Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/10/2002 156/2002 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “tráfico de estupefacientes”.
      Método proibido de prova (artº 113º do C.P.P.M.).
      Insuficiência da matéria de facto para a decisão.
      Medida da pena.
      Drogas “leves” e drogas “duras”.

      Sumário

      1. Quando a intenção do arguido de praticar reiteradamente o crime de tráfico de droga se forma com total liberdade, e a compra de droga montada pela polícia não provoca a actividade criminosa que este tem realizado, apenas a revelando inexiste recolha de prova mediante meio enganoso prevista na al. a) do nº 2 do artº 113º do C.P.P., nem se excede o âmbito permitido pelo disposto no artº 36º, nº 1 do D.L. nº 5/91/M.
      2. O vício de insuficiência define-se em função da matéria de facto tida por provada, com a sua inaptidão para a decisão de direito proferida, ou seja, quando do texto da decisão, não constam todos os factos pertinentes à subsunção no preceito legal por falta de apuramento de matéria.
      Todavia, ainda que ao arguido não tenha sido apreendida droga, nem se tenha apurado a quem vendeu, em que quantidades, a que preço, ou quantas vezes, pode o seu comportamento ser enquadrado como a prática de um crime de “tráfico de estupefacientes em quantidades não diminutas”.
      Com efeito, é irrelevante que não se tenha apurado no inquérito e no julgamento, a quem iria o arguido vender o produto, quando, em que local, etc, uma vez que tal circunstancialismo não integra os elementos objectivos do tipo criminal em questão.
      3. O tipo de droga (“leve” ou “dura”) apenas tem relevância para a fixação concreta da pena dentro da moldura abstracta desta, não significando que com base nela se deva (ou possa) proceder a uma atenuação especial.
      Na verdade, a distinção entre drogas “leves” e “duras” é expressamente afastada pelo legislador, consignando, no preâmbulo do D.L. nº 5/91/M, que «não se acolhe, desde logo, qualquer postura de permissividade do consumo de drogas, designadamente das ditas “drogas leves” … ».

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/10/2002 174/2002 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      Livrança
      Juro moratório
      Taxa de juro aplicável à livrança
      Relação entre o direito interno e o direito internacional

      Sumário

      I. Juro, genericamente, é a compensação pecuniária devida pela utilização temporária de um capital alheio. Para além da quantia em dívida deve o executado pagar os juros pela mora no seu pagamento, juros estes que se não devem confundir com os juros convencionais que são os estipulados pela remuneração do capital.
      II. A aplicação na RAEM dos acordos internacionais, em que a República Popular da China é parte, é decidida pelo Governo Popular Central, conforme as circunstâncias e segundo as necessidades da Região e depois de ouvir o parecer do governo da RAEM (parágrafo 1º do artigo 138° da Lei Básica) e os acordos internacionais previamente em vigor em Macau, em que a República Popular da China não é parte, podem continuar a aplicar-se na RAEM (parágrafo 2º do artigo 138° da Lei Básica).
      III. Verificando-se a publicação na RAEM, a notificação à entidade depositária pelo governo central da R.P.C., entende-se que se verificam todos os requisitos para se considerar em vigor no ordenamento de Macau a Convenção de Genebra, independentemente da incorporação do seu conteúdo no direito interno.
      IV. Na eventualidade de um conflito entre o direito internacional resultante das convenções e o direito interno, as convenções internacionais aplicáveis à RAEM prevalecem sobre a lei ordinária interna.
      V. Uma vez preenchidos os necessários requisitos, o direito internacional toma-se automaticamente parte da ordem jurídica da RAEM e, portanto, é aplicado exactamente nos mesmos termos em que o é a demais legislação.
      VI. A taxa para o devedor em sede de letras e livranças estabelecida em 6% perspectiva já um juro moratório.

