Acórdãos

Tribunal de Segunda Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 07/02/2002 237/2001 Recurso em processo penal
    • Assunto

      - Crime de abuso de liberdade de imprensa.
      - (“Difamação através de meios de comunicação social”).
      - Determinação da medida da pena.
      - Pena acessória. Caução de boa conduta.
      - Indemnização civil por danos não patrimoniais.

      Sumário

      1. Na determinação da medida da pena, adoptou o Código Penal de Macau no seu artº 65º, a teoria da margem da liberdade, segundo a qual, a pena concreta é fixada entre um limite mínimo e um limite máximo, determinados em função da culpa, intervindo os outros fins das penas dentro destes limites.

      A liberdade atribuída ao julgador na determinação da medida da pena não é arbitrariedade, é antes, uma actividade judicial jurídicamente vinculada, uma verdadeira aplicação de direito

      2. A caução de boa conduta, como pena acessória que é, constitui uma sanção ligada ao facto e à culpa do agente, assumindo-se como adjuvante da função da pena principal, reforçando e diversificando o conteúdo sancionatório da condenação.

      3. A indemnização por danos morais tem como objectivo proporcionar um “conforto” ao ofendido a fim de lhe aliviar os sofrimentos que a lesão lhe provocou ou, (se possível), lhos fazer esquecer. Visa, pois, proporcionar ao lesado momentos de prazer ou de alegria, em termos de neutralizar, na medida do possível, o sofrimento moral de que padeceu.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Chan Kuong Seng
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 07/02/2002 241/2001 Recurso em processo penal
    • Assunto

      - Cúmulo das penas

      Sumário


      1. O artigo 71º é a regra geral da punição do concurso de crimes, enquanto o artigo 72º prevê uma excepção a essa regra, ou seja o artigo 71º nº 1 prevê o concurso de infracções conhecido antes de julgada, pelo menos, uma delas, e o artigo 72º nº 1 prevê o concurso de infracções conhecido depois de julgadas todas, desde que não esteja cumprida, prescrita ou extinta, pelo menos, uma dessas infracções.

      2. Não há que proceder a cúmulo com pena cuja execução foi suspensa, se a primeira condenação for anterior à prática dos factos do segundo processo.

      3. Embora constem dos presentes autos factos respeitantes a um dos crimes acusados que foram praticados antes da data das anteriores condenações, e estaria em condição, por si só, para o dito cúmulo, não pode efectuar tal cúmulo, porque um outro crime acusado foi praticado posterior à data daquelas condenações, e porque não se pode abster de proceder a cúmulo das penas aplicadas aos crimes em concurso real no presente processo.

       
      • Votação : Com declaração de voto vencido
      • Relator : Dr. Choi Mou Pan
      • Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/01/2002 57/2001 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Regime do Arrendamento Urbano (Lei n.º 12/95/M, de 14/8)
      - Acção de despejo por falta de pagamento de renda
      - Depósito condicional e regime do seu levantamento
      - Art.ºs 54.º e 55.º do Regime do Arrendamento Urbano
      - Banco como Caixa de Tesouro da R.A.E.M.
      - Pagamento de precatório-cheque do tribunal

      Sumário

      1. Estando em causa o depósito condicional, antes do e para o seu levantamento é necessário que haja decisão judicial nos termos do art.º 55.º, n.º 1, do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 12/95/M, de 14 de Agosto, o qual, por sua vez, concretiza e limita o âmbito de aplicação do seu art.º 54.º.

      2. É que no depósito condicional, o arrendatário está convencido de que não existe a mora solvendi, isto é, de que não lhe é imputável a falta de pagamento da renda; mas como o senhorio lhe imputa essa falta e pode acontecer que o tribunal decida nessa conformidade, deposita, por cautela, a indemnização legal, subordinando o depósito à condição de vir a julgar-se que estava em mora.

      3. Assim, se o arrendatário não se apressou nomeadamente a depositar condicionalmente a indemnização legal, pode o senhorio propor acção de despejo por falta de pagamento da renda.

      4. E a questão não poderá, naturalmente, ser arrumada no despacho saneador, visto depender da averiguação de factos que ainda não se acham provados na altura desse despacho; na sentença final decidirá o juiz se o autor conseguiu provar o fundamento alegado: a mora do arrendatário no pagamento da renda.

