Tribunal de Última Instância
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dra. Song Man Lei
- Juizes adjuntos : Dr. José Maria Dias Azedo
- Dr. Sam Hou Fai
- Votação : Unanimidade
- Relator : Dr. José Maria Dias Azedo
- Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
- Dra. Song Man Lei
Crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”.
Erro notório na apreciação da prova.
Contradição insanável da fundamentação.
Tentativa.
Declaração de perda de objectos.
Pressupostos.
(Requalificação jurídico-penal).
1. O crime de “tráfico ilícito de estupefacientes” reconduz-se à categoria dos designados “crimes de perigo abstracto” e “de perigo comum”.
Nos “crimes de perigo abstracto”, a Lei basta-se com a aptidão (genérica) de determinadas condutas para constituírem um perigo que atinja determinados bens e valores, baseando-se na suposição legal de que determinados comportamentos são geralmente perigosos para esses bens e valores.
Por sua vez, fala-se em “crime de perigo comum” face à multiplicidade de bens jurídicos que se pretende salvaguardar.
No caso, a “saúde pública”, como bem jurídico complexo que primacialmente visa proteger “bens jurídicos pessoais”, como a integridade física e a vida dos consumidores, tutelando também valores como a tranquilidade, a liberdade individual e a estabilidade familiar.
2. Qualificam-se, outrossim, como tipos de ilícito “exauridos”, “excutidos” ou de “empreendimento”, e em relação aos quais se considera que o “resultado típico” alcança-se logo com o que normalmente configura a realização inicial do iter criminis, (uma mera tentativa), precisamente porque, já aí, antes de se verificar qualquer lesão efectiva, verificado – consumado – está o perigo dessa lesão.
A tutela penal é, deste modo, antecipada, sendo, assim, o crime de “tráfico ilícito de estupefacientes” punido como um “processo”, e não, apenas, como o “resultado de um processo”.
3. Nos termos do art. 101° do C.P.M.:
“1. São declarados perdidos a favor do Território os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este tiverem sido produzidos, quando, pela sua natureza ou pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das pessoas ou a moral ou ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o cometimento de novos factos ilícitos típicos.
2. O disposto no número anterior tem lugar ainda que nenhuma pessoa possa ser punida pelo facto.
3. Se a lei não fixar destino especial aos objectos declarados perdidos nos termos dos números anteriores, pode o juiz ordenar que sejam total ou parcialmente destruídos ou postos for a do comércio”.
Assim, e para a preceituada “declaração de perda de bens” essencial é que o Tribunal dê como provados os “factos” que integram os seus “pressupostos”, isto é, que os “objectos” em questão “serviram ou estavam destinados a servir para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este foram produzidos, …”, imprescindível se apresentando desta forma que a dita “matéria de facto” conste de expressa descrição na acusação – ou no despacho de pronúncia – para que, em observância do princípio do contraditório e no cabal exercício do direito de defesa, seja objecto de discussão e investigação em audiência de julgamento, com fundamentada “pronúncia”, (não bastando uma mera “remissão” feita na decisão da matéria de facto para uma breve “consideração” tecida em sede de um “auto de apreensão” efectuado na fase de Inquérito, onde nem se explicitam devidamente as suas razões).
- Concedido parcial provimento ao recurso da 1ª arguida; negado provimento aos recursos dos 2º e 4ª arguidos.
Crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”.
Erro notório na apreciação da prova.
In dubio pro reo.
“Encomenda postal” (contendo estupefaciente).
“Entregas controladas” (de estupefaciente).
(Cooperação policial e judiciária).
1. O “princípio in dubio pro reo” identifica-se com o da “presunção da inocência do arguido” e impõe que o julgador valore sempre, em favor dele, um “non liquet”.
Conexionando-se com a matéria de facto, este princípio actua em todas as vertentes fácticas relevantes, quer elas se refiram aos elementos típicos do facto criminalmente ilícito – tipo incriminador, nas duas facetas em que se desdobra: tipo objectivo e tipo subjectivo – quer elas digam respeito aos elementos negativos do tipo, ou causas de justificação, ou ainda a circunstâncias relevantes para a determinação da pena.
Porém, importa atentar que o referido o princípio (“in dubio pro reo”), só actua em caso de dúvida insanável, razoável e motivável, definida esta como “um estado psicológico de incerteza dependente do inexacto conhecimento da realidade objectiva ou subjectiva”.
Por isso, para a sua violação exige-se a comprovação de que o juiz tenha ficado na dúvida sobre factos relevantes, e, nesse estado de dúvida, tenha decidido contra o arguido.
Daí também que, para fundamentar essa dúvida e impor a absolvição, não baste que tenha havido “versões dispares” ou mesmo “contraditórias”, sendo antes necessário que perante a prova produzida reste no espírito do julgador – e não no do recorrente – (alguma) dúvida sobre os factos que constituem o pressuposto da decisão, dúvida que, como se referiu, há-de ser “razoável” e “insanável”.
A violação do “princípio in dubio pro reo” exige, sempre, que o tribunal tenha exprimido, com um mínimo de clareza, que se encontrou num “estado de dúvida” quanto aos factos que devia dar por “provados” ou “não provados”.
2. Inegável se apresenta de admitir, (como último meio), certas “medidas de investigação especiais”, estritamente necessárias à eficácia da prevenção e combate a determinado tipo de criminalidade, especialmente, relativamente à criminalidade (objectivamente) grave e de consequências de elevada danosidade social como (v.g.), sucede com o “terrorismo”, a “criminalidade organizada”, o “tráfico humano” e o “tráfico de droga”, onde a pressão das circunstâncias e das imposições de defesa da(s) sociedade(s) contra tão graves afrontamentos tem imposto meios como a admissibilidade de “escutas telefónicas”, a utilização de “agentes infiltrados” e a “entrega controlada” de estupefaciente.
Importa é que a actuação dos agentes policiais não constitua, de qualquer forma ou circunstância, uma “interferência externa na vontade do arguido”, no sentido de o levar a praticar os factos apurados, necessário (e imprescindível) sendo de distinguir entre a “criação de uma oportunidade com vista à realização de uma intenção criminosa já existente”, em que o sujeito já está decidido a delinquir e a actuação policial apenas cria as condições à concretização – exteriorização – da dita intenção criminosa, e a (própria) criação desta mesma intenção, (antes inexistente), visando incitar à prática de uma infracção que, sem essa intervenção, não teria lugar, com vista a obter a prova duma infracção que sem essa conduta não existiria.
Na verdade, a eventual ânsia de prevenir e combater o crime (grave) não pode legitimar comportamentos que atinjam intoleravelmente a liberdade de vontade ou de decisão das pessoas, (e isso, mesmo que tal se faça no propósito de desmascarar o criminoso, ou de pôr a descoberto a sua actividade delituosa).
Quando se afecta intoleravelmente a “liberdade de vontade” ou de “decisão” da pessoa, a deslealdade atinge um grau de insuportabilidade que é a “integridade moral” do sujeito que acaba violada, (e, com ela, o prescrito no art. 28° da L.B.R.A.E.M.), tornando todo o procedimento “nulo” por força do art. 113° do C.P.P.M..
Porém, desde que estes “limites” sejam respeitados, em causa não fica o equilíbrio, (ou a equidade), entre os “direitos das pessoas” enquanto fontes ou detentoras da prova e as “exigências públicas do inquérito e da investigação”.
- Negado provimento ao recurso.
Crime de “tráfico ilícito de estupefacientes”.
Medida da pena.
(Requalificação jurídico-penal).
1. Com o recurso não se visa eliminar a margem de livre apreciação reconhecida em matéria de determinação da pena, devendo esta ser confirmada se verificado estiver que no seu doseamento foram observados os critérios legais atendíveis.
2. Revelando-se pela decisão recorrida, a selecção (adequada) dos elementos factuais elegíveis, a identificação (correcta) das normas aplicáveis, o cumprimento (estrito) dos passos a seguir no iter aplicativo e a ponderação devida e justa dos critérios legalmente atendíveis, imperativa é a confirmação da pena que ao ora recorrente foi aplicada.
- Negado provimento ao recurso.
Direito da Propriedade Industrial.
Marca.
Registo.
Requisitos.
Capacidade distintiva.
