Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 20/10/2011 175/2010 Recurso em processo penal
    • Assunto

      – homem de confiança
      – método proibido de prova
      – tráfico de estupefaciente
      – crime de perigo abstracto ou presumido
      – art.o 113.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal

      Sumário

      1. A figura de homem de confiança, no seu conceito extensivo, abrange todas as testemunhas que colaboram com as instâncias formais da perseguição penal, tendo como contrapartida a promessa da confidencialidade da sua identidade e actividade.
      2. Cabem neste conceito lato tanto os particulares (pertencentes ou não ao submundo da criminalidade) como os agentes das instâncias formais, nomeadamente da polícia (Untergrundfahnder, under cover agent, agentes encobertos ou infiltrados), que disfarçadamente se introduzem naquele submundo ou com ele entram em contacto; e quer se limitem à recolha de informações (Polizeispitzel, detection), quer vão ao ponto de provocar eles próprios a prática do crime (polizeiliche Lockspitzel, agent provocateur, entrapment).
      3. Como ponto de partida, o recurso ao homem de confiança configurará normalmente um meio enganoso. Entretanto, isto não significa que o recurso ao homem de confiança esteja, sempre e sem mais, a coberto de proibição de prova, nos termos do art.o 113.o, n.o 2, alínea a), do Código de Processo Penal de Macau.
      4. É, por exemplo, de sustentar a inadmissibilidade e, por isso, a coberto de estrita proibição de prova, da intervenção do homem de confiança com propósitos e para fins unicamente repressivos: isto é, exclusivamente preordenada à repressão de crimes já consumados, em homenagem nomeadamente à ideia duma administração eficaz da justiça penal.
      5. Mas, já é admissível a intervenção do homem de confiança sempre que se pretender através dela prosseguir finalidades exclusiva ou prevalentemente preventivas, pelo menos em relação a perigos concretos e imediatos de atentado contra a vida ou a perigo correspondente de sacrifício grave da integridade física de terceiros. Será, concretamente assim sempre que a perseguição de eventuais agentes, lograda através do homem de confiança, se integre em programas de repressão e desmantelamento do terrorismo, da criminalidade violenta ou altamente organizada.
      6. Sendo certo que, por princípio, apenas deverão ter-se como proibidos os meios enganosos susceptíveis de colocar o arguido numa situação de coacção idêntica à dos demais métodos proibidos de prova. Este deverá ser, pelo menos, o critério privilegiado para a equacionação e superação dos casos mais duvidosos.
      7. O crime de tráfico de estupefaciente (nomeadamente previsto no então Decreto-Lei n.º 5/91/M, de 28 de Janeiro, e hoje na homóloga Lei n.o 17/2009, de 10 de Agosto) é um crime de perigo abstracto ou presumido, no sentido de que para cuja consumação não se exige a existência de um dano real e efectivo, mas sim basta a simples criação de perigo ou risco de dano para o bem protegido, qual seja, o da saúde pública, na dupla vertente física e moral das pessoas.
      8. No caso concreto dos autos, a intervenção, sob o plano previamente montado pela polícia, de um arguido como homem de confiança na captura ulterior de um outro arguido pela prática de actos integradores do crime de tráfico de estupefaciente, é legalmente admissível, porque esse plano foi preordenado prevalentemente às finalidades preventivas em relação ao cometimento de um crime de perigo abstracto contra a saúde pública na sua dupla vertente física e moral, e até porque o meio em causa não foi susceptível de colocar este último arguido numa situação de coacção idêntica à dos demais métodos proibidos de prova previstos no n.o 2 do art.o 113.o do Código de Processo Penal, para a prática do tráfico de substância estupefaciente em causa, já que este arguido sempre estava disposto a traficar essa substância a outras pessoas, por método semelhante (I.e., receber “encomenda” por via telefónica, e depois, entregar a “mercadoria” ao comprador), sendo-lhe indiferente ser essa pessoa compradora aquele arguido que colaborou com a polícia como homem de confiança, a telefonar para lhe pedir compra de estupefaciente, daí que não se pode dizer que foi esse arguido “instigado” à prática de um crime que, não for a o plano da polícia (executado com o auxílio do dito homem de confiança), jamais teria cometido.