      5. No caso afirmativo, julga a acção procedente, autoriza o senhorio a levantar a totalidade do depósito, mas não decreta o despejo: o arrendamento subsiste, em consequência do depósito da indemnização legal.

      6. No caso negativo, julga improcedente a acção, autoriza o senhorio a levantar a importância correspondente às rendas simples em dívida, considerando-o pago, e atribue ao arrendatário o resto da quantia depositada.

      7. É, pois, nesse sentido que se deve interpretar o disposto no n.º 2 do art.º 54.º e nos n.ºs 2 e 3 do art.º 55.º do Regime do Arrendamento Urbano.

      8. Qualquer dos bancos que age na qualidade de Caixa de Tesouro da R.A.E.M. Nunca pode, sob pena de comprometer gravemente a imagem e autoridade dos seus tribunais e incumprir a sua função de Caixa de Tesouro, recusar o pagamento ordenado num precatório-cheque devida e legalmente emitido por um tribunal local, com argumento de que a conta a que se refere o precatório-cheque em causa já não tenha provisão para o pagamento, devido a um processamento de levantamento da mesma por outrem feito pelo banco mas sem decisão ou ordenação anterior nesse sentido – como tal exigida por lei – do tribunal à ordem do qual o depósito dessa provisão tenha sido feito.

      9. Assim, quem pagou mal tem que pagar duas vezes, sem prejuízo do seu direito de regresso contra quem tiver sido por ele pago indevidamente antes.

      10. Aliás, o banco, como Caixa do Governo (lato sensu), não pode sindicar o valor e força do precatório-cheque validamente passado pelo tribunal, tal como não pode, em outro plano, mesmo na qualidade de banco comercial, sindicar o valor e força de um cheque normal validamente passado por um particular a favor de outro.

      11. Coisa bem diferente já é o caso de o tribunal, por lapso ou falha sua, não se apercebendo do saldo exacto da conta em causa, emitir, na mesma, um precatório-cheque sem provisão ou cobertura por mão própria.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Chan Kuong Seng
      • Juizes adjuntos : Dr. Sebastião José Coutinho Póvoas
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/01/2002 210/2001 Recurso em processo civil e laboral
    • Assunto

      - Acção executiva.
      - Título de crédito. Livrança.
      - Juros de mora.
      - Taxa legal.

      Sumário

      1. Toda a execução tem por base um “título” pelo qual se determina o seu fim – pagamento de quantia certa, entrega de coisa certa ou, prestação de um facto – bem como os seus limites objectivos – quantia exequenda, identidade da coisa a entregar ou, especificação do facto a prestar – e subjectivos – exequente(s) e executado(s).

      2. Uma livrança constitui um título de crédito contendo uma promessa de pagamento, pela qual uma (ou mais) pessoa(s) – o emitente, subscritor – se compromete(m) para com outra(s) – tomador ou portador – a pagar-lhe(s) determinada importância em certa data.

      E, atento ao disposto no artº 677º, alínea c) e d) do C.P.C.M. (aqui aplicável), e ao preceituado nos art.os 48º e 77º da Lei Uniforme sobre Letras e Livranças, (estabelecida pela Convenção de Genebra de 07.07.1930, publicada no B.O. Nº 6 de 08.02.1960 e aqui aplicável por força do estatuído no artº 4º do D.L. Nº 40/99/M de 3 de Agosto que, aprovando o Código Comercial de Macau, nele a incorporou), constitui a livrança, “título executivo” adequado.

      3. Pode o portador de uma livrança, reclamar daquele contra quem exerce o seu direito de acção, o montante da mesma (com juros se assim tiver ficado acordado, calculados à taxa indicada no título e devidos desde a data do saque à do vencimento), assim como, os juros de mora e outras despesas (nas quais se incluem, nomeadamente as despesas dos avisos, protesto e imposto do selo).

      4. Os mencionados “juros de mora” não se identificam com os (apelidados de) “remuneratórios”. Estes, destinam-se a compensar o mutuante ou credor pela cedência de capital, pelo empréstimo feito, (isto é, o juro é aqui o “rendimento do capital”, visando, aqueles – os de mora – a ressarcir o prejuízo causado pelo atraso no pagamento de uma prestação em dinheiro: é o juro a pagar pelo não cumprimento pontual e culposo de uma obrigação, funcionando como indemnização do prejuízo respectivo.

