Tribunal de Última Instância
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dra. Song Man Lei
- Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
- Dr. Sam Hou Fai
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dra. Song Man Lei
- Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
- Dr. Sam Hou Fai
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
- Dr. Lai Kin Hong
- Dr. Choi Mou Pan
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
“Residência habitual”.
Autorização de residência temporária; (Lei n.° 4/2003 e Lei n.° 16/2021).
Cancelamento.
1. A “residência habitual” é um “conceito indeterminado”, sindicável pelos Tribunais, implicando, necessariamente, uma “situação de facto”, com uma determinada dimensão temporal e qualitativa, que pressupõe um “elemento de conexão”, expressando uma “íntima e efectiva ligação a um local” (ou território), com a real intenção de aí habitar e de ter, e manter, residência”, sendo de se ponderar “não só uma “presença física” como a (mera) “permanência” num determinado território, (a que se chama o “corpus”), mas que seja esta acompanhada de uma (verdadeira) “intenção de se tornar residente” deste mesmo território, (“animus”), e que pode ser aferida com base em vários aspectos do quotidiano pessoal, familiar, social e económico, e que indiquem, uma “efectiva participação e partilha” da sua vida social.
2. A mera “ausência temporária” de uma pessoa a quem tenha sido concedida autorização para residir em Macau não implica a necessária conclusão que tenha deixado de “residir habitualmente” em Macau.
3. De facto, nos termos do art. 43°, n.° 5 da (nova) Lei n.° 16/2021:
“(…) não deixa de ter residência habitual o titular que, embora não pernoite na RAEM, aqui se desloque regular e frequentemente para exercer actividades de estudo ou profissional remunerada ou empresarial”.
4. Verificando-se porém que no período de vários anos o interessado tão só manteve uma “escassa permanência” em Macau, e sem que nada mais resulte dos autos, viável não é considerar-se que tem “residência habitual”.
- Negado provimento ao recurso.
Recurso de uniformização de jurisprudência.
Código das Execuções Fiscais (aprovado pelo Decreto n.° 38088 de 12.12.1950).
Princípio – geral – da continuidade da legislação previamente vigente. Excepção.
Vigência.
Aplicabilidade.
Remissão (normas de).
Lei Básica da Região Administrativa Especial de Macau.
Lei de Reunificação; (Lei n.° 1/1999).
Soberania.
Execução fiscal.
Reversão fiscal.
Oposição.
1. O art. 3°, n.° 1 da “Lei de Reunificação”, (Lei n.° 1/1999”), consagra o que se poderia chamar de “princípio – geral – da continuidade da vigência da legislação que anteriormente vigorava em Macau”, (desde que não contrária à L.B.R.A.E.M.), estatuindo-se, por sua vez, no “n.° 4” do dito preceito, uma “excepção” a este mesmo “princípio geral”, pois que com o aí estatuído se revogou toda a “legislação portuguesa previamente vigente em Macau…” que, em conformidade com o aí prescrito deixou “de vigorar na R.A.E.M. a partir do dia 20 de Dezembro de 1999”, o que, (por si), implica a natural e necessária conclusão no sentido de que o “Código das Execuções Fiscais” aprovado pelo Decreto n.° 38088, datado de 12.12.1950, “deixou de vigorar em Macau a partir do dia 20.12.1999”.
2. Porém, a “vigência” e a “aplicabilidade” de uma Lei, ainda que constituam conceitos a maior parte das vezes “conexos”, “interligados” e/ou “interdependentes” (para a solução jurídica de determinada questão ou situação), não se confundem, representando realidades diferentes: a “vigência” de uma Lei corresponde à possibilidade da sua executoriedade compulsiva perante qualquer facto ou situação ocorrida nos termos nela (abstractamente) previstos, sendo a sua “aplicabilidade” a susceptibilidade da sua utilização (aplicação) nas situações concretas e previamente nela enunciadas.
3. As “normas de remissão”, mandando aplicar outras normas – as “remitidas”, (contidas no mesmo ou noutro diploma legal) – “incorporam-nas”, passando o conteúdo destas a dever-se considerar como sua parte integrante, tudo se passando como se a matéria em questão passasse a estar regulada na própria norma de remissão.
4. Assim adequado se mostra concluir que:
«Por força do art. 4°, n.° 4 da “Lei de Reunificação” – Lei n.° 1/1999 – o Código das Execuções Fiscais aprovado pelo Decreto n.° 38088 de 12.12.1950 deixou de vigorar na Região Administrativa Especial de Macau a partir do dia 20 de Dezembro de 1999.
Porém, em conformidade com o estatuído no aludido art. 4°, n.° 1, al. 8) da referida “Lei de Reunificação”, as normas do dito Código das Execuções Fiscais podem, transitoriamente, continuar a ser aplicadas na Região Administrativa Especial de Macau».