       
      • Votação : Com declaração de voto
      • Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/10/2002 48/2002 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      – processo de execução
      – art.º 375.º, n.º 1, do CPC
      – art.º 817.º, n.º 1, al. c), do CPC e sua ratio legis
      – modo de subida dos recursos retidos
      – art.º 395.º, n.º 1, do CPC e sua aplicação teleológica
      – indeferimento liminar da acção
      – indeferimento por questões formais
      – indeferimento por questões de mérito
      – recorribilidade das decisões de indeferimento liminar
      – princípio da audiência contraditória
      – art.º 583.º do CPC
      – critério da alçada
      – critério do valor da sucumbência

      Sumário

      1. Os art.°s 816.° e 817.° do CPC são normas próprias do processo de execução, pelo que as disposições reguladoras do processo de declaração incluindo as relativas à matéria de recurso que se mostram compatíveis com a natureza da acção executiva só se aplicam ao processo executivo a título subsidiário e com as necessárias adaptações nos casos da lacuna daquelas (cfr. O art.° 375.°, n.° 1, do mesmo CPC).
      2. A norma do art.° 817.°, n.° 1, al. c), do actual CPC deve ser interpretada e aplicada no sentido de que os recursos retidos aí em causa devem subir nos próprios autos da acção executiva.
      3. É que o legislador, ao mandar subir os recursos retidos por força da al. c) do n.° 1 do art.° 817.° em dois momentos distintos que correspondem respectivamente à conclusão da fase de penhora e da de venda, pretende exactamente que a legalidade de despachos judiciais proferidos no decurso de cada uma dessas duas fases da execução seja apreciada em termos concentrados de modo a implicar o mínimo de perturbação possível ao prosseguimento da execução, atenta a inevitável repercussão da decisão final do recurso nos termos da marcha da fase processual subsequente.
      4. O art.° 395.°, n.° 1, do CPC dispondo que do despacho de indeferimento cabe recurso ordinário ainda que o valor da causa esteja contido na alçada do tribunal de primeira instância é considerada dotada de natureza excepcional em relação à regra geral da limitação da interposição de recurso pelo critério da alçada do tribunal autor da decisão de que se pretende recorrer, vertida na primeira parte do n.° 1 do art.° 583.° do CPC.
      5. Contudo, a mesma norma do n.° 1 do art.° 395.° do CPC não afasta sempre a regra geral da limitação da interpretação de recurso pelo critério cumulativo do valor da sucumbência, exigido também no n.° 1 do art.° 583.° do mesmo Código, posto que na sua letra só está escrito “ainda que o valor da causa esteja contido na alçada do tribunal de primeira instância”.
      6. Na verdade, a ratio legis da norma do n.º 1 do art.º 395.º do CPC consiste em salvaguardar a possibilidade de impugnação de decisões de indeferimento liminar tomadas natural e necessariamente sem satisfação ao princípio da audiência contraditória, ou sem a instrução nem a discussão da causa.
      7. Assim, para a sua aplicação, e como tese geral, há que distinguir dois grupos de indeferimento liminar: o primeiro, representado por indeferimento liminar da acção por questões formais, por exemplo, por falta manifesta de verificação de algum pressuposto processual (por exemplo, nos casos previstos no art.° 394.°, n.° 1, al. a), b) e c), do CPC); e o segundo, traduzido por indeferimento liminar por mérito (quando o juiz entende maxime que lhe é evidente que a pretensão do autor não pode proceder, ao que alude o art.° 394.°, n.° 1, al. d), do CPC).
      8. Para o primeiro grupo, como o indeferimento liminar não faz caso julgado quanto ao mérito do direito alegado pelo autor, já que este pode intentar sempre nova acção e até ao abrigo do benefício do art.° 396.° do CPC, corrigindo os defeitos da petição da acção anteriormente indeferida para rogar o seu mesmo direito, só é admissível recurso ordinário da decisão de indeferimento caso esta importe um prejuízo ao autor pelo menos superior à metade da alçada do tribunal recorrido, mantendo-se, pois, o critério geral do valor da sucumbência, visto que a aludida ratio legis do n.° 1 do art.° 395.° do CPC já não se aplica.
      9. Entretanto, já quanto ao segundo grupo de indeferimentos in limine por juízo de mérito, como as decisões em questão importam a formação de caso julgado sobre o mérito da causa, a exigência da observância do critério do valor da sucumbência na interposição de recursos já vai comprometer irremediavelmente a ratio legis do n.° 1 do art.° 395.° do CPC, pelo que teleologicamente interpretando, é de afastar neste grupo de casos o aludido critério do valor da sucumbência, mesmo que a letra dessa mesma norma não o diga expressamente.
      10. Daí, aliás, se compreende que tal como se afirma na segunda parte do n.° 2 do art.° 395.° do CPC, a procedência do recurso do despacho de indeferimento liminar relacionado com a al. d) do n.° 1 do precedente art.° 394.° só assegura o seguimento da causa, e já não a procedência da acção, visto que a procedência do mérito depende do desenvolvimento da lide com a observância do princípio da audiência contraditória na instrução e discussão da causa.
      11. Assim sendo, tirando os casos aplicáveis e expressamente ressalvados pelo n.° 2 do art.° 583.° do CPC, da exigência dos duplos critérios do valor da alçada e do valor da sucumbência previstos na regra geral do n.° 1 do mesmo artigo, não faz nenhum sentido ao Tribunal de Segunda Instância, à luz do direito processual civil actualmente positivado e à balança entre os custos a incorrer para a Máquina Judiciária e a utilidade económica concreta a advir do recurso, admitir e conhecer o recurso ordinário do despacho de indeferimento não motivado por juízo de mérito que não acarrete à parte autora recorrente prejuízo pecuniário, pelo menos, superior à metade da alçada do tribunal do qual se pretende recorrer.
      12. Se o juiz a quo apenas indeferiu liminarmente a execução de alguma parcela de montantes pedidos no requerimento inicial ao abrigo de um mesmo título executivo, por entender não estar a parte do montante em causa coberta pela força executiva do mesmo título, é de entender que o indeferimento liminar na parte em causa foi motivado por uma questão formal por falta de um pressuposto processual traduzida na inexistência de um título que confira exequibilidade àquela mesma parcela pecuniária, e, portanto, não será admissível recurso ordinário da mesma decisão a quo caso a quantia indeferida em questão não seja superior à metade da alçada do tribunal recorrido, o que não impede que venha a ser intentada outra acção executiva visando a mesma parcela, com base de um outro título executivo bastante relativo à mesma.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/10/2002 103/2002 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Apoio Judiciário
      - Insuficiência económica