      5. Vigorando nesta R.A.E.M., um diploma específico quanto à “taxa de juro legal”, a Lei nº 4/92/M de 6 de Julho – in B.O. Nº 27 de 06.07.92, que para além de não ter sido revogada pelo C.C.M., foi pelo mesmo, expressametne mantida, (vd., artº 3º, nº 2 do D.L. Nº 40/99/M) – o qual, no seu artigo 3º, prescreve que “o portador de letras e livranças ou cheques, quando o respectivo pagamento estiver em mora, pode exigir que a indemnização correspondente a esta consista nos juros legais”, o mesmo acontecendo com o artº 5º do dito D.L. Nº 40/99/M, o qual, de forma ainda mais explícita, dispõe que “o portador de letras, livranças e cheques, passados e pagáveis em Macau, quando o respectivo pagamento estiver em mora, pode continuar a exigir que a indemnização correspondente a esta consista nos juros legais”, bem se vê que, não obstante o disposto no artº48º da L.U.L.L. Assim como no artº 1181º do C.C.M., o certo é que o legislador (do próprio C. Comercial) pretendeu manter ao portador de tais títulos de crédito, a possibilidade de optar pelos juros à taxa legal, quando os mesmo títulos tenham sido emitidos e pagáveis em Macau, como é a situação dos presentes autos.

       
      • Votação : Com declaração de voto vencido
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 31/01/2002 131/2001 Recurso em processo penal
    • Assunto

      - Alteração da qualificação jurídica dos factos. (Convolação)
      - Aplicação analógica do artº 339º do C.P.P.M..
      - Nulidade processual.

      Sumário

      1. O julgador tem liberdade de, nos limites da competência do Tribunal, qualificar juridicamente os factos da acusação ou da pronúncia de modo diverso da subsunção aí encontrada.

      Na verdade, sendo a determinação do direito ou o enquadramento jurídico dos factos apurados, o cerne da função judicial, não pode a mesma estar sujeita a limitações decorrentes de um incorrecto enquadramento, sob pena de total desvirtuamento dessa função.

      2. Porém:

      – quando a alteração implicar a aplicação de penalidade mais elevada, o juiz tem sempre de observar o contraditório;

      – nas hipóteses de a alteração implicar a aplicação de penalidade igual ou inferior à que constava da acusação, em regra, será necessário proceder à comunicação da alteração ao arguido, visto que a estratégia de defesa estruturada para determinada configuração jurídica, não valerá para outra, mesmo que para infracção menos grave;

      – não será de proceder à comunicação quando a alteração da qualificação jurídica é para uma infracção que representa um minus relativamente à da acusação, ou seja, de um modo geral, sempre que entre o crime da acusação ou da pronúncia e o da condenação há uma relação de especialidade ou de consunção e a convolação é efectuada para crime menos gravoso; (v.g., convolação de furto de valor elevado para furto simples; de roubo para furto; de homicídio ou de ofensas à integridade física cometidos dolosamente para os mesmos crimes por negligência; de violação para coacção sexual; de homicídio para homicídio privilegiado, etc.).

      3. Tal entendimento – à falta de regulamentação expressa, já que o C.P.P.M. Não trata da questão da alteração da qualificação jurídica, regulamentando, apenas, a matéria da alteração substancial ou não de factos descritos na acusação ou pronúncia, e, atento o disposto no artº 4º do C.P.P.M. – tem como fundamento jurídico, (por aplicação analógica), o disposto no artº 339º do citado código.

      4. Não tendo o Colectivo “a quo” dado a conhecer aos arguidos da possibilidade de a matéria de facto que da acusação constava e que do julgamento resultou provada vir a ser qualificada como a prática de um crime de “participação em motim”, e, não havendo entre este e os crimes pelos quais estavam os arguidos acusados qualquer relação de especialidade ou de consunção, violou o mesmo, o disposto no artº 339º do C.P.P.M. – na parte respeitante ao dever de comunicar da alteração ao arguido, concedendo-lhe, se requerido, o tempo necessário para a preparação da sua defesa – cometendo, assim, uma nulidade prevista na al. b) do artº 360º do referido C.P.P.M..

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
      • Juizes adjuntos : Dr. Choi Mou Pan
      •   Dr. Lai Kin Hong