- Julgado procedente o recurso, revogando-se o Acórdão recorrido do Tribunal de Segunda Instância de 28.01.2021, julgando-se, consequentemente, improcedente a oposição à execução dos recorridos; bem como,
- Fixada a seguinte jurisprudência:
“Por força do art. 4°, n.° 4 da “Lei de Reunificação” – Lei n.° 1/1999 – o Código das Execuções Fiscais aprovado pelo Decreto n.° 38088 de 12.12.1950 deixou de vigorar na Região Administrativa Especial de Macau a partir do dia 20 de Dezembro de 1999.
Porém, em conformidade com o estatuído no aludido art. 4°, n.° 1, al. 8) da referida “Lei de Reunificação”, as normas do dito Código das Execuções Fiscais podem, transitoriamente, continuar a ser aplicadas na Região Administrativa Especial de Macau”.
Impugnação Pauliana.
Pressupostos.
Contrato promessa de compra e venda.
Registo provisório.
Má fé do devedor.
1. Inserido no Capítulo respeitante à “Garantia geral das obrigações”, na Secção das “Disposições gerais” e com a epígrafe “Princípio geral”, prescreve o art. 596° do C.C.M. que:
“Pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora, sem prejuízo dos regimes especialmente estabelecidos em consequência da separação de patrimónios”.
E, como “institutos” legalmente consagrados para a “conservação da garantia patrimonial” prevê também o dito C.C.M. a “declaração de nulidade”, (cfr., art. 600°), a “sub-rogação do credor ao devedor”, (cfr., art. 601° a 604°), a “impugnação pauliana”, (cfr., art. 605° a 614°), e o “arresto”, (cfr., art. 615° a 618°), pois que muito embora a lei conceda ao credor a possibilidade de recorrer aos meios judiciais para obter a “realização forçada do seu crédito”, (cfr., art. 807° e segs. Do C.C.M.), esta não é a única via ao seu dispor em caso de “não cumprimento voluntário da obrigação”.
De facto, o credor tem também em seu poder outros instrumentos igualmente eficazes, dos quais pode dispor para “defender a sua posição contra atos praticados pelo devedor, capazes de prejudicarem a garantia patrimonial da obrigação”.
São os chamados (e atrás referidos) “meios de conservação da garantia patrimonial” que, obstando a que bens que se deviam manter na esfera patrimonial do devedor de lá saiam, visando permitir a consistência do direito de crédito do credor contra actos do devedor que a possam afectar.
2. De entre essas “providências” asseguradas pela lei civil figura o instituto da “impugnação pauliana” – meio pela A. utilizado para “atacar” a “compra e venda” entre as (1ª e 2ª) RR. Celebrada a fim de garantir o crédito que alega ter sobre a 1ª R. – e que, como expediente de “conservação da garantia patrimonial”, consiste na faculdade (normativamente) concedida ao credor, de atacar judicialmente certos actos válidos, anuláveis ou nulos praticados pelo devedor que diminuam a garantia patrimonial do seu crédito e que lhe sejam prejudiciais.
3. Constitui uma forma de “inintromissão nas relações jurídicas existentes”, o que justifica que só possa ser efectivada por “via judicial”: (v.g.), através da interposição de uma acção declarativa (como foi o caso dos autos, e também, por via de excepção, ou reconvenção).
4. O sucesso da “impugnação pauliana” depende da verificação dos seguintes requisitos:
I) a “existência de um crédito”;
ii) um acto de natureza não pessoal que cause “prejuízo à garantia patrimonial do devedor”, (“eventus damni”); e,
iii) no caso de actos onerosos, a actuação de “má fé do devedor e do terceiro”, (“consilium fraudis”).
5. Em causa estando a “conservação” da garantia patrimonial, em princípio exige-se que o crédito seja “anterior” ao “acto prejudicial” do património do devedor, pois que se posterior, não poderá dizer-se que se alterou a garantia patrimonial com que o credor contava no momento da constituição do crédito.
No entanto, a impugnação pauliana poderá ainda operar na hipótese do “acto prejudicial ser anterior à constituição do crédito”, desde que seja “dolosamente” praticado com a finalidade de “impedir a satisfação do direito do futuro credor”; (cfr., parte final da alínea a) do citado art. 605° do C.C.M.).
6. Em causa estando um “crédito posterior ao acto alegadamente prejudicial”, ao credor – A., ora recorrente – cumpre a alegação de factos que demonstrem – que o R. actuou de “má fé”, ou seja, com – a “consciência da finalidade fraudulenta visada pelo devedor com a outorga do acto”.
- Negado provimento ao recurso.