      Sumário

      O requerente do apoio judiciário na modalidade da dispensa de custas, que não beneficia da presunção da insuficiência económica, deve demonstrar que está na situação de insuficiência económica, e por isso, não são suportáveis as custas resultadas do processo.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Choi Mou Pan
      • Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/10/2002 194/2002 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Recurso Penal.
      Motivação e Conclusões.
      Insuficiência da matéria de facto para a decisão.
      “Crime de comércio de cópias ilícitas de fonogramas e videogramas” (artº 212º do D.L. nº 43/99/M).
      Contradição insanável da fundamentação.

      Sumário

      1. Atento o disposto no artº 402º do C.P.P.M., os recursos devem ser motivados, entendendo-se por tal, a elaboração de uma peça obrigatoriamente integrada pela enunciação especificada dos respectivos fundamentos e pelas conclusões, deduzidas por artigos, onde, sob pena de rejeição, o recorrente resume ou sintetiza as razões do seu pedido.
      Nesta conformidade, as conclusões devem limitar-se a ser um resumo dos fundamentos invocados no contexto da motivação, pelo que, assim como irrelevante é a matéria alegada mas não incluída nas conclusões, irrelevante é também o que se apresenta como síntese do que não existe na motivação.
      2. O vício de insuficiência define-se em função da matéria de facto tida por provada, com a sua inaptidão para a decisão de direito proferida, ou seja, quando do texto da decisão, não constam todos os factos pertinentes à subsunção no preceito legal por falta de apuramento de matéria.
      Tendo resultado provado que o arguido (ora recorrente) pôs à venda CD e VCD contrafeitos, agindo livre e conscientemente, com conhecimento da natureza de tais produtos e da ilicitude da sua conduta, inquestionavelmente, deve a sua conduta ser punida nos termos do artº 212º , nº 1 do D.L. nº 43/99/M, como autor de um crime de “comércio de cópias ilícitas de fonogramas e videogramas”, sendo patente a inexistência do imputado vício de “insuficiência”.
      3. Só existe contradição insanável quando se verifica incompatibilidade entre os factos dados como provados bem como entre estes e os não provados, assim como entre a fundamentação probatória da matéria de facto e da decisão.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong