Acórdãos

Tribunal de Última Instância

    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 11/03/2008 40/2007 Recurso de decisão jurisdicional em matéria administrativa
    • Assunto

      - Autorização de uso e porte de arma de defesa pessoal
      - Discricionariedade
      - Princípio da igualdade
      - Regra do precedente
      - Preterição do precedente

      Sumário

      I – A alínea c) do n.º 1 do o art. 27.º do Regulamento de Armas e Munições, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 77/99/M, de 8 de Novembro, atribui à Administração poderes discricionários na avaliação da necessidade do uso e porte de arma de defesa.

      II – O princípio da igualdade constitui um limite interno da discricionariedade, cuja violação por parte da Administração pode ser sindicada pelos tribunais, embora a intervenção do juiz na apreciação deste princípio (e de outros, como os da justiça, proporcionalidade e imparcialidade) só deva ter lugar quando as decisões administrativas, de modo intolerável, os violem.

      III – A Administração está autovinculada no âmbito dos seus poderes discricionários, devendo ela utilizar critérios substancialmente idênticos para a resolução de casos idênticos (regra do precedente), sendo a mudança de critérios, sem qualquer fundamento material, violadora do princípio da igualdade.

      IV – A regra do precedente exige a verificação de requisitos subjectivos e objectivos. A identidade subjectiva exige que se trate do mesmo órgão ou dos seus sucessores legais na matéria em apreço. A identidade objectiva das duas situações (quanto aos pressupostos relevantes) deve verificar-se. Deve, ainda, ocorrer identidade normativa (identidade da disciplina jurídica) das situações em causa.

      V – A regra do precedente pode ser afastada por razões de boa administração ou de alteração das circunstâncias, se o interesse público justificar hoje uma conduta administrativa diferente daquela que antes foi adoptada na resolução de casos semelhantes ou idênticos.

      VI – O afastamento da regra do precedente obriga a fundamentar as razões de facto e de direito que justificam uma tal preterição do precedente.

      Resultado

      Face ao expendido, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão de anulação do acto recorrido.

      Sem custas.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Viriato Lima
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dr. Chu Kin
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/02/2008 46/2007 Recurso em processo civil
    • Assunto

      - Remissão.
      - Quitação.
      - Reconhecimento negativo de dívida.
      - Transacção.
      - Contrato de trabalho.

      Sumário

      I – A remissão consiste no que é vulgarmente designado por perdão de dívida.

      II – A quitação (ou recibo, no caso de obrigação pecuniária) é a declaração do credor, corporizada num documento, de que recebeu a prestação.

      III – O reconhecimento negativo de dívida é o negócio pelo qual o possível credor declara vinculativamente, perante a contraparte, que a obrigação não existe.

      IV – O reconhecimento negativo da dívida pode ser elemento de uma transacção, se o credor obtém, em troca do reconhecimento, uma concessão; mas não o é, se não se obtém nada em troca, havendo então um contrato de reconhecimento ou fixação unilateral, que se distingue da transacção por não haver concessões recíprocas.

      V – A remissão de créditos do contrato de trabalho é possível após extinção das relações laborais.

      Resultado

      Dão provimento ao recurso, revogam o Acórdão recorrido para ficar a subsistir a sentença de 1.ª instância, que absolveu a ré do pedido.
      Custas pelos autores, tanto neste Tribunal, como no TSI.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Viriato Lima
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dr. Chu Kin
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 27/02/2008 58/2007 Recurso em processo civil
    • Assunto

      - Recursos.
      - Questões novas.
      - Matéria de facto.
      - Matéria de direito.
      - Poderes de cognição do Tribunal de Última Instância.
      - Gorjetas.
      - Casinos.
      - Descanso semanal.
      - Feriados obrigatórios.
      - Salário.

      Sumário

      I – Os recursos jurisdicionais para o Tribunal de Última Instância não visam criar decisões sobre matérias novas, pelo que se a questão não foi colocada no recurso para a instância inferior, não se pode da mesma conhecer, a menos que se trate de matéria de conhecimento oficioso.

      II – Em recurso jurisdicional cível, correspondente a terceiro grau de jurisdição, o Tribunal de Última Instância não tem poder de cognição que lhe permita sindicar a decisão do Tribunal de Segunda Instância sobre matéria de facto, salvo havendo ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova ou quando o tribunal recorrido violar qualquer norma legal, na utilização dos seus poderes.

      III – É lícito ao Tribunal de Segunda Instância, depois de fixada a matéria de facto, fazer a sua interpretação e esclarecimento, bem como extrair as ilações ou conclusões que operem o desenvolvimento dos factos, desde que não os altere.

      IV – O Tribunal de Última Instância só pode censurar as conclusões ou desenvolvimentos feitos pelo Tribunal de Segunda Instância sobre a matéria de facto fixada se este infringir o seu limite, tirando conclusões que não correspondam ao seu desenvolvimento lógico.

