido diligentemente essa sua prestação de trabalho não pode ser responsabilizado, se o resultado pretendido pelo empregador não for atingido. E basta, por outro lado, que o trabalhador se encontre à disposição do empregador no tempo e no local de trabalho para cumprir a sua obrigação.
11. Quanto ao elemento retribuição, este já é a obrigação principal do empregador no contrato de trabalho, como troca da disponibilidade da força de trabalho do trabalhador.
12. E no que tange ao elemento subordinação jurídica, este traduz-se numa relação de dependência necessária da conduta pessoal do trabalhador na execução do contrato, face às ordens, regras ou orientações ditadas pelo empregador, dentro dos limites do contrato e das normas que o regem. Assim, é ao credor (empregador) que compete dizer onde, quando, como e com que meios deve o trabalhador executar a actividade a que se obrigou por contrato. E esta subordinação jurídica não se limita aos momentos que antecedem o início da prestação laboral, antes se mantém durante a execução desta. E como é um poder jurídico, não é necessário que o empregador o exerça de modo efectivo, mas basta que o possa exercer.
13. O objecto do Direito do Trabalho é apenas o trabalho por conta alheia, no sentido de que a utilidade patrimonial do trabalho é atribuída a pessoa distinta do trabalhador, ou seja, ao empregador, que a adquire a título originário. Os bens ou serviços produzidos pelo trabalhador ao abrigo do contrato de trabalho por conta alheia não são do trabalhador, mas sim do empregador, que, por sua vez, compensa o trabalhador com uma parte da utilidade patrimonial que obteve com o trabalho deste – o salário.
14. Por isso, o trabalho por conta alheia é explicado quer pela teoria do risco, quer pela teoria do beneficiário dos resultados obtidos.
15. Segundo a teoria do risco, o trabalho por conta alheia é aquele em que o trabalhador exerce a sua actividade sem assumir os riscos da exploração do empregador.
16. Enquanto de acordo com a teoria do beneficiário dos resultados obtidos, o trabalho por conta alheia é aquele em que o trabalhador não se apropria dos frutos do trabalho.
17. O contrato celebrado entre um particular e a Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A., para aquele trabalhar como “croupier” nos seus casinos, sob direcção efectiva, fiscalização e retribuição por parte desta, deve ser qualificado juridicamente como sendo um genuíno contrato de trabalho remunerado por conta alheia.
18. E apesar de o “croupier” poder ter sido chamado pela dita empregadora a trabalhar, ou até ter trabalhado voluntariamente, em dias destinados a descansos semanal e/ou annual e/ou até em feriados obrigatórios, tal não implica que o trabalho assim prestado não precise de ser compensado nos termos legalmente devidos.
19. Aliás, é para proteger o trabalhador contra eventual necessidade, ditada pelo seu empregador, de prestação de trabalho em dias de descansos semanal e/ou annual e/ou de feriados obrigatórios que a lei laboral de Macau tem procurado estipular regras de compensação ou pagamento desse tipo de trabalho, mesmo que prestado de modo voluntário (cfr. Os art.ºs 17.º, n.º 4, 18.º e 21.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, e os art.ºs 17.º, n.ºs 4 e 6, 18.º, 20.º e 24.º, do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, sucessor daquele).
20. Com isso, fica realmente destituído de sentido prático fazer discutir a admissibilidade de limitação voluntária ou de renúncia dos ditos direitos do trabalhador: é que mesmo que o trabalhador se disponibilize a não gozar os dias de descanso semanal e/ou annual e/ou feriados obrigatórios a fim de trabalhar voluntariamente para o seu empregador, a lei laboral sempre o protegerá da situação de prestação de trabalho nesses dias, desde que o trabalhador o reclame.
21. Uma vez reclamada essa protecção mínima legal, o empregador tem que compensar in natura (através, por exemplo, de concessão de descanso compensatório) ou pagar o trabalho prestado nesses dias, embora não o queira fazer.
22. Daí se pode retirar a asserção de que qualquer eventual limitação voluntária ou renúncia voluntária desses direitos por parte do trabalhador é retractável, sob a égide das mencionadas normas cogentes consagradas nesta matéria na lei laboral, o que se justifica pela necessidade de proteger o trabalhador contra a sua compreensível inibição psicológica em discutir frontalmente com o seu empregador aquando da plena vigência da relação contratual de trabalho, sobre o exercício desses seus direitos laborais, caso este não seja cumpridor voluntário nem rigoroso da lei laboral em prol dos interesses daquele.
23. O salário do “croupier” da Sociedade de Turismo de Diversões de Macau, S.A., sendo composto por uma parte quantitativa fixa de valor reduzido, e por um outra remanescente, de quantia variável consoante o montante de gorjetas dadas pelos clientes dos casinos da mesma sociedade exploradora de jogos a seus trabalhadores, mas diariamente reunidas e contabilizadas por esta e depois também por ela distribuídas de dez em dez dias para os seus trabalhadores de acordo com as regras fixadas pela própria empresa, está em quantum materialmente variável, devido exclusivamente a essa forma do seu cálculo, e já não também em função do resultado de trabalho efectivamente produzido, nem, tão-pouco, do período de trabalho efectivamente prestado.
24. Por isso, a quota-parte de gorjetas a ser distribuída pela Sociedade de Turismo de Diversões de Macau, S.A., ao seu “croupier”, em montante por ela definido unilateralmente, integra precisamente o salário deste, pois caso contrário, ninguém estaria disposto a trabalhar por conta daquela por anos seguidos como “croupier” dos seus casinos em horários de trabalho por esta fixados em ciclos de três dias, num total de oito horas, alternadas de quatro em quatro horas, com um período de descanso apenas de oito horas diárias durante os dois primeiros dias e um período de dezasseis horas de descanso no terceiro dia, ou seja, em horários de turnos necessariamente árduos para qualquer pessoa humana, se tivessem de serem cumpridos continuadamente em anos seguidos, sabendo entretanto, de antemão, que a prestação fixa do seu salário era de valor muito reduzido.
25. Aliás, o falado alto nível de remuneração do “croupier” justifica-se precisamente e tão-só pela necessidade de sujeição permanente àquele tipo de turnos.
26. Deste modo, o salário do “croupier” da dita sociedade não é fixado em função do período de trabalho efectivamente prestado, nem é um salário diário, mas sim um salário mensal.
27. Na verdade, se fosse um salário diário ou salário fixado em função do período de trabalho efectivamente prestado, a necessária laboração contínua e permanente daquela sociedade comercial como exploradora de jogos em Macau por decorrência da legislação especial aplicável a essa sua actividade sairia deveras comprometida, visto que para se verificar este efeito nefasto, bastaria que algum “croupier” e/ou outros seus colegas de trabalho não viessem a comparecer nos casinos daquela em cumprimento dos rigorosos turnos diários por esta fixados em relação a cada um dos seus trabalhadores para garantir tal funcionamento contínuo, ou viessem a trabalhar dia sim dia não a seu bel-prazer ou só em dias em que os turnos lhes fossem mais favoráveis, já que a retribuição do trabalho seria, de qualquer maneira, igualmente calculada em função dos dias de trabalho efectivamente prestado.
28. Daí que não foi por acaso que os turnos de trabalho de “croupier” dos casinos da Sociedade de Turismo e Diversões de Macau, S.A., eram fixados em ciclos permanentes e contínuos de três a três dias, com horas alternadas sucessivamente, nem o foi o facto de as gorjetas terem sido distribuídas por aquela aos seus trabalhadores de dez a dez dias, pois tudo isto aponta claramente, mesmo sob a égide de presunções judiciais com recurso às regras da experiência da vida humana, para a situação normal de trabalho remunerado com salário mensal, ainda que em quantia variável.
29. Sendo certo que toda a problemática em torno disso eventualmente teria tido outro tratamento mais próprio em função dessa especificidade, caso tivesse sido legalmente regulamentado o trabalho por turnos e nocturno (cfr. A porta aberta pelo art.º 55.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril), se bem que enquanto não existir essa regulamentação especial, haja que aplicar ainda as normas gerais em matéria do trabalho normal em regime diurno, já positivadas na legislação laboral de Macau.
30. A partir do dia 3 de Abril de 1989 inclusive até à presente data, tem vigorado o regime consagrado no Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, com a nuance de que os seus art.ºs 17.º (apenas no seu n.º 6) e 26.º (excepto o seu n.º 1) passaram a ter a redacção dada pelo artigo único do Decreto-Lei n.º 32/90/M, de 9 de Julho, vocacionado a afastar as dúvidas até então surgidas quanto ao regime de descanso semanal no caso de trabalhadores que auferem salário determinado em função do resultado efectivamente produzido ou do período de trabalho efectivamente prestado.
31. O n.º 1 do art.º 26.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, atentos os termos empregues na redacção da sua parte final, visa tão-só proteger o trabalhador contra eventual redução do seu salário mensal por parte do seu empregador sob pretexto de não prestação de trabalho nos períodos de descanso semanal e annual e dos feriados obrigatórios, e, por isso, já não se destina a determinar o desconto do valor da remuneração normal na compensação/indemnização pecuniária a pagar ao trabalhador no caso de prestação de trabalho em algum desses dias.
32. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dia de descanso semanal no âmbito do Decreto-Lei n.º 24/89/M, que entrou imediatamente em vigor, por força do seu art.º 57.º, no próprio dia da sua publicação (3 de Abril de 1989), com intuito legislativo nítido de favorecer quanto antes a classe trabalhadora, pois este novo diploma lhe confere mais direitos laborais do que os já garantidos no anterior Decreto-Lei n.º 101/84/M, de 25 de Agosto, a fórmula é o “dobro da retribuição normal”. Isto é, e matematicamente falando, 2 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso semanal por ano, não gozados.
33. O primeiro dia de descanso semanal a que o trabalhador tinha direito deveria ser depois do primeiro período de seis dias de trabalho sob a vigência imediata do Decreto-Lei n.° 24/89/M em 3 de Abril de 1989, pois o descanso só se justifica depois de cada período de trabalho de seis dias, tal como o que se pode retirar da letra do n.º 1 do art.º 17.º deste diploma, sendo de defender que a entidade patronal não pode fazer variar o dia de repouso semanal, tornando incerto o dia destinado a esse fim.
34. De facto, o descanso semanal pressupõe a prestação de trabalho efectivo durante um determinado período, por forma a que seja imprescindível à recuperação das energias físicas e psíquicas do trabalhador, daí que não possa acontecer antes da prestação de trabalho que o justifica, sob pena de inversão lógica.
35. Para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado em dias de descanso annual correspondente ao trabalho prestado a partir da vigência daquele Decreto-Lei n.º 24/89/M, e entretanto vencidos mas não gozados (sendo claro que o direito a descanso annual em cada ano civil só se vence naturalmente depois de decorrido o ano civil a que esse direito annual se reporta), a fórmula é o “triplo da retribuição normal”, se houver prova do impedimento pelo empregador do gozo desses dias, como pressupõe expressamente a letra do seu art.° 24.°. Isto é, 3 x valor da remuneração diária média do ano de trabalho em consideração x número de dias de descanso annual vencidos mas não gozados. Pois, caso contrário, já há que aplicar analogicamente a fórmula do “dobro da retribuição normal” à situação objectiva de prestação de trabalho nos dias de descanso annual, I.e., sem qualquer impedimento por acção da entidade patronal do exercício do direito do gozo desse descanso, sob pena de flagrante injustiça relativa em confronto com a compensação do trabalho prestado em dias de descanso semanal.
36. Sob a égide do Decreto-Lei n.º 24/89/M, são seis dias de feriados obrigatórios “remunerados” por ano, sendo certo que a Lei n.º 8/2000, de 8 de Maio, que mantém igualmente em dez dias os feriados obrigatórios, deixa intocados esses mesmos seis dias de feriados obrigatórios “remunerados”, quais sejam, o Primeiro de Janeiro, os Três Dias do Ano Novo Chinês, o Primeiro de Maio e o Primeiro de Outubro.
37. E para cálculo da quantia a pagar ao trabalho prestado pelo “croupier” em feriados obrigatórios “remumerados” (ocorridos depois do período experimental dos primeiros três meses da sua relação de trabalho) sob a vigência do Decreto-Lei n.º 24/89/M, a fórmula é o “acréscimo salarial nunca inferior ao dobro da retribuição normal”, para além naturalmente da retribuição a que tem direito, caso tenha que trabalhar nesses feriados, a despeito da regra da dispensa obrigatória de prestação de trabalho (art.ºs 20.º, n.º 1, e 19.º, n.ºs 2 e 3), o que equivale, materialmente, ao “triplo da retribuição normal”, que se justifica, aliás, pelo especial significado desses dias que os tornou eleitos pelo próprio legislador como sendo feriados obrigatórios “remunerados”.
38. Entretanto, no âmbito do mesmo Decreto-Lei n.º 24/89/M, o “croupier” não pode reclamar a indemnização pelo trabalho prestado nos quatro dias de feriados obrigatórios “não remunerados”, uma vez que o n.º 2 do art.º 20.º deste diploma só prevê a indemnização do trabalho em feriados obrigatórios “não remunerados” prestado ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo, e já não também na situação da alínea c) do mesmo n.º 1.
39. O valor da paz social não está minimamente posto em causa, quando o tribunal se limita a decidir de acordo com a lei nos termos plasmados no art.º 7.º, n.ºs 1 e 3, do Código Civil de Macau, com natural abstracção das preocupações exclusivamente pessoais das partes em pleito.
- Insuficiência da matéria de facto
- Insuficiência da prova
- Questão de direito
- Cumplicidade
- Comparticipação
1. O vício de insuficiência da matéria de facto para a decisão tanto distingue da insuficiência da prova que não será sindicável por estar a pôr em causa à livre convicção do Tribunal, como distingue da qualificação jurídica dos factos que é questão de direito.
2. Trata-se de uma mera questão de direito, de qualificação jurídica dos factos provados a alegação que não existem factos para a condenação do arguido ora recorrente pela prática do crime de roubo qualificado em co-autoria, mas apenas roubo simples em cúmplice.
3. Para ser cúmplice, tem que satisfazer os seguintes requisitos:
- Prestação auxílio material ou moral;
- Age com dolo; e
- O objecto do auxílio é a prática de um facto doloso.
4. O facto de um dos arguidos não ter identificado como sendo agente de PJ, durante a execução do crime em conjuntos, não é uma actuação necessário para a sua comparticipação no crime.
Assunto: falta de fundamentação
É de julgar infundado o recurso contencioso interposto com fundamento na verificação do vício de falta de fundamentação por fundamentação deficiente, quando a fundamentação do acto administrativo recorrido se apresenta clara, concreta e precisa.
- Crime de abuso de poder
- Erro na apreciação da prova e convicção do julgador
1. O depoimento antecipado testemunha apenas pelo juiz titular do processo, por motivo de urgência, com reprodução do seu depoimento não põe em causa a imediação e o contraditório a realizar em sede de julgamento, bem podendo ser valorado por todos os juízes que integram o Colectivo.
2. Se não se demonstra uma desconformidade entre a realidade provada e a realidade documentada, o que se passa a pôr em causa é a convicção do Tribunal.
3. O bem jurídico protegido pela punição do crime de abuso de poder é a autoridade e credibilidade da Administração ao ser afectada a imparcialidade e eficácia dos seus serviços e o preenchimento do tipo legal pode ter lugar através do abuso de poderes ou da violação de deveres inerentes às funções do funcionário.
4. E é exigida a intenção de obter, para si ou para terceiro, benefício ilegítimo ou causar prejuízo a outra pessoa.
5. Pode-se concretizar como benefício toda a vantagem que o sujeito activo pretende retirar da sua actuação, e que em concreto poderá assumir natureza patrimonial ou não patrimonial.
6. A nulidade cominada pelo art.º 360º al. a) do CPP só se verifica quando os elementos constitutivos da fundamentação faltem de todo em todo e não quando constem apenas em termos insuficientes.
7. O vício de erro notório na apreciação da prova só existe “quando de forma patente, perceptível pelo cidadão comum, se verifique que se deram como provados factos incompatíveis entre si, ou quando se violam regras sobre o valor da prova vinculada ou as legis artis
8. O bem jurídico protegido no crime de abuso de poder, p.p. Pelo art. 347º do CPM, é a autoridade e a credibilidade da administração do Estado que serão prejudicadas quando a imparcialidade e a eficácia dos seus serviços forem afectadas.
- Emprego ilegal
- Insuficiência da matéria de facto para a decisão
- Medida da pena
1. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada só ocorrerá quando, da factualidade vertida na dita decisão, se colher faltarem elementos que, podendo e devendo serem indagados ou descritos, impossibilitem, por sua ausência, um juízo seguro (de direito) de condenação ou de não condenação. Questão esta que se aparta ligeiramente da questão relativamente às provas que deviam ser carreadas e não o foram para demonstração dos factos alegados.
2. São diferentes os critérios dos artigos 64º e 44º, n.º 1 do CP; no primeiro a preferência pela pena não privativa da liberdade está subordinada à conclusão (positiva) de que a mesma realiza por forma acentuada e suficiente as finalidades da punição e no segundo a normal substituição da prisão por multa é apenas obstaculizada pela conclusão (de maior rigor) de que a prisão é exigida pela necessidade de prevenir o cometimento de futuros crimes.
3. Os fins de prevenção geral estão previstos em diversas normas respeitantes à aplicação da pena concreta, assim nos artigos 40º, 64º e 65º do CP. Ora, o que é importante é não valorar duplamente em momentos diversos o mesmo factor a não ser que a sua incidência respeite a uma realidade diversa.
4. Não há um critério rígido de aplicação matemática ou computadorizada de uma determinada pena.
5. Embora o juízo sobre a suspensão venha a seguir à escolha e medida da pena concreta, a sua aplicação, por mais que se não queira, não deixará de ser balanceada com a pena primeiramente escolhida, nem que seja para a conferir e ajustar. São dificuldades que resultam da opção do legislador, para alguns autores, lamentavelmente, por um critério que mistura a culpa com a prevenção.