       
      • Votação : Com declaração de voto
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dra. Tam Hio Wa
      •   Dr. José Maria Dias Azedo
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 20/10/2011 593/2011 Recurso em processo penal
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      • Votação : Com declaração de voto
      • Relator : Dra. Tam Hio Wa
      • Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
      •   Dr. Chan Kuong Seng
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 13/10/2011 567/2011 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “furto”.
      “Espaço fechado” (veículo automóvel).
      Atenuação especial.

      Sumário

      1. Não é de considerar como “espaço fechado” um veículo automóvel.

      2. O elemento “outro espaço fechado” previsto no art.º 198.°, n.° 2, al. E) do Código Penal deve ser entendido no âmbito da mesma alínea e das definições legais de arrombamento e escalamento constantes das al.s d) e e) do art.º 196.º do mesmo Código, ou seja, como espaço fechado semelhante à habitação, ao estabelecimento comercial ou industrial, ou dependente de um destes tipos de «casa».

      3. A atenuação especial só pode ter lugar em casos “extraordinários” ou “excepcionais”, ou seja, quando a conduta em causa se apresente com uma gravidade tão diminuída que possa razoavelmente supor-se que o legislador não pensou em hipóteses tais quando estatuiu os limites normais da moldura cabida ao tipo de facto respectivo.

       
      • Votação : Com declaração de voto vencido
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dra. Tam Hio Wa
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 13/10/2011 742/2009 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Falta de citação
      - Convicção do tribunal

      Sumário

      - Há falta de citação quando se mostre que foi efectuada depois da morte do citando.
      - A citação por éditos de pessoa certa só tem lugar quando a citação pessoal for infrutífera, daí que os herdeiros do falecido nunca podem ser considerados como citados por éditos sem ter sido realizada a respectiva citação pessoal.
      - Não é susceptível de alteração a matéria de facto fixada em 1ª instância quando resulta da livre convicção do tribunal, com apreciação devida das provas legalmente admissíveis e com respeito das regras de experiência comum.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Ho Wai Neng
      • Juizes adjuntos : Dr. José Cândido de Pinho
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 13/10/2011 477/2011 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Acidente de trabalho
      - Presdisposição patológica; hipertensão
      - Presunção do acidente de trabalho
      - Presunção do resultado lesivo como consequência do acidente de trabalho

      Sumário

      1. Do conjunto dos artigos 3º, n.º 1, a), 8º e 10º, n.º 1, a), do DL40/95/M decorre uma dupla presunção, não só da verificação de um acidente de trabalho, mas ainda entre o nexo causal entre as lesões observadas no local e tempo de trabalho e o resultado incapacidade e/ou morte.

      2. Assim, se um trabalhador foi limpar um ar condicionado, no tempo e local de trabalho, trabalho de acid cleaner, envolvendo o manuseameto de ácido clorídrico, e foi encontrado desmaiado, vindo a morrer por ruptura de vasos cerebrais, embora sofresse de hipertensão, não estando comprovado que esta predisposição patológica tenha sido a causa única do acidente, presume-se mais do que a simples relação causal entre o acidente (ocorrência lesiva) e as lesões, devendo partir-se da lesão observada para presumir-se todo o «acidente de trabalho» enquanto facto jurídico complexo, apto a desencadear o direito à reparação.

      3. Presumir-se-á que as lesões que conduziram à morte foram consequência do acidente de trabalho, cabendo ao empregador (ou sua seguradora) a prova do contrário, p. ex., que foi agredido ou acometido de doença súbita.

       
      • Votação : Com declaração de voto vencido
      • Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      • Juizes adjuntos : Dr. Ho Wai Neng
      •   Dr. José Cândido de Pinho