      V – As gratificações ou gorjetas recebidas pelos empregados de casino dos clientes não fazem parte do salário.

      VI – De acordo com a alínea b) do n.º 6 do art. 17.º do Decreto-Lei n.º 24/89/M, de 3 de Abril, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 32/90/M, de 9 de Julho, aos trabalhadores que auferem salário determinado em função do dia, o trabalho prestado em dia de descanso semanal deve ser pago pelo montante acordado com os empregadores, com observância dos limites estabelecidos nos usos e costumes.

      VII – Na falta de acordo entre as partes, o dia de descanso semanal dos trabalhadores referidos na conclusão anterior, deve ser pago pelo dobro da retribuição.

      VIII – O trabalho prestado pelos trabalhadores nos dias de feriado obrigatório, dá direito ao dobro da retribuição normal que acresce à retribuição normal, quando as partes não tenham acordado uma remuneração superior para tal trabalho.

      Resultado

      Julgam parcialmente procedente o recurso da ré, condenando-a a pagar ao autor a quantia de HK$11,165.65 (onze mil cento e sessenta e cinco dólares de Hong Kong e sessenta e cinco cêntimos)

      Custas na proporção do vencido, tanto neste Tribunal, como no TSI.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Viriato Lima
      • Juizes adjuntos : Dr. Sam Hou Fai
      •   Dr. Chu Kin
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 12/02/2008 3/2008 Habeas corpus
    • Assunto

      - Habeas corpus.
      - Impossibilidade superveniente da lide.
      - Entrega de infractores em fuga.
      - Regime jurídico de cooperação judiciária em matéria penal com o Interior da China.

      Sumário

      I – É impossível a lide numa providência de habeas corpus por detenção ilegal, quando a detida já foi entregue às Autoridades do Interior da China.

      II – A entrega de infractores em fuga às autoridades do exterior da RAEM sujeita-se à disposição de lei especial.

      III – Actualmente não existem normas inter-regionais ou locais que regulam a entrega de infractores em fuga entre o Interior da China e a RAEM.

      IV – Embora tenha o objectivo de executar a ordem de detenção vermelha emitida pela Interpol, na falta de normas jurídicas específicas que sejam aplicáveis, o Ministério Público, a PJ ou quaisquer autoridades públicas não podem deter o indivíduo, que está sob mandado de captura da Interpol, para efeitos de entregar ao Interior da China como parte requerente.

      Resultado

      - Julgam extinta a instância por impossibilidade superveniente subjectiva da lide.
      - Sem custas, fixando os honorários ao Ilustre Defensor nomeado em seiscentas patacas, a suportar pelo Gabinete do Presidente do Tribunal de Última Instância.

       
      • Votação : Unanimidade
      • Relator : Dr. Viriato Lima
      • Juizes adjuntos : Dr. Joao A. G. Gil de Oliveira
      •   Dr. Jorge Miguel Pinto de Seabra
    • Data da Decisão Número Espécie Texto integral
    • 30/01/2008 36/2007 Causas de que o tribunal conhece em primeira instância
    • Resultado

