Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/02/2003 72/2000 Recurso de decisões jurisdicionais em matéria administrativa, fiscal e aduaneira
    • Assunto

      – Interpretação do acto recorrido;
      – Legitimidade activa;
      – Ratificação;
      – Responsabilidade dos gerentes pelo pagamento de multas da sociedade por infracções administrativas por esta praticadas.

      Sumário

      1. Na interpretação do acto praticado, entre outros elementos, importa atender aos fins visados, à qualidade e extensão dos efeitos jurídicos, aos termos utilizados, ponderar a natureza do acto (seu tipo legal), as circunstâncias em que a vontade foi manifestada, os elementos constantes do processo administrativo e o interesse público subjacente.

      2. O recorrente é o titular de um interesse directo, pessoal e legítimo: interessado é aquele que pode e espera obter um benefício com a destruição dos efeitos do acto recorrido; esse interesse é directo quando se repercute imediatamente; pessoal, quando tal repercussão ocorre na esfera jurídica do próprio recorrente; legítimo, quando é valorado positivamente pela ordem jurídica enquanto interesse do recorrente.

      3. No caso de aplicação de multas a uma sociedade por prática de uma infracção administrativa é esta que detém prima facie legitimidade para recorrer.

      4. A ratificação é o acto que exprime uma declaração de vontade pela qual alguém faz seu, ou chama a si, o negócio realizado por outrem em seu nome, mas sem poderes de representação.

      5. As partes ficam, em termos de direito processual comum, identificadas no começo da acção, através da petição inicial e outras pessoas ou entidades podem assumir essa qualidade no decurso da acção por terem um interesse paralelo ao do autor ou do réu em relação ao objecto da causa. E no que tange ao direito processual administrativo, ao lado do conceito de parte principal só os assistentes podem intervir desde que demonstrem um interesse legítimo idêntico ao da parte assistida ou com ele conexo, como decorre do artigo 49º do R.S.T.A., não prevendo a lei outras figuras de intervenção de terceiros para além da figura do assistente.

      6. A lei aplicável a uma dada infracção administrativa é a lei que responsabilizou substantivamente os gerentes, de forma subsidiária , a partir de 21 de Dezembro de 1998, afastando a responsabilidade solidária (consagrada na anterior redacção, em vigor à data da prática da infracção), esta manifestamente mais gravosa, por força das regras e princípios da aplicação da lei penal e contravencional, mutatis mutandis, regime das infracções administrativas, sendo, por conseguinte, de optar pela lei mais favorável – artigos 44º do DL 66/95/M de 18/Dez., 1º, 2º e 3º, nº3 do DL 52/99/M de 4/Out..

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/02/2003 78/2001 Recurso contencioso (Processo administrativo de que o TSI conhece em 1ª Instância)
    • Assunto

      – direito de audiência e defesa
      – art.ºs 93.º e 94.º do Código do Procedimento Administrativo
      – pedido de fixação de residência em Macau
      – competência do Secretário para a Segurança da R.A.E.M.
      – princípio do inquisitório
      – erro nos pressupostos de facto subjacentes à decisão

      Sumário

      1. A audiência dos interessados, prevista no art.º 93.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA) para os procedimentos administrativos em geral, constitui, juntamente com o princípio da participação enunciado no art.º 10.º daquele diploma legal, a concretização do modelo de Administração aberta, que impõe a participação nomeadamente dos particulares na formação das decisões que lhes digam respeito.

      2. Assim sendo, antes de ser tomada a decisão final do procedimento, os particulares devem ter acesso, através de notificação própria, a todos os elementos necessários para que fiquem a conhecer todos os aspectos relevantes para a decisão, devendo ser informados, nomeadamente sobre o sentido provável desta (cfr. art.ºs 93.º, 94.° e 95.° do CPA).

      3. É claro que essa exigência não pode ser erigida como regra absoluta e universal em todas as situações em que a Administração tem o dever de tomar uma decisão, inexistindo ou sendo a mesma dispensável, nos casos expressamente consignados nos art.ºs 96.º e 97.º do CPA.

      4. Aliás, existem, por outra banda, situações em que o princípio da audiência dos ineressados assume dimensão qualificada, já que está em causa o direito de defesa, sendo o que acontece nos processos de natureza disciplinar ou sancionatória, que têm como consequência a restrição ou eliminação dos direitos dos administrados ou a aplicação de sanções.

      5. Entendimento e procedimento esses que devem valer também para os não residentes de Macau.

      6. Se não estiver em causa regime ou procedimento de infracções administrativas, nem qualquer processo sancionatório, a postergação absoluta do direito de audiência e defesa do particular, a verificar-se efectivamente, gerará ainda a anulabilidade do acto administrativo que dele enfermar a título de vício de forma, nos termos gerais consagrados no art.º 124.º CPA.

      7. O Secretário para a Segurança da R.A.E.M. É competente para decidir dos pedidos de fixação de residência em Macau, formulados ao abrigo do Decreto-Lei n.º 55/95/M, de 31 de Outubro.

      8. Cabe à Administração, no respeito pelo princípio do inquisitório ou da oficialidade, averiguar ou testar a validade dos pressupostos de facto subjacentes à sua decisão, por forma a obter um conhecimento efectivo e o mais profundo possível da situação.

      9. Ocorrendo erro nos pressupostos de facto subjacentes à decisão, é de anular o acto administrativo que dele padeça.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/02/2003 246/2002 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Embargos de terceiro. Pressupostos.
      - Contrato promessa de compra e venda.
      - Posse do promitente comprador.

      Sumário

      1. Podendo a apreensão ou entrega de bens ser judicialmente ordenada sem a prévia audiência do requerido, (como pode suceder com o arresto; cfr. artº 353º do C.P.C.M.), e assim, sem uma prévia indagação sobre a titularidade dos mesmos, pretendeu-se com o instituto dos “embargos de terceiro”, facultar-se um meio expedito de oposição com a finalidade de evitar tal apreensão ou entrega. Na base da configuração dos embargos de terceiro como “acção possessória”, está pois a vontade de se prever um meio sumário para a rápida tutela do direito afectado.

      2. Qualificados como “meio de tutela judicial da posse”, os embargos de terceiro tem como pressuposto, a existência de uma situação de “posse” (ou de “outro direito incompatível”), a qualificação do titular da dita situação como “terceiro”, e a origem judicial do acto ofensivo àquela.

      3. Em contrato promessa de compra e venda de imóvel, a tradição da coisa para o promitente-comprador acompanhada de factos que traduzam o “aminus sibi habendi”, transfere a respectiva posse para este, sem necessidade de registo, podendo ele defender a sua posse mediante embargos de terceiro.

      4. Na verdade, o promitente-comprador que, com base no contrato celebrado, e na previsão da futura outorga do contrato de compra e venda prometido, toma conta do prédio e nele pratica actos correspondentes ao exercício do direito de propriedade, sem que o faça por mera tolerância do promitente-vendedor, não procede com a intenção de agir em nome do promitente-vendedor, mas com a de agir em seu próprio nome, como se a coisa fosse já sua.

      Assim, sendo possuidor em nome próprio (e não mero detentor), e visto até que a tal “posse” se refere o preceituado no artº 292º nº 1 do C.P.C.M. E o artº 1210º do C.C.M., pode pois – desde que possua a qualidade de “terceiro” – servir-se do (agora) incidente de “embargos de terceiro” para defender a sua posse sobre o imóvel.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 21/02/2003 241/2002 Recurso em processo penal
    • Assunto

      Crime de “tráfico de estupefacientes”.
      (Detenção de produto estupefacietne sem finalidade de consumo próprio.)
      Medida da pena.

      Sumário

      1. Provando-se em julgamento, que o arguido detinha produto estupefaciente em “quantidade não diminuta” e “sem a finalidade de o empregar para consumo próprio”, provada está a sua prática como autor de um crime de “tráfico” do artº 8º do D.L. nº 5/91/M visto que, este preceito, não pune apenas o “tráfico stricto sensu”, mas também outras “actividades”, inclusivé, a “detenção de produto estupefaciente for a dos casos previstos no artº 23º”, que pune, específicamente, a “detenção para consumo”.
      2. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu artº 65º, a “Teoria da margem da liberdade”, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.
      3. A “atenuação especial da pena” prevista no artº 18º do D.L. nº 5/91/M, implica, como pressuposto factual, que tenha o arguido agido nos termos aí prescritos, nomeadamente, que tenha colaborado ou auxiliado “concretamente na recolha de provas para a identificação ou captura de outros responsáveis …”.
      4. A pena de oito anos e seis meses de prisão fixada a um arguido autor de um crime de “tráfico” punível com pena de oito a doze anos de prisão, não viola o “princípio da proporcionalidade das penas”.

       
      • Votação : Com declaração de voto
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 20/02/2003 23/2003 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      – processo de falência
      – requerimento de declaração da falência e sua instrução
      – indeferimento do requerimento por deficiência de instrução

      Sumário

      1. Os documentos exigidos em diversas alíneas do n.° 2 do art.° 1048.° do Código de Processo Civil de Macau (CPC) são essenciais para a instrução do requerimento de declaração da falência, cuja pura falta ou deficiência no seu conteúdo constitui obstáculo à tramitação dos termos subsequentes do processo especial de falência.

      2. Não cabe ao tribunal elaborar as relações exigidas no n.º 2 do art.º 1048.º do CPC, ao arrepio da letra e do espírito da norma do n.º 4 do art.º 1085.º do mesmo diploma.

      3. Se o empresário comercial participante da sua falência, após notificado pelo tribunal para dar cumprimento ao n.º 2 do art.º 1048.º do CPC, continuar a não conseguir satisfazer toda a exigência desta norma, é de indeferir o requerimento de declaração da falência, aliás em prol do princípio da proibição da prática de actos processuais inúteis consagrado no art.º 87.º do CPC, sem prejuízo da possibilidade de aplicação àquele do benefício atribuído pelo art.º 396.º do mesmo diploma adjectivo.

      4. O art.º 1049.º, n.º 1, do CPC tem apenas por escopo determinar o conteúdo da decisão liminar a tomar pelo juiz caso esta seja positiva, e já não no caso de este entender, por exemplo, que o requerimento de declaração de falência tenha que ser indeferido in limine ou corrigido, nos termos gerais prescritos no art.º 394.º, n.º 1, e no art.º 397.º do CPC, respectivamente, e aplicáveis subsidiariamente aos processos especiais por força do art.º 372.º, n.º 1, do mesmo Codigo.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dr. João A. G. Gil de Oliveira
      •   Dr. Lai Kin Hong