Marca enganosa.
“Slogan”.
(“It’s like milk but made for humans”).
1. A “Propriedade Industrial” é a área do Direito que garante a inventores ou responsáveis por qualquer produção do intelecto – nos domínios industrial, científico, literário ou artístico – o direito de obter, por um determinado período de tempo, uma recompensa resultante da sua criação ou manifestação intelectual.
2. Não obstante de um ponto de vista “económico”, a uma marca caiba essencialmente desempenhar as funções de “indicação da origem” dos produtos ou serviços, de “garantia de qualidade” e ainda a função “publicitária”, atento ao preceituado no art. 197° do R.J.P.I., é de se concluir que a “função jurídica” da marca é a de identificar a proveniência de um produto ou serviço ao consumidor para, assim, permitir a sua “distinção” de outros produtos ou serviços produzidos ou postos no mercado, devendo assim ser entendida como “um sinal distintivo na concorrência de produtos e serviços”.
3. Podem existir os seguintes tipos de “marcas”:
- nominativas (ou denominativas): compostas apenas por elementos verbais, sejam palavras, letras ou números;
- figurativas: compostas apenas por elementos figurativos, como desenhos ou imagens;
- mistas: compostas por elementos verbais e figurativos; e,
- tridimensionais: compostas pela forma do produto ou da respetiva embalagem; (havendo ainda as “marcas de posição”, de “padrão”, de “cor”, de “movimento”, de “holograma”, assim como as “sonoras”, compostas por sons, e as “olfativas”, compostas pelo odor).
4. Um “slogan” pode o ser registado como “marca” desde que tenha “capacidade distintiva”.
5. Para se aferir de tal “capacidade distintiva” deve-se ponderar se o aludido sinal, (slogan):
- constitui um “jogo de palavras”; e/ou,
- introduz “elementos de intriga ou surpresa conceptual”, (com “duplo sentido”, para que possa ser considerado imaginativo, surpreendente ou inesperado); e/ou,
- tem uma “originalidade ou ressonância particular”; e/ou,
- desencadeia na mente do público relevante um “processo cognitivo”, suscitando a imaginação e exigindo um “esforço de interpretação”; e/ou,
- integra “estruturas ou combinações sintáticas originais/ invulgares”; e/ou,
- utiliza e recorre a “figuras de linguagem”, podendo integrar figuras de “semântica”, de “sintaxe” e de “som/fonética”, como v.g., sucede com o “paradoxo”, a “metáfora”, a “rima”, a “aliteração” e a “assonância”, (ou seja, repetição das mesmas letras ou sílabas numa frase, explorando o som das consoantes ou das vogais para gerar efeitos no texto), etc…
6. Na verdade, se dúvidas não há que uma frase (descritiva), com características “promocionais”, e que se limita a elogiar as qualidades dos produtos ou serviços não é passível de registo, o mesmo já não sucede com “frases” (ou expressões) que contenham as atrás aludidas “características”, e que, ainda que se possam considerar “simples”, não são “comuns”, ao ponto de, à partida, e de imediato, se (poder) excluir qualquer (necessidade de) análise e reflexão ou “esforço de interpretação”, desencadeando, por sua vez, um “processo cognitivo na mente do público” ao qual se dirige, e, sendo, por isso, de “fácil memorização”, o que as torna capaz de “distinguir os produtos a que dizem respeito dos produtos de empresas concorrentes”.
7. O motivo (absoluto) de recusa de registo relacionado com a “marca enganosa” constitui um fundamento de recusa de “ordem pública”, para defesa de diversos valores e interesses da sociedade como um todo.
8. Para determinar se um sinal pode provocar um risco de engano devem conjugar-se dois critérios básicos: o primeiro, consiste em relacionar o sinal solicitado como marca com os produtos ou serviços para as quais se haja apresentado a correspondente solicitação; o segundo, consiste em fixar a plataforma subjectiva, (ou público), a partir da qual se deverá apreciar se um sinal é enganoso.
O conceito de “público” tem contornos muito amplos que devem ser adaptados para cada caso concreto” de acordo com a “espécie de produtos ou serviços para os quais se solicita a marca.
- Julgado procedente o recurso.