      Julgam a acusação parcialmente procedente e:
      A) Absolvem o arguido da prática de 1 (um) crime de corrupção passiva para acto ilícito, previsto e punível pelo art. 337.º n.º 1 do Código Penal;
      B) Absolvem o arguido da prática de 1 (um) crime de participação económica em negócio, previsto e punível pelo art. 342.º n.º 1 do Código Penal;
      C) Absolvem o arguido da prática de 13 (treze) crimes de branqueamento de capitais, previstos e puníveis pelo art. 10.º n.º 1, alínea a) da Lei n.º 6/97/M e de 4 (quatro) crimes de branqueamento de capitais, previstos e puníveis pelo art. 3.º, n. Os 1 e 2 da Lei n.º 2/2006;
      D) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 11 (onze) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, previstos e puníveis pelo art. 337.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 7 (sete) anos de prisão, por cada um;
      E) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 4 (quatro) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, previstos e puníveis pelo art. 337.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão, por cada um;
      F) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 5 (cinco) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, previstos e puníveis pelo art. 337.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão, por cada um;
      G) Absolvem o arguido da prática de 11 (onze) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, previstos e puníveis pelo art. 337.º n.º 1 do Código Penal, mas, em convolação, condenam-no, como autor, na forma consumada, de 11 (onze) crimes de corrupção passiva para acto lícito, previstos e puníveis pelo art. 338.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão, por cada um;
      H) Absolvem o arguido da prática de 9 (nove) crimes de corrupção passiva para acto ilícito, previstos e puníveis pelo art. 337.º n.º 1 do Código Penal, mas, em convolação, condenam-no, como autor, na forma consumada, de 9 (nove) crimes de corrupção passiva para acto lícito, previstos e puníveis pelo art. 338.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, por cada um;
      I) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 13 (treze) crimes de branqueamento de capitais, previstos e puníveis pelo art. 3.º, n. Os 1 e 2 da Lei n.º 2/2006 na pena de 5 (cinco) anos de prisão, por cada um;
      J) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 2 (dois) crimes de abuso de poder, previstos e puníveis pelo art. 347.º do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, por cada um;
      K) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 1 (um) crime de inexactidão dos elementos da declaração de rendimentos, previsto e punível pelo art. 27.º, n.º 2, da Lei n.º 11/2003 e pelo art. 323.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão;
      L) Condenam o arguido, como autor, na forma consumada, de 1 (um) crime de riqueza injustificada, previsto e punível pelo art. 28.º, n.º 1 da Lei n.º 11/2003, na pena de 2 (dois) anos de prisão e 240 (duzentos e quarenta) dias de multa, à quantia diária de MOP$1.000,00 (mil patacas), ou se não a pagar, com a alternativa de 6 (seis) meses de prisão;
      M) Englobando as penas mencionadas nas alíneas anteriores, condenam o arguido na pena única de 27 (vinte e sete) anos de prisão e em MOP$240.000,00 (duzentas e quarenta mil patacas), ou se não a pagar, com a alternativa de 6 (seis) meses de prisão.
      N) Declaram perdidos a favor da Região Administrativa Especial de Macau, nos termos do art. 103.º do Código Penal:
      a) O direito resultante da promessa de compra feita por N de uma fracção autónoma (XX) no regime de propriedade horizontal do prédio..., situado no [Endereço (11)], constituído por um apartamento tipo duplex, nos andares XX.º-X e XX.º-X e duas fracções autónomas constituídas por dois lugares de estacionamento no mesmo prédio n.os (fracções XX-XX e XX-XX), e pelos quais a promitente-compradora pagou já integralmente o preço (art. 597.º);
      b) O remanescente em dinheiro, proveniente dos crimes de corrupção, ou em títulos adquiridos com fundos de tal proveniência que, segundo esta sentença pertencem ao arguido, e estavam na sua posse em Macau e Hong Kong, e que, somado aos valores de aquisição dos bens da alínea a), perfaça o montante de MOP$252.836.883,20;
      O) Declaram perdidos a favor da Região Administrativa Especial de Macau, nos termos do art. 28.º, n.º 2 da Lei n.º 11/2003, os seguintes bens:
      a) A casa de Londres, referida no art. 559.º;
      b) Os bens referidos nos arts. 610.º e 611.º;
      c) A parte dos bens mencionados nos arts. 577.º, 578.º, 581.º, 605.º a 609.º e 613.º, não declarados já perdidos nos termos da alínea N) b);
      d) Os montantes em dinheiro transferidos para Inglaterra e aí movimentados nas contas bancárias controladas pelo arguido (arts. 528.º a 558.º);
      e) O remanescente em dinheiro ou em títulos que, segundo esta sentença, pertencem ao arguido, que estavam na sua posse, em Macau ou Hong Kong, mesmo que não provenientes ou não adquiridos com fundos provenientes dos crimes de corrupção;
      f) Os objectos apreendidos ao arguido, designadamente os referidos nos arts. 615.º e 617.º, não mencionados na última declaração de rendimentos, de valor superior ao índice 500 da tabela indiciária da função publica;
      P) Para efectivar o perdimento de bens será solicitada às jurisdições da Região Administrativa Especial de Hong Kong e do Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte, para entregarem à Região Administrativa Especial de Macau os fundos líquidos declarados perdidos nesta sentença;
      Q) No caso de não ser possível efectivar, na totalidade, o perdimento de bens decretado o arguido responderá com o seu património legítimo para tal pagamento.
      R) Devolva o apreendido não declarado perdido a favor da RAEM;
      S) O arguido pagará as custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 100 UC (art. 71.º, n.º 2 do Regime das Custas nos Tribunais);
      T) Fixam-se os honorários dos ilustres Defensores nomeados em mil e quinhentas patacas para a Srª. Dr.ª DE e três mil patacas para cada um dos restantes Defensores Oficiosos, Sr. Dr. DF, Sr. Dr. DG e DH;
      U) Boletins ao Registo Criminal e passe mandado de condução do arguido ao Estebelecimento Prisional para cumprimento da pena;
      V) Remeta cópias da sentença ao Chefe do Executivo e ao Secretário para os Transportes e Obras Públicas, para os efeitos tidos por convenientes.

       
      • Relator : Dr. Sam Hou Fai
      • Juizes adjuntos : Dr. Viriato Lima
      •   Dr. Lai Kin